LEDA MARIA
FLABOREA
ledaflaborea@uol.com.br
São Paulo, SP
(Brasil)
Parábola de Lázaro e o
Rico
É um ensino alegórico,
representativo do que se
passa no plano
espiritual, para afirmar
que a nossa vida
além-túmulo é uma
consequência justa e
equitativa da nossa
existência na Terra.
A parábola fala do
abismo entre os que
livremente pautam suas
escolhas no bem, no
nobre e no belo, e os
que, também, livremente,
insistem em permanecer
em atitudes de
desequilíbrio, deboche e
insensatez frente aos
convites de mudanças
propostos por Jesus.
É a escolha de cada um
e, por isso mesmo, o
Mestre nos fala das
imutáveis leis divinas e
de como o homem é o
próprio criador do seu
céu e do seu inferno.
Eis a parábola:
Um rico vivia
luxuosamente em seu
palacete, vestindo-se
com finas roupas e
banqueteando-se
esplendidamente todos os
dias. À porta de sua
residência, jazia um
pobre homem de nome
Lázaro, coberto de
feridas e com fome.
Desejava catar as
migalhas que caíam da
mesa do rico, mas
ninguém lhas dava, e ele
não podia mover-se para
apanhá-las.
Um dia, o pobre Lázaro
morreu e foi levado
pelos anjos, ao seio de
Abraão. Algum tempo
depois, o rico também
morreu e “foi
sepultado”.
O texto conta que, no
inferno, o rico
“levantou os olhos”,
não os olhos materiais,
mas os do Espírito
(destaque nosso),
seguindo-se estranho
diálogo entre ele e
Abraão –
representante do mundo
espiritual, das regiões
mais elevadas.
No meio dos seus
sofrimentos, o rico pede
a Abraão que mande
Lázaro refrigerar-lhe a
língua com uma gota de
água, para aliviar um
pouco suas agonias.
Abraão, porém, nega-lhe
o pedido, acrescentando
que há um “abismo” entre
os do inferno e os das
alturas, de maneira que
não há possibilidade de
trânsito entre os dois
níveis.
Em seguida, pede que
mande Lázaro à casa de
seu pai, para que conte
aos cinco irmãos o que
está acontecendo, para
que não tenham que vir
para o mesmo lugar. Mais
uma vez, Abraão diz que
eles têm Moisés e os
profetas e que se eles
não conseguem ouvi-los,
como escutarão alguém
que já morreu?
Como todas as parábolas
de Jesus, esta também
tem endereço certo.
O que se faz necessário,
antes de qualquer coisa,
é compreender o conceito
de rico, segundo o ponto
de vista do Mestre, pois
a parábola fala de um
rico egoísta e avarento,
que não sabe aplicar de
forma justa a riqueza
que Deus colocou,
transitoriamente, em
suas mãos.
Em momento algum,
refere-se aos ricos que
fazem com que suas
fortunas sejam fonte
perene de bens, e que
favorecem a todos que
estão ao seu redor.
E o Evangelho
adverte-nos que o homem
não possui de seu senão
aquilo que pode levar
deste mundo. O que ele
encontra ao chegar e
deixa ao partir, goza
durante sua permanência
na Terra; mas, desde que
seja forçado a
deixá-los, é claro que
só tem deles o usufruto.
Por ser mero
depositário,
administrador dos bens
que Deus, por
misericórdia, colocou em
suas mãos, terá de
prestar contas de como
esses bens foram
empregados.
Para entender melhor
essa parábola,
precisamos separar seus
trechos.
1 – Assim, quando Jesus
narra que há um abismo
entre o inferno e o céu,
não se refere,
certamente, à
impossibilidade de uma
conversão após a morte,
como se os sofrimentos
fossem eternos e os
gozos dos habitantes
celestes sem-fim.
O texto não menciona uma
só palavra, algo como
“conversão” do sofredor.
O que o rico pede é
somente alívio das
penas; não se mostra
arrependido. Pensa em
aliviar seu mal, sem se
converter da sua
maldade. Continua igual
a como era na vida
planetária.
Segundo o ponto de vista
de Jesus, o que o rico
sofredor pede não é
possível em face da Lei
de Justiça. Enquanto a
maldade perdurar no seu
íntimo, o mal persistirá
nos seus atos e
pensamentos.
O interessante é que ele
não solicita nova
encarnação para a
remissão dos seus
enganos; não solicita
que seus irmãos mudem a
conduta diante de Lázaro
redivivo, mas que eles
não venham a sofrer o
que ele está sofrendo.
Diante da solicitação,
Abraão fez ver que eles
não estão com vontade de
se converterem, pois
sequer atendem a Moisés
e aos profetas.
2 – podemos perceber que
a pretensa dissociação
entre culpa e pena,
entre causa e efeito,
entre maldade e mal, é
absolutamente impossível
em face das leis
divinas. Por isso,
Abraão diz existir um
grande abismo entre uns
e outros.
É importante salientar
que esse abismo não é
criação de Deus, mas é
cavado pelo próprio
homem. Deus não fez
nenhum céu e nenhum
inferno para o homem. É
o livre-arbítrio humano
o responsável por eles.
Por essa razão, céu e
inferno não são lugares
geograficamente
localizados no
além-túmulo, mas, sim,
estados da consciência,
criações humanas que
determinam sofrimentos
ou bem-aventuranças.
Jesus nos disse que o
Reino dos Céus está
dentro de nós e o reino
do inferno também pode
estar. Portanto, é
tolice imaginar que
desencarnados tornam-se
anjos, se não mudarem a
mentalidade enquanto
estiverem encarnados.
Somos o que somos, aqui
e além.
A morte do corpo não
destrói os sentimentos
inferiores, negativos,
que abrigamos no
Espírito. Quem vivia
ligado às coisas da
matéria, sem se
incomodar com as coisas
de Deus, continuará, no
plano espiritual, a ser
alguém ligado à matéria
e, agora, sofrendo.
Por essa razão, existe
esse abismo entre os
dois mundos da parábola.
Então, enquanto esse
homem materialista não
modificar seus
sentimentos, retornará
ao círculo da matéria
tantas vezes quantas
forem necessárias, até
que se modifique.
A cada nova vivência,
será despertado para
novos valores. “Somente
um novo compreender, um
novo querer, um novo
viver é que podem
redimir o homem de suas
maldades, e, finalmente,
de todos seus males.” (Huberto
Rohden)
3 – A parábola do rico
avarento e do pobre
Lázaro encerra, ainda,
outra visão:
Há quem pense que o
sofrimento seja fator de
redenção. Nenhum
sofrimento em si redime
o homem, mas, sim, a
atitude do homem face ao
sofrimento: desespero,
revolta ou
aproveitamento da lição
bendita. Dois caminhos e
uma escolha...
Um encara as
dificuldades com
otimismo, porque tem fé
na Providência Divina,
nos bons Espíritos e em
si mesmo. Sabe que é
filho de Deus com
infinitas possibilidades
de vencer, em cada fase
evolutiva, apesar das
dificuldades inerentes a
ela.
O outro revolta-se ante
os problemas: não
aceitação, desesperança,
transfere para os
outros, inclusive a
Deus, as
responsabilidades que
nos são próprias.
Com isso, acabamos por
acrescentar um quadro de
desequilíbrios, forjados
por nós mesmos, frutos
das nossas escolhas
descabidas, com desejos
e caprichos de todas as
ordens. Com essa
atitude, perde-se o
fruto da bênção que
poderia aliviar e até
mesmo anular as penas em
reencarnações vindouras.
O Mestre nos ensina,
então, a entender o
valor educativo das
aflições. No início
doem, machucam a alma,
como o aluno que é
reprovado. Mas, após
vencer as primeiras
provas, as lutas
seguintes transformam-se
em alimento espiritual,
porque entendemos que só
através do trabalho
diário de renovação,
contra nossas
imperfeições, podemos
nos melhorar.
Portanto, “o simples
fato de ser rico não
constitui obstáculo
irremovível para os
Espíritos que descem à
Terra, assim como as
palavras de Jesus não
representam a
proclamação automática
da salvação dos pobres
de bens materiais” (P.
Alves Godoy). O “é
mais fácil um camelo
passar pelo buraco de
uma agulha do que um
rico entrar no Reino dos
Céus” não significa
o rico de bens
materiais, mas o rico em
orgulho, egoísmo,
avareza, cobiça.
Quantos ricos há que
podem ser considerados
Lázaros da parábola; e
quantos pobres podem ser
considerados os ricos.
O sofredor da parábola
não se converteu com os
sofrimentos pelos quais
passava. Podia querer e
não o fez. A alma sem o
corpo físico pode
converter-se quando
quiser, pois o
livre-arbítrio – o
direito de escolhas – é
atributo do Espírito e
não da matéria.
A ideia comodista e
irresponsável de que “a
carne é fraca” sucumbe
diante dessa afirmação.
A carne não é fraca;
fraco é o Espírito que
não luta contra as
tentações.
E onde buscar a força, a
coragem para essa luta?
Em Jesus. Na prece
sentida, acreditando que
não há órfãos na Criação
e que somos capazes de
vencer as atribulações.
“Vinde a mim vós todos
que estais atribulados e
eu vos aliviarei.”
Busquemos, pois, Jesus.
Bibliografia:
1. ROHDEN, Huberto.
Sabedoria das Parábolas
– 12ª ed., Editora
Martin Claret – São
Paulo/SP, 1997, p. 35.
2. GODOY, Paulo Alves.
As Maravilhosas
Parábolas de Jesus – 9ª
ed., Edições FEESP – São
Paulo/SP – 2008 – p. 74.
3. KARDEC, Allan. O
Evangelho segundo o
Espiritismo – Cap. V e
XVI.
4. SCHUTEL, Cairbar –
Ensinos e Parábolas de
Jesus – 14ª ed., Casa
Editora O Clarim –
Matão/SP – 1997 – 1ª
Parte – p. 104.