O
preço da
remissão
Hilário
Silva
I
No grande
castelo
português do
século XVII,
José Antônio
Maria de
Alenquer, jovem
senhor feudal,
chama os três
servidores mais
íntimos a
conselho. Quer
liquidar José
Joaquim, o
pequeno
bastardo,
nascido nos
últimos tempos
da existência do
pai viúvo.
Manuel Macário,
o mordomo, a
esposa e a filha
ouvem-no,
interessados.
Ganharão pequena
fortuna pela
cumplicidade.
E
José Joaquim,
menino de sete
anos, que se
deslumbra
perante a vida,
é conduzido
pelos quatro a
extenso poço
lotado de peixes
vorazes. E,
enquanto a
criança fita o
bojo das águas,
o irmão
desapiedado
arroja-lhe o
corpo frágil no
precipício.
Leve rumor. Um
grito abafado. E
depois o
silêncio. José
Antônio Maria de
Alenquer
senhoreia enorme
herança. E a
vida continua...
II
8
de fevereiro de
1957. Telegrama
dos jornais: "A
criança foi
devorada em vida
pelas piranhas!
Em poucos
minutos, dela só
restava o
esqueleto!
Presenciada
pelos pais do
menor a
horripilante
cena!
A
população da
pequena cidade
de Monte Alegre,
no Baixo
Amazonas, ainda
não se refez do
choque emocional
causado pela
tragédia que
envolveu uma
criança de sete
anos, devorada
em vida e em
poucos minutos
por um cardume
de famintas
piranhas e, o
que é pior, na
presença dos
pais e de irmã
menor, todos
horrorizados. O
menino Adílson,
a vítima, filho
do pescador
Darlan, era uma
criança muito
estimada pela
sua vivacidade e
seu temperamento
ameno. No dia em
que perdeu a
vida, de maneira
tão brutal,
havia sido
mandado pelo
pai, em
companhia de sua
irmã Josefina,
de onze anos,
numa pequena
canoa, a fim de
levar um recado
a um conhecido,
na outra margem
do rio
Gurupatuba, que
corre nos fundos
da casa do
pescador. Já no
meio da
travessia,
Adílson, a um
movimento menos
feliz, perdeu o
equilíbrio e
caiu na água.
Incontinenti, o
local onde
mergulhou o
menor tingiu-se
de sangue. A
infortunada
criança caíra
exatamente num
cardume de
vorazes
piranhas, que em
poucos minutos,
ou mesmo
segundos, a
devoraram.
Horrorizados, os
pais de Adílson
e a irmãzinha do
menino
assistiram à
cena
impressionante,
sem nada poderem
fazer, tal a
conhecida
rapidez com que
age essa espécie
de peixe.
Refeito da
brutalidade da
cena e passado o
cardume, o pai
de Adílson, como
um louco,
mergulhou nas
profundas águas
do rio e de lá
voltou trazendo,
apenas, um
esqueleto, quase
totalmente
descarnado.
Essa ocorrência
deixou chocados
a quantos dela
tiveram
conhecimento."
III
A
voracidade das
piranhas e o
assombro da
pequena família
foram o preço da
remissão da
falta
cometida...
Do cap. 5 do
livro A Vida
Escreve, de
Hilário Silva,
obra
psicografada
pelos médiuns
Francisco
Cândido Xavier e
Waldo Vieira.