Damos continuidade nesta edição
ao
estudo do livro O
Espiritismo perante a
Ciência,
de Gabriel Delanne,
conforme
tradução da obra
francesa Le
Spiritisme devant la
science,
publicada originalmente
em Paris em 1885.
Questões preliminares
A. Qual é a melhor
garantia contra o
charlatanismo?
Segundo o Codificador do
Espiritismo, o mais
absoluto desinteresse é
a melhor garantia contra
o charlatanismo. Se ele
nem sempre assegura a
excelência das
comunicações
inteligentes, priva,
contudo, os maus
Espíritos de um poderoso
meio de ação e fecha a
boca a certos
detratores.
(O Espiritismo perante a
ciência, Quinta Parte,
Cap. III – Médiuns
videntes e médiuns
auditivos.)
B. Pode ser fotografado
um Espírito que ninguém
esteja vendo no recinto?
Sim. A fotografia é
possível estando o
Espírito tangível, como
nas experiências de
William Crookes com a
médium Florence Cook,
bem como nos casos em
que o Espírito se
encontra invisível para
as pessoas presentes.
(Obra citada, Quinta
Parte, Cap. III –
Médiuns videntes e
médiuns auditivos.)
C. Em que consiste a
mediunidade auditiva?
A mediunidade auditiva
consiste na faculdade de
ouvir certos ruídos,
certas palavras
pronunciadas pelos
Espíritos e que não
impressionam o ouvido
nas condições ordinárias
da vida. É preciso
distinguir, para essa
faculdade, dois casos:
1º. a intuição; 2º. a
audição real. A intuição
se dá de alma para alma;
é uma transmissão de
pensamentos que se opera
sem o socorro dos
sentidos, uma voz íntima
que ressoa no foro
íntimo; embora os
pensamentos recebidos
sejam claros, não são
eles articulados por
meio de palavras e nada
têm de material. Na
audição, pelo contrário,
as palavras são
pronunciadas de maneira
a serem ouvidas pelo
médium, como se uma
pessoa lhe falasse ao
lado.
(Obra citada, Quinta
Parte, Cap. III –
Médiuns videntes e
médiuns auditivos.)
Texto para leitura
877. Falando a respeito
da mediunidade de
efeitos físicos, Allan
Kardec diz que o médium
de efeitos físicos, do
mesmo modo que o de
comunicações
inteligentes, não
recebeu para seu gozo a
faculdade que possui.
Teve-a sob a condição de
fazer dela bom uso; se,
portanto, abusa, pode
dar-se que lhe seja
retirada, ou que redunde
em detrimento seu,
porque, afinal, os
Espíritos inferiores
estão subordinados aos
Espíritos superiores.
878. Segundo o
Codificador do
Espiritismo, o mais
absoluto desinteresse é
a melhor garantia contra
o charlatanismo. Se ele
nem sempre assegura a
excelência das
comunicações
inteligentes, priva,
contudo, os maus
Espíritos de um poderoso
meio de ação e fecha a
boca a certos
detratores.
879. Fechando suas
observações sobre o
tema, Kardec aduziu:
“Somos, antes de tudo,
pessoas honestas e
declaramos formalmente
que nada temos de comum
com as pessoas,
quaisquer que elas
sejam, que fazem
profissão de sua
faculdade e assim
desonram por sua conduta
a doutrina que pretendem
sustentar. Nada
conhecemos que seja tão
repugnante quanto as
fraudes que teriam por
fim profanar o que de
mais sagrado há no
mundo: o túmulo dos
mortos. É por isso que
desacreditamos o senhor
Buguet como ele merece e
exortamos todos os
espíritas a não se
deixarem atrair por
belas promessas, sempre
que estiver em jogo um
interesse puramente
material”.
880. Retornando ao tema
fotografia dos
Espíritos, afirmamos que
isso é possível, uma vez
que Crookes a obteve,
mas as condições
ordinárias em que nos
colocamos não são as
mesmas do ilustre
químico.
881. Nas experiências
com Miss Cook, o
Espírito fica
completamente
materializado, adquire a
mesma tangibilidade de
uma pessoa viva e não há
então admirar que se lhe
possa tirar o retrato.
Na fotografia de que
tratamos não se vê o
Espírito e, no entanto,
sua imagem é
reproduzida. Isso se
pode explicar do
seguinte modo: Sabemos
que o médium vidente
possui um aparelho
visual, tornado mais
sensível por meio da
ação fluídica exercida
pelo Espírito que se
quer manifestar. O olho
do médium é uma câmara
escura que adquire,
nesse momento, um poder
considerável, registra
vibrações que não podem
ser percebidas por nós,
no estado habitual, daí
sua propriedade de ver
Espíritos. Pois bem, a
placa de colódio
representa, no caso, o
mesmo papel, não que
seja, então, mais
sensível, mas o Espírito
toma fluidos ao médium e
se materializa
suficientemente para que
seu invólucro reflita os
raios ultravioleta que
não vemos, e é graças a
essa irradiação que se
pode obter a imagem não
percebida pelos nossos
olhos.
882. Não temos
consciência das
vibrações luminosas que
vão além do violeta e do
vermelho; elas, porém,
existem, impressionam os
sais de prata e são
refletidas pelo
perispírito da entidade
que se quer manifestar.
Podemos supor que o
fluido nervoso tomado ao
médium substitui o vidro
de urânio para os raios
ultravioleta do
espectro, diminui o
movimento perispiritual,
condensa, de alguma
sorte, os fluidos de
modo a torná-los capazes
de refletir as radiações
ectênicas.
883. Essa maneira de ver
é tanto mais justa
quanto as experiências
tentadas por Thomas
Slater, ótico, em
Londres, demonstram que
a luz ordinária não
intervém nesse fenômeno.
Disse este pesquisador:
“Eu mesmo obtive
fotografias espíritas
por meio de um
instrumento feito com
vidros de um azul muito
escuro, de modo que
seria impossível
impressionar a chapa, a
menos que uma luz forte
fosse projetada sobre a
pessoa retratada;
provava-se destarte que
a luz lançada pelos
Espíritos está
completamente fora dos
raios luminosos de nosso
espectro, que são muito
fortes, posto que os
Espíritos nos sejam
invisíveis”.
884. Em Bruxelas, um
engenheiro químico,
Bayard, obteve em seu
laboratório fotografias
de Espíritos. Apresenta
ele minucioso relatório
no livro Procès des
Spirites, páginas
122 a 124. Finalmente,
na América se
conseguiram fotografias
espíritas e o fenômeno
não é mais contestado.
885. A despeito dos
tribunais, é preciso
reconhecer que o fato se
pode produzir e, por
estranhável que seja,
nada tem de
sobrenatural. Desde que
se demonstra que os
Espíritos existem, que
têm um corpo fluídico
que se pode condensar,
em certas condições, é
fácil compreender que
possa ser fotografado,
pois que se materializa
até à tangibilidade,
como o provaram as
experiências de Crookes.
886. Tomamos o seguinte
exemplo na Revue Spirite,
de Allan Kardec, de
1864. É um dos seus
amigos quem fala:
“Habitava – diz ele –
uma casa em Montrouge;
estávamos no verão; o
Sol dardejante entrava
pela janela; achava-se
na mesa uma garrafa
cheia d'água e sob a
garrafa uma pequena
esteira; de repente, a
esteira pegou fogo. Se
ninguém estivesse ali,
podia haver um incêndio,
sem que se lhe soubesse
a causa. Procurei
centenas de vezes
produzir o mesmo
resultado e nunca o
consegui”.
887. A causa física da
inflamação é bem
conhecida; a garrafa
representou o papel de
lente; mas por que não
se pôde reiterar a
experiência? É que,
independente da garrafa
e da água, havia um
concurso de
circunstâncias que, de
maneira excepcional,
fizeram a concentração
dos raios solares.
Talvez o estado da
atmosfera, dos vapores,
as qualidades da água, a
eletricidade, e tudo
isso, provavelmente, em
certas proporções. Daí a
dificuldade de encontrar
as condições precisas, e
a inutilidade das
tentativas para produzir
um efeito semelhante.
888. Eis, pois, um
fenômeno inteiramente do
domínio da física, cujo
princípio se conhece e
que, entretanto, não
pode ser repetido à
vontade. Poderá o mais
endurecido cético negar
o fato? Por certo que
não. Mas por que os
mesmos céticos negam a
realidade dos fenômenos
espíritas, em virtude de
os não poder manipular a
seu bel-prazer? Não
admitir, fora do
conhecido, agentes
novos, regidos por leis
especiais, negar esses
agentes, porque não
obedecem às leis que
conhecemos, é, em
verdade, dar
demonstração de pouca
lógica e mostrar um
espírito bem estreito.
889. Por mais assombrosa
que seja a fotografia
dos Espíritos, eis uma
amostra de fotografia
natural mais
extraordinária ainda,
atestada, em 1858, pelo
conhecido sábio Jobard:
“O Sr. Badet, morto a 12
de novembro último,
depois de uma doença de
três meses, tinha o
hábito – diz a Union
Bourguignonne de Dijon –
de colocar-se a uma
janela do primeiro
andar, sempre que suas
forças o permitiam, e aí
ficava, com a cabeça
voltada para a rua, a
fim de distrair-se com a
vista dos transeuntes.
Há alguns dias, a Sra.
Peltret, cuja casa fica
em frente à da viúva
Badet, notou, na vidraça
da janela dessa casa, o
próprio Badet, com seu
boné de algodão, sua
figura emagrecida, tal
como o tinha visto
durante a doença. Grande
foi a sua emoção. Ela
chamou, não só os
vizinhos, cujo
testemunho podia ser
suspeito, mas ainda os
homens graves, que
perceberam,
distintamente, a imagem
de Badet no vidro da
janela, onde costumava
colocar-se. Mostraram
essas imagens à família
do defunto, que fez,
imediatamente,
desaparecer a vidraça.
Ficou, entretanto,
confirmado, que a
vidraça se havia
impregnado com a figura
do doente, que aí ficou
daguerreotipada
(1),
fenômeno que se poderia
explicar se, do lado
oposto à janela,
houvesse uma outra por
onde os raios solares
pudessem chegar ao Sr.
Badet. Mas o quarto só
tinha uma janela. Tal é
a verdade inteira sobre
o extraordinário fato,
cuja explicação convém
deixar aos sábios.”
890. Não é inútil dizer
que não houve explicação
nenhuma, o que nada tem
de surpreendente, visto
que o vidro foi
destruído e não pôde ser
analisado. O que
queremos mostrar, nessa
história, é a
possibilidade da
fotografia espontânea, e
que, longe de ser
ridículo, os
espiritistas são
pesquisadores
conscienciosos, que
caminham a par da
Ciência, e que, quanto
mais se estenderem os
conhecimentos, tanto
mais facilmente
explicarão os fatos,
que, a princípio,
parecem sobrenaturais.
891. Falemos agora sobre
a mediunidade auditiva,
que consiste na
faculdade de ouvir
certos ruídos, certas
palavras pronunciadas
pelos Espíritos e que
não impressionam o
ouvido nas condições
ordinárias da vida.
892. É preciso
distinguir, para essa
faculdade, dois casos:
1º. a intuição; 2º. a
audição real. A intuição
se dá de alma para alma;
é uma transmissão de
pensamentos que se opera
sem o socorro dos
sentidos, uma voz íntima
que ressoa no foro
íntimo; embora os
pensamentos recebidos
sejam claros, não são
eles articulados por
meio de palavras e nada
têm de material. Na
audição, pelo contrário,
as palavras são
pronunciadas de maneira
a serem ouvidas pelo
médium, como se uma
pessoa lhe falasse ao
lado.
893. Allan Kardec, o
grande iniciador, que
quiseram fazer passar
por impostor, protesta
energicamente contra os
espiritistas crédulos
que pretendem atribuir
os fenômenos mais comuns
da vida à ação dos
Espíritos. Ele recomenda
a maior circunspeção na
análise dos fatos e não
cessa de dar conselhos,
a fim de premunir seus
adeptos contra os erros,
as alucinações, as
falsas interpretações.
894. Eis o que ele
escreveu a propósito da
mediunidade auditiva:
“É bem preciso abster-se
de tomar por vozes
ocultas todos os sons
que não tenham causa
conhecida, ou simples
tinidos de ouvidos, e
sobretudo de acreditar
que haja qualquer
parcela de verdade na
crença vulgar de que o
ouvido que tine está nos
advertindo que em alguma
parte se fala de nós.
Estes tinidos, cuja
causa é puramente
fisiológica, não têm,
aliás, qualquer sentido,
enquanto os sons
pneumatofônicos exprimem
pensamentos e é somente
por esse caráter que se
pode reconhecer que são
devidos a um causa
inteligente e não
acidental. Pode-se
estabelecer, em
princípio, que os
efeitos notoriamente
inteligentes são os
únicos que podem atestar
a intervenção dos
Espíritos; quanto aos
outros, há pelo menos
cem probabilidades
contra uma de que sejam
devidos a causas
fortuitas.
Acontece com bastante
frequência que no estado
de modorra ouvem-se
distintamente pronunciar
palavras, nomes, algumas
vezes até frases
inteiras, e isto com
bastante força para nos
despertar em
sobressalto. Embora
possa acontecer que em
certos casos se trate
realmente de uma
manifestação, esse
fenômeno nada tem de
bastante positivo que
impeça de se lhe
atribuir uma causa
qualquer, tal como a
alucinação. O que se
ouve por esse modo não
tem, de resto, sequência
alguma; não acontece o
mesmo quando se está
completamente acordado,
porque então, se é um
Espírito que se faz
ouvir, pode-se quase
sempre trocar
pensamentos com ele e
travar uma conversação
regular.”
895. Procuremos, agora,
compreender como podem
proceder os Espíritos
para nos fazerem ouvir
palavras e por que meios
produzem sons. Para este
estudo é preciso ter um
conhecimento da natureza
do som. Sir William
Thomson fez ultimamente
notável conferência
sobre o assunto.
896. Mostremos suas
principais observações.
Quais são as nossas
percepções no sentido do
ouvido? E em primeiro
lugar, que é ouvir?
Ouvir é perceber pelo
ouvido; mas perceber o
quê? Há coisas que nós
podemos ouvir sem o
ouvido. Beethoven,
atacado de surdez,
durante grande parte da
vida, não percebia nada
pelo ouvido. Compunha as
mais notáveis obras sem
poder percebê-las pela
audição. Ele se
conservava, diz-se,
perto de um piano, com
um bastão, o qual tinha
uma extremidade no
instrumento e a outra em
seus dentes, e era dessa
forma que ouvia os sons
emitidos.
897. A percepção dos
sons não tem, pois, o
ouvido como único órgão,
e daí já se pode
compreender que um
médium escute sons sem
se servir do ouvido. Mas
queremos determinar a
natureza da percepção
habitual num homem em
posse de todos os órgãos
dos sentidos. É uma
sensação de variação de
pressão.
(Continua no próximo
número.)
(1)
Daguerreotipada
significa retratada ou
fotografada. Essa
palavra tem sua origem
no nome de Daguerre, que
em 1839 inventou um
aparelho que permitia
obter, de forma
rudimentar, o que hoje
chamamos fotografia.