MARIA ENY
ROSSETINI PAIVA
menylins@terra.com.br
Lins, SP
(Brasil)
Pureza
e impureza –
modificações no
conceito
de puro e impuro
Comentários
inspirados no
livro
Evolução
Espiritual do
Homem,
de
Herculano Pires
Em nosso estudo
sobre a ideia de
pureza e
impureza vimos
que o conceito
natural e
sensorial da
pureza, que
considera puro o
que nos dá
prazer e vida e
impuro o que é
desagradável e
nos leva à
morte, é
substituído a
princípio pela
experiência e
análise
racional. Por
exemplo, um
remédio pode ser
desagradável,
mas nos cura e,
assim, não pode
ser impuro.
Posteriormente,
com a
interferência do
poder religioso,
desde as tribos,
em mitos e
tabus, que
exigiam ritos de
purificação, as
ideias de puro e
impuro são
alteradas e
passam a ser
obstáculos à
nossa liberdade
e progresso. Seu
objetivo
principal
torna-se manter
o poder
constituído, nos
grandes impérios
do passado e
enriquecer a
casta
sacerdotal.
Essa, nas
primeiras
civilizações,
era a detentora
das terras, dos
bens e do
conhecimento,
mantido secreto,
para uso
exclusivo das
elites.
Assim, no antigo
Egito, os
sacerdotes
tinham domínio
da economia,
eram donos das
terras férteis,
conheciam a
ciência oculta e
eram muito
ricos. Exigiam
rigorosas
iniciações dos
novatos para
ensinar a
ciência oculta,
criaram os mitos
e deuses, para
manter o povo na
ignorância,
alegando não
poder ensinar
isso ao povo,
porque não
poderiam
conhecer a
ciência e a
verdade, tendo
em vista o
atraso e
ignorância da
gentalha. O
próprio faraó
era dominado
pelos sacerdotes
e seus ritos.
Obedecendo os
mitos criados
por eles mesmos,
que consideravam
que as mulheres
só podiam
conceber filhos
superiores e
semideuses,
quando
fecundadas por
deuses, os
sacerdotes
ensinavam que a
rainha concebia
o herdeiro do
trono, fecundada
pelos raios de
Amon Ra, o deus
Sol, por
processo divino.
A criança,
nascendo, tinha
seu crânio
alongado por
tiras, para
deformá-lo,
mostrando que o
faraó era
diferente dos
mortais comuns.
O faraó sempre
olhava para
cima, nas
cerimônias
públicas, e
nunca encarava
um ser “comum”
nos olhos.
Os mitos
egípcios da
criação do mundo
por Isis, que
fez bonecos de
barro, (sete, um
número mágico) e
depois aproximou
deles o sinal da
vida, fazendo-os
respirar, foram
a base de Moisés
para, na Gênese,
estabelecer o
Deus oleiro que
molda Adão do
barro, adaptando
o mito à ideia
de um só Deus.
Emmanuel nos
esclarece que o
Levítico mosaico
é um repositório
desses
conhecimentos
secretos,
escritos em
linguagem
cifrada, cuja
chave se perdeu
no tempo.
Moisés, por ser
um filho adotivo
da princesa,
tivera acesso em
sua educação a
essa Ciência
oculta, daí o
seu poder ser
capaz de
enfrentar o
poder
sacerdotal.
O mito da
virgindade e da
impureza da
mulher que tinha
vida sexual
permeia toda a
Antiguidade. O
cristianismo
durante séculos
oscila entre
essa ideia da
virgem mãe, que
não era questão
de fé
obrigatória na
Igreja, até que
na época do
romantismo, em
que Vitor Hugo
principia a
resgatar a
mulher em sua
dignidade,
fazendo-a ainda
que inferior,
mas pedestal e
companheira do
homem, a Igreja,
para manter a
mulher “em seu
devido lugar”,
proclama o dogma
da virgindade de
Maria e sua
ascensão em
corpo e espírito
ao Paraíso. Com
isso, apenas
ela, a Virgem
Mãe, a mulher
Santíssima, era
digna, e todas
as demais
permaneciam
indignas ou
“menos dignas”.
A castidade é
finalmente
condição
obrigatória da
espiritualidade,
e o prazer
sexual,
animalesco e
inferior, coloca
o homem e a
mulher casados
sempre em
desvantagens por
ceder aos
instintos
inferiores, ao
invés de superar
a matéria.
Na época de
Jesus os
sacerdotes
judeus chegavam
ao requinte da
exploração e da
dominação: a
mulher que
paria, com isso,
se tornava
impura. Era
necessário que
entregasse no
Templo dois
pombos para
serem
sacrificados a
Javé, comprando
dos vendilhões
aqueles que
tinham sido
“sagrados” pelos
sacerdotes. A
mulher não podia
entrar no
Templo. Não era
digna. Assim,
chegava apenas
até o átrio do
Templo de
Jerusalém,
entregava os
pombos para o
sacrifício e, só
depois, poderia
reassumir sua
vida sexual.
Claro que não
serviam pombos
criados por
você, em casa, a
preço mais
barato. Só os
pombos sagrados
em rituais eram
vendidos no
Templo e locais
de culto,
comprados com
dinheiro do
Templo. Os
fariseus e
sacerdotes
haviam
conseguido que o
dominador romano
permitisse o
câmbio das
moedas de César,
que eram as
válidas fora do
Templo. Com isso
as famílias dos
que viviam do
sacerdócio
enriqueciam e o
dinheiro parco
do povo,
empobrecido
pelos altos
impostos que os
romanos cobravam
dos povos
dominados para
manter o luxo de
Roma, era
entregue para
ser trocado em
mesas de
cambistas, de
forma desonesta
e exploradora
que mais os
empobrecia. Daí
por que Jesus
expulsa os
vendilhões (de
animais
sagrados), solta
os animais e
vira as mesas
dos cambistas.
Era a indignação
do Justo, diante
dos que faziam
do Templo um
antro de
ladrões. Era um
ato simbólico,
sem violência
contra pessoas,
para ensinar ao
povo e aos
exploradores que
havia quem não
concordava com
tais conceitos
de impureza e
rituais e
purificação.
Claro que no dia
seguinte o
comércio
continuou, mas
Jesus, na
ocasião,
exprobou a
hipocrisia dos
escribas e
fariseus que
deviam defender
o povo, e
mostrou-lhes o
que se reservava
aos que traíam
assim sua
tarefa, que
deveria ser
esclarecedora.
Esse ato de
Jesus foi um dos
que inspirou
Gandhi, em sua
gigantesca
tarefa de
libertar a Índia
do domínio
inglês, usando a
não-violência da
tradição hindu.
Gandhi, em
várias ocasiões,
ensinou a
desobediência
civil às leis
absurdas e, com
o povo, caminhou
pelas ruas em
marchas
diversas, onde
os objetos de
exploração do
colonizador
foram destruídos
e substituídos
por objetos
simples de
confecções
caseiras.
Esses fatos
relembrados em
parte por
Herculano Pires
no estudo
referido nunca
são explicados
por nossos
estudiosos,
exceção feita a
Herculano.
Nossos
escritores e
estudiosos
espíritas ainda
vivem engolfados
pela cultura
tradicional
religiosa do
Brasil. Assim,
consideram o
ato sexual como
uma
inferioridade
necessária ao
nosso estágio
evolutivo e que
é superada pelos
Espíritos
superiores.
Nem mesmo
procuram
“consagrar o
conúbio sexual,
entre almas
afins, unidas há
muitos séculos
pelo amor
conjugal”.
Sempre está
implícito que é
preciso ceder ao
sexo, porque
não temos ainda
condições do
amor espiritual.
No mediúnico, há
uma única
exceção. André
Luiz, no livro
Evolução em Dois
Mundos, foge da
visão de
“impureza” do
ato sexual e
chama o ato
sexual de
alimento
espiritual
necessário ao
progresso.
Colocação clara
e
revolucionária.
A cultura e a
vivência de
Herculano Pires
nos esclarecem
que, no
Espiritismo:
“Os conceitos
relativos a
pureza e
impureza
romperam suas
ligações
umbilicais com o
passado e
abriram-se em
novas dimensões
de uma realidade
surpreendente”.
Refere-se
Herculano às
novas dimensões
da vida
espiritual que o
Espiritismo nos
traz. “A pureza
deixou de ser um
tabu para se
transformar num
conceito real,
de bases
científicas.
Passou-se a
entender por
pureza a
naturalidade das
coisas, e
consequentemente
por impureza as
deformações das
realidades
sistemáticas
imaginárias dos
clérigos, dos
teólogos e
também dos
positivistas e
materialistas,
todos eles mais
amigos de Platão
do que da
verdade (negritamos).
Kardec mudava o
sentido dos
conceitos
fundamentais do
bem e do mal,
mostrando
através de suas
pesquisas
psicológicas, na
Sociedade
Parisiense de
Estudos
Espíritas,
que mal e bem
são conceitos
relativos ao
processo
universal da
evolução. O
mal é a
estagnação, o
atraso, a
ignorância, e
o bem é o
progresso, o
fluxo das coisas
e dos seres, a
transcendência”.
Quanta
sabedoria!
Apenas para
compreender e
explicar esse
parágrafo,
precisaríamos
escrever muitos
artigos. No
entanto, as
mudanças da
década de 1960,
o movimento pela
liberdade sexual
no mundo, pela
dignidade da
mulher, da
criança formulam
as novas leis
que se aproximam
mais da
igualdade e
caminham para
maior Justiça e
Amor. Os
filósofos
modernos têm
desmitificado
Platão,
mostrando-nos
que as ideias do
Absoluto nos
fazem escorregar
para mentiras e
autoritarismos.
Já o
Racionalismo
relativo,
esposado pelo
Espiritismo,
desde sua
Codificação,
faz, da pureza e
da verdade,
conceitos
relativos, e
isso nos deve
dar uma postura
humilde, pela
compreensão de
que a verdade é
evolutiva.