A. Que é que o
enfermeiro Cândido quis
dizer com a expressão
“enxugador de lágrimas”?
Cândido referia-se assim ao livro de Kardec O
Evangelho segundo o
Espiritismo, que ele
consultava sempre que a
dor lhe batia à porta. E
foi o que fez para
conforto de Rafael.
Este, a pedido do
enfermeiro, abriu o
livro ao chamado acaso e
Cândido leu, com ênfase
e unção, a página de luz
que respigava bálsamo e
conforto moral sobre o
ouvinte sucumbido.
(Tramas do Destino, cap. 10, págs. 85 e 86.)
B. O que a prece produz
naquele que ora?
A prece refrigera, acalma e encoraja. Ela nem
sempre modifica as
coisas, todavia, sempre
nos modifica,
ajudando-nos a ver e
entender os
acontecimentos pelo
ângulo correto, através
do qual deve ser
examinado. E isto é o
que importa, porque não
é válido que Deus nos
afaste os obstáculos,
quanto é sábio que nos
dê meios para os
afastar.
(Obra citada, cap. 10, págs. 87 a 89.)
C. Em que momento e de
que modo o homem se
libera dos erros?
Quando o homem se resolve mudar interiormente,
deixando que lhe caiam
dos olhos as escamas da
cegueira moral, tem
início a sua libertação.
Não foi por outra razão
que Jesus, quando
socorria os enfermos que
o buscavam, os incitava
à mudança de
comportamento, fixando
cada qual no amor, para
poupar-lhes ocorrências
piores do que aquelas de
que se vinham libertar.
Mas o homem somente se
libera dos erros quando
os resgata, na redenção
pela dor ou na ascensão
pelo amor, mediante o
bem que faça.
(Obra citada, cap. 10,
págs. 87 a 89.)
Texto para leitura
34. O médico fala energicamente a Rafael
- O tratamento de
Lisandra correu como
previsto, e o Dr.
Armando, que a assistia
em casa, surpreendeu-se
com a sua boa disposição
orgânica, em contraste
com o problema
psíquico. O quadro
parecia marchar para a
loucura irremediável.
Sem nada informar à
esposa, ele resolveu
manter uma entrevista
com Rafael, a fim de
prepará-lo para o que
esperava ser, em futuro
próximo, um desfecho
fatídico. Nada falaria,
porém, acerca da
hanseníase de Lisandra.
Na primeira
oportunidade, o médico
mandou chamar Rafael e,
sem maior delonga, foi
direto ao assunto: "Não
estou autorizado pela
família – informou,
conciso – para o que lhe
vou narrar. Faço-o com a
minha responsabilidade
e consciência médica.
Possivelmente, os seus
aguardam que se
modifiquem os estados
atuais, poupando-o de
dissabores... Talvez não
se deem conta da
gravidade da
questão..." Rafael
perguntou de que ele
falava e o médico
esclareceu que falava
de Lisandra: "Está
enferma mentalmente, a
caminho de séria
alienação. Desejo,
porém, esclarecer-lhe
que qualquer atitude
violenta,
irresponsável, de sua
parte, poderá acarretar
seu desenlace, em
lamentável estado, num
Manicômio. Procure
refletir de forma
edificante e benéfica, e
contribua sem o egoísmo
que o carcome". Dr.
Armando disse, então,
com toda a franqueza, a
Rafael sobre a maneira
com que ele próprio agia
com a filha e seus
familiares em face de
sua enfermidade:
"Tem-lhe escrito? Que
lhe fala? Quais as
esperanças que lhe
transmite e as
consolações que a ela e
aos demais lhes dá?" O
médico lhe disse, nesse
ensejo, verdades
irretorquíveis que ele,
até então, se recusara
aceitar, esquecido de
que o isolamento não é
somente de quem se
recolhe ao tratamento no
Hospital, e que sua
família, não somente
ele, também sofria em
face de seu drama
pessoal. (Cap. 10, págs.
83 e 84)
35. O "enxugador de lágrimas" -
"Ninguém nunca me falou
assim", revidou Rafael,
colérico. Dr. Armando,
sem qualquer receio,
respondeu: "Pois é tempo
de que alguém o faça.
Aliás, isto é coisa que
eu deveria ter feito
antes, como responsável
por esta Instituição e
pelo bem-estar de todos,
e não apenas do
senhor..." A imagem da
filha num Manicômio fez
Rafael estremecer.
Deu-se, então, conta da
leviandade e da falta de
amor real para com os
seus. Viu, mentalmente,
a esposa debilitada pela
sucessão dos
infortúnios, a irmã, o
filho, e chorou muito,
sem poder estancar as
lágrimas, pois se
recordou de que suas
cartas eram sempre
portadoras de fel e
veneno, jamais de
consolo. Mais humilde
ante a dor, inquiriu se
a situação de Lisandra
era grave. O médico
respondeu
afirmativamente. Rafael
fez-lhe um resumo das
distonias de que a filha
fora vítima
anteriormente à sua
internação no Hospital,
ante o olhar atento do
Dr. Armando. A
narração, repassada de
sentimento, funcionou
como proveitosa catarse,
como um dreno psíquico.
Aquele homem de caráter
difícil jamais expusera
seus problemas a quem
quer que fosse, e, por
isso, emparedava-se nas
opiniões infelizes,
decorrentes das
autoanálises tormentosas
a que se impunha, sem
uma visão clara. O
médico, finda a
narrativa, convocou-o a
uma salutar mudança de
atitude e prometeu-lhe
ajuda e amizade. O pai
de Lisandra saiu dali
cambaleante, com a alma
em frangalhos, quando
alguém o chamou, de
longe, com insistência.
Era Cândido, o
enfermeiro espírita, que
notou a palidez de
Rafael. Logo o amigo
inteirou-se dos motivos
da tristeza do interno.
Lisandra estava enferma
da mente! "Ora, meu
amigo, onde está sua
confiança em Deus? Já
orou, rogando ajuda?",
indagou-lhe Cândido, que
em seguida convidou-o a
ir com ele até à
enfermaria, na sala de
curativos. Fechada a
porta, ele retirou de
uma gaveta um exemplar
d' O Evangelho segundo o
Espiritismo, de Kardec.
"Eis aqui o meu
enxugador de lágrimas",
informou o enfermeiro,
com grave acento na voz.
Rafael abriu o livro ao
chamado acaso e Cândido
leu, com ênfase e unção,
a página de luz que
respigava bálsamo e
conforto moral sobre o
ouvinte sucumbido. (Cap.
10, págs. 85 e 86)
36. Como o plano espiritual nos ajuda
- Cessada a leitura
edificante, que carreou
para o ambiente forças
sutis do Mundo
Invisível, Cândido orou,
pedindo a Rafael que o
acompanhasse em
silêncio. A prece,
partida das nascentes do
coração a fluir na
direção do Pai, caldeava
as energias puras das
Divinas Concessões e
retornava como poderoso
agente restaurador. Ato
contínuo, impelido pelo
desejo de ajudar,
aplicou-lhe passes
refazentes, após o que,
gentil, interrogou:
"Então, como se sente?"
Rafael declarou-lhe que
se sentia melhor, como
jamais havia ocorrido
antes. "Algo
inexplicável infunde-me
paz e fé, conforto,
quase alegria, pela
primeira vez, nestes
tristes, demorados anos
de minha existência",
acrescentou o
hanseniano. Era o efeito
da prece, que refrigera,
acalma e encoraja,
disse-lhe Cândido. "A
prece nem sempre
modifica as coisas,
todavia, sempre nos
modifica, ajudando-nos
a ver e entender os
acontecimentos pelo
ângulo correto, através
do qual deve ser
examinado. E isto é o
que importa. Não é
válido que Deus nos
afaste os obstáculos,
quanto é sábio que nos
dê meios para os
afastar..." Depois de
ligeiro momento de
silêncio, Rafael pediu a
Cândido lhe emprestasse
aquele livro. "Talvez
ele seja a solução para
o que se passa comigo e
com os meus",
acrescentou. Cândido
foi peremptório: "Será
a solução, sim.
Recorde-se, entretanto,
de que tudo continuará
como antes, ou, talvez,
piore... Você, porém,
verá tudo melhor,
saberá os porquês das
coisas, conhecerá as
fórmulas da resignação
e da coragem, que
solucionarão as
dificuldades que o
maceram e lhe aumentam
o fardo das atuais
provações". Rafael
tornou a dizer: "Espero
poder recomeçar a vida,
diminuir as
consequências dos meus
erros, modificar-me,
ajudar. Nesse momento
experimento o desanuviar
da minha mente.
Parece-me que estou
emergindo das sombras,
atraído por poderosa e
bela claridade..." Era
D. Adelaide, mercê de
Deus, a real autora
daqueles acontecimentos
oportunos. Fora ela quem
inspirara o Dr. Armando
e o conduzira no
diálogo com o genro, e
foi também ela quem
induzira Cândido a
acercar-se do local, no
momento certo, guiando a
mão do enfermo ao abrir
o livro e ajudando o
enfermeiro na aplicação
do passe. Foi preciso
que a dor voltasse a
fustigar-lhe o espírito,
em dimensão
imprevisível, para que
Rafael sacudisse dos
ombros a carga revel que
o dominava no reino das
paixões inferiores. Não
se operou nele uma
transformação
miraculosa, nem seria
justo que isso
acontecesse. Havia, isto
sim, uma disposição
nova, e quando o homem
se resolve mudar
interiormente, deixando
que lhe caiam dos olhos
as escamas da cegueira
moral, tem início a sua
libertação. Não foi por
outra razão que Jesus,
quando socorria os
enfermos que o buscavam,
os incitava à mudança de
comportamento, fixando
cada qual no amor, para
poupar-lhes ocorrências
piores do que aquelas de
que se vinham libertar.
O homem somente se
libera dos erros quando
os resgate, na redenção
pela dor ou na ascensão
pelo amor, mediante o
bem que faça. (Cap. 10,
págs. 87 a 89)
37. A influência obsessiva
- O abalo moral que a
notícia da alienação de
Lisandra produziu em
Rafael levou-o ao leito.
O sistema nervoso,
desgovernado por muito
tempo, não suportou a
carga do desespero,
causando-lhe transtornos
psíquicos e físicos. A
hanseníase, cujos
fatores predisponentes
se concentram nos
recônditos do espírito
culpado, ao desconcerto
da emotividade que
depauperou o organismo,
fez-se mais danosa,
aumentando o processo
degenerativo das
células, com resultados
dolorosos. Sem forças
para a recomposição
interior, ele deixou-se
sucumbir pelo
desalento. A
irascibilidade, por
muitos anos não
disciplinada, cedia
lugar ao pessimismo,
fruto da revolta
incontida. Ele jamais,
na Colônia, saíra de si
mesmo, para distender a
solidariedade da afeição
junto aos companheiros
de infortúnio.
Fechara-se na concha de
aço do egoísmo, como se
fosse um inocente
inditoso, colhido pela
artimanha das leis da
impiedade. O egoísmo,
sem dúvida, é a sórdida
masmorra dos orgulhosos,
que a preferem até
quando a alucinação os
vence. Num reduto de
sofrimentos coletivos
há sempre alguém mais
vencido que necessita de
auxílio fraternal, em
cujo cometimento o
benfeitor se transforma
numa fímbria de luz,
esparzindo esperança. E
enquanto conforta,
consola-se; ao iluminar,
clarifica-se. Cândido
instou com o enfermo no
sentido da
autorrenovação.
Passados, porém, os
primeiros momentos da
cariciosa aragem
espiritual,
experimentada após a
prece e o passe, Rafael
não mais se animara a
voltar a ler o "Livro
da Vida". Ele tombara
nas ganas de ardilosa
vingança que lhe
impunham vítimas do
passado, especialmente
uma delas, ora em
hospedagem psíquica de
caráter obsessivo. A
entidade perniciosa
comprazia-se em
inspirar-lhe ódio contra
si mesmo, produzindo-lhe
evocações mentais
perturbantes e
interferindo em seu
psiquismo. (Cap. 11,
págs. 91 e 92)
(Continua no próximo
número.)