GEBALDO JOSÉ DE
SOUSA
gebaldojose@uol.com.br
Goiânia, Goiás
(Brasil)
“Faze isso e
viverás!"
O Evangelho –
poema sublime de
ternura e amor –
contém, em seu
conjunto, lições
eternas e
belíssimas, seja
pela
simplicidade ou
concisão em que
são vazadas,
seja por seus
conteúdos.
Dentre elas,
particularmente
nos toca o
coração a
Parábola do Bom
Samaritano
(Lucas,
10:25-37) e os
diálogos que a
antecedem, entre
o doutor da lei
e Jesus. A frase
que intitula
este artigo é um
convite perene
do Mestre à
vivência
daqueles ensinos
– uma ordem
carinhosa a
todos nós, e
roteiro de
iluminação para
nossos
Espíritos.
Nessa
ordem-convite,
Ele,
resumidamente,
nos diz que,
enquanto não
executamos seu
programa de
amor, nossos
Espíritos não
vivem. Não se
refere, é claro,
à vida do corpo
que, por mais
vigoroso, detém
condição
passageira, que
não nos deve
iludir. Emmanuel1
esclarece-nos:
“Semelhante
afirmação
destaca-se
singularmente,
porque o Cristo
se dirigia a um
homem em plena
força de ação
vital,
declarando
entretanto:
Faze isso, e
viverás. É
que o viver não
se circunscreve
ao movimento do
corpo, nem à
exibição de
certos títulos
convencionais.
Estende-se a
vida a esferas
mais altas, a
outros campos de
realização
superior com a
espiritualidade
sublime”.
Ao intérprete da
lei, que o
buscava para o
tentar, e que
lhe indagava
sobre o “que
preciso fazer
para possuir a
vida eterna?”2,
Jesus, à maneira
socrática, e por
lhe conhecer a
malícia,
devolve-lhe a
pergunta: “Que é
o que está
escrito na lei?
Que é o que lês
nela?”.
Aquele lhe
responde com a
citação dos dois
mandamentos que,
no dizer do
Mestre, (Mateus,
22:40), contêm
“toda a lei e os
profetas”: o
amor a Deus e ao
próximo como a
si mesmo.
Jesus, num fecho
admirável, então
lhe diz:
“RESPONDESTE
MUITO BEM; FAZE
ISSO E VIVERÁS”.
Revela compaixão
pelo publicano,
tratando-o com
brandura, não
levando em conta
sua insolente
intenção. Colhe
a oportunidade
para
esclarecê-lo
fraternal e
bondosamente,
como um Mestre
verdadeiro, que
não faz acepção
de pessoas; que
não se
desequilibra com
provocações; que
a ninguém
exclui, porque a
todos ama e por
saber que os
enfermos
necessitam de
médico e, os
ignorantes, de
mestres. Age
construtivamente,
elevando o
outro, ao
contrário de nós
outros que, na
maioria das
vezes, reagimos
com irritação às
provocações
recebidas,
nivelando-nos
aos agressores.
O homem da lei,
não se dando por
vencido, não
obstante a
surpresa e a
rapidez com que
foi desmascarada
sua esperteza,
pois, discutidor
por excelência,
apresenta-lhe
nova questão:
“Quem é o meu
próximo?”.
O Divino Amigo
narra-lhe aquela
parábola e,
assim, com
exemplos
práticos, dá-lhe
o esclarecimento
preciso, a
medida exata. E,
ao final,
devolve-lhe mais
uma vez a
pergunta: Qual
foi o próximo
daquele homem?,
obtendo segunda
resposta: “O que
usou de
misericórdia
para com ele.”
Reitera-lhe,
novamente, a
recomendação:
“Então, vai, e
faze o mesmo”.
Carlos Torres
Pastorino3
registra que:
“(...) o sistema
de fazer
perguntas para
embaraçar o
interlocutor era
habitual entre
os doutores da
lei e os
escribas que
(...) com
facilidade
confundiam os
outros, firmando
então seu
conceito de
sábios perante o
público”.
“Para os
israelitas,
‘próximos’ eram
os pais, os
filhos, os
parentes, os da
mesma religião,
os da mesma
raça, nessa
ordem de
precedência. Os
‘pagãos’ e
samaritanos não
constituíam o
‘próximo’, mas o
adversário.”
Ora, ainda hoje
não é assim que
agimos? Por
isso, ainda não
vivemos, por não
sabermos amar
nossos irmãos
indistintamente,
usando de
misericórdia em
todos os
momentos e
circunstâncias.
Jesus não só
ensina, mas vive
aquilo que
predica: para
com os próprios
doutores da lei,
esclarecendo-os
nessa e em
outras
passagens,
quando buscavam
intrigá-lo ou
irritá-lo, agiu
como o
personagem-símbolo
da parábola; na
passagem com a
adúltera, quando
muitos a
condenavam,
buscando
apedrejá-la,
usou Ele também
de misericórdia;
no silêncio
diante de
Pilatos; no alto
do Calvário, a
rogar perdão por
aqueles que não
sabem o que
fazem, e em
tantas outras,
no Seu
apostolado entre
nós.
Jesus é o nosso
boníssimo
samaritano. Pois
o que faz Ele
para com a raça
humana, há dois
mil anos, não
obstante nossa
rebeldia e
ignorância,
senão agir como
o Bom
Samaritano?
É ainda
Pastorino, na
mesma obra e
volume
indicados, quem
afirma:
“Terminada a
parábola, muito
psicologicamente,
Jesus não lhe
tira a ilação
moral: deixa
esse encargo ao
doutor,
obrigando-o a
pronunciar-se
categoricamente,
passando de
inquisidor a
inquirido: ‘Qual
dos três foi
próximo do
ferido?’. A
resposta veio
sincera e
correta, mas
teria sido muita
humilhação
reconhecer que o
‘samaritano’
tinha sido
superior ao
sacerdote e ao
levita de sua
religião. Então,
responde com um
circunlóquio: o
que teve
misericórdia com
ele”.
O que nos ensina
hoje a Doutrina
Espírita quanto
à caridade
material e à
caridade moral?
É de um pão que
necessita o
próximo? É de um
abrigo? É de uma
veste? É do
remédio? Ou é de
uma palavra
amiga, de um
aperto de mão,
de um olhar de
bondade, de uma
presença
solidária, de um
ensino, de um
bom livro, de
uma doutrinação,
de uma visita,
de uma prece?
É a caridade do
prato de sopa? É
a da
evangelização,
sobretudo a da
infância? Ou é
de ambas as
coisas, da
caridade
material e
moral?
Uma não dispensa
a outra; e
certas situações
exigem o
exercício de
ambas.
Quem olha com os
olhos da
compaixão vê a
necessidade do
“outro”, do
próximo, e o
atende
prontamente ele
mesmo, não
amanhã, nem por
terceiros. Pois
a caridade que
demora não
alcança o
necessitado, eis
que tardia. É
certo o ditado
popular que diz:
“Dá duas vezes,
quem dá
depressa”.
Pode haver
caridade maior
que a de
esclarecer
desencarnados
que não se
prepararam para
a vida
verdadeira?
Sobretudo porque
os ensinos de
muitas religiões
os ignoram; ou
os tratam por
“demônios”,
agredindo-os,
maltratando-os,
quando são
apenas enfermos,
necessitados de
médico.
É belo curar
chagas do corpo,
mas sublime
extirpar lepras
da alma. O
Espiritismo nos
faculta o
exercício dessa
caridade tão
consoladora e
necessária nos
dias em que
vivemos; e de
tantas outras...
Às vezes não nos
damos conta da
importância
dessas coisas
tão simples e ao
alcance de
nossas mãos; ou
nos perdemos na
rotina,
fazendo-as
maquinalmente,
sem envolver o
coração, sem
amar os
sofredores, sem
darmos de nós
mesmos.
Desatentos, não
cumprimos com
alegria e
plenitude o
dever de amar
aquele que está
à margem da
vida, com
feridas na
alma...
Ao realizar
tarefas de amor,
devemos:
“(...) dar o
dinheiro e a
palavra, (...) o
sentimento, o
tempo, o braço e
o estímulo
fraterno,
utilizando, para
isso, as
próprias forças.
(...) A
caridade, por
substitutos,
indiscutivelmente
é honrosa e
louvável, mas o
bem que
praticamos em
sentido direto,
dando de nós
mesmos, é sempre
o maior e o mais
seguro de
todos”.4
Numa bela
página,
Eurípedes
Barsanulfo5
nos lembra:
“Construindo o
bem sem alarde,
no sublime
anonimato do
amor fraterno,
os espíritas
podem e devem
ser os novos
samaritanos, em
plena vida de
hoje”.
Para isso, é
indispensável
colocarmo-nos no
lugar do outro,
do necessitado.
Como tudo é
transitório,
tudo é
passageiro,
amanhã, quem
sabe, seremos
nós aquele que
estará à margem
do caminho, à
espera de alguém
que, em nome do
Mestre, aja em
nosso benefício,
socorrendo-nos
fraternal e
bondosamente,
sem indagar quem
somos, o que
temos, qual
nossa religião,
qual a cor de
nossa pele, que
língua falamos,
de onde viemos e
para onde vamos.
Que seja, então,
apenas um irmão,
com ternura no
olhar e
compaixão no
coração, a
estender-nos a
mão, a pensar
nossas feridas e
a nos amar, no
instante
preciso.
É assim que
queremos?
Façamos o mesmo,
pois hoje é o
nosso dia e a
nossa hora de
doar e de
aprender a amar,
exercitando-nos
na misericórdia
e na compaixão
para com o
próximo.
Só então
VIVEREMOS!
Bibliografia:
1. XAVIER,
Francisco
Cândido.
Caminho, Verdade
e Vida, pelo
Espírito
Emmanuel, Cap.
157, 15ª ed. FEB.
Rio, 1994;
2. Bíblia
Sagrada,
trad. de João
Ferreira de
Almeida, Soc.
Bíblica do
Brasil, Brasília
(DF), 1969;
3. PASTORINO,
Carlos T.
Sabedoria do
Evangelho,
vol. 5º, págs.
12 a 16,
Sabedoria Livr.
Edit. Ltda.,
Rio, 1967;
4. XAVIER,
Francisco
Cândido.
Jesus no Lar,
pelo Espírito
Neio Lúcio, Cap.
29, 20ª ed. FEB.
Rio, 1994;
5. XAVIER,
Francisco
Cândido. O
Espírito da
Verdade,
Autores
Diversos, Cap.
86, 9ª ed. FEB.
Rio, 1995.