GUARACI DE LIMA SILVEIRA
glimasil@hotmail.com
Juiz de Fora, MG (Brasil)
Nos tempos após
Conversávamos em nosso
grupo de estudos e
preparações. Estávamos
felizes. Enfim a tão
esperada oportunidade de
renascer surgiu-nos como
proposta divina. Quantas
vezes a tivemos e
quantas vezes as jogamos
ao léu, como se joga um
lencinho de papel ao
chão, ao relento, ao
nada.
Sabe-se na Terra o
quanto é difícil
reencarnar. O quanto nos
custa ser avaliados para
depois sermos aceitos.
As reencarnações futuras
não terão mais a
compulsoriedade como
instrumento para
alavancar almas
desanimadas ou em
contínuos erros. Somente
renascerão os aptos a
construírem sociedades
equilibradas e dentro de
padrões éticos que
impulsionem
definitivamente a moral.
Nosso grupo preparatório
enquadrava-se aí.
Renascendo, não nos
seria permitido erros
primários. As
reencarnações futuras
terão esta proposta. O
que nos deixava
apreensivos era a
constituição humana em
seus parâmetros de ação.
Ainda o homem não
resolveu suas questões
íntimas e pessoais.
Ainda não se coloca como
artífice da própria
evolução. Ainda se tem
como um ser apenas
sobrevivente. Nós não
poderíamos entrar por
esses vieses de
comportamentos, de
ideologias, de perpétuas
posturas errôneas. Nosso
grupo renasceria para
vencer. Era a proposta.
Desde sempre a
humanidade teve as
informações necessárias
para os renascimentos.
Não houve ninguém que
reencarnasse em qualquer
época da história, que
não trouxesse consigo um
aval do mundo maior. Que
não trouxesse em si as
premissas das vitórias
espirituais para as
quais renascia. Mesmo
que em regimes
civilizatórios
primários, mesmo que
inda necessitasse
conquistar territórios,
mesmo que as lições
iluminadas dos planos
superiores não pudessem
alcançá-lo de imediato.
Era, contudo, uma
preparação. Eram
conteúdos a se avolumar,
enriquecendo mentes e
corações. Nosso grupo
também tinha histórias
assim para contar.
Tantas vezes de lanças
em riste avançamos
céleres e celerados,
matando, destruindo,
conspurcando direitos,
envolvendo-nos
seriamente com a
discórdia. Recebemos os
frutos daquelas sementes
plantadas. Choramos e
nos culpamos.
Arrependemo-nos e nos
colocamos ao dispor das
intempéries para
corrigir caminhos. Assim
é com todos aqueles que
lançam espinhos onde
deveriam lançar as
rosas. Deus nos cria
como sementes divinas.
Para florescermos
continuamente, para não
nos permitirmos as
posturas indébitas nos
parâmetros do processo
da evolução. Um
pecadinho aqui, um
errinho ali, um deixar
para depois acolá. Tudo
isto vai se somando e,
quando vemos, há um muro
cheio de urtigas e
lodos.
Bem ao conhecimento
geral, estas reflexões
são apenas para mostrar
que todos podem, por um
tempo, perambular por
ondas onde deveriam
surfar elegantes e
competentes. Lá vem,
contudo, o grande dia
das arrumações. É
necessário aprumar o
Espírito para que olhe o
infinito na busca
definitiva de Deus. Era
assim que nos sentíamos
naqueles momentos.
Espíritos calejados da
dor em busca de oásis
para novas
fertilizações. Nosso
oásis seria o plano
físico da Terra, tão
desgastado, mal amado,
desnorteado por
apologias estranhas. Não
nos competia julgar a
história e os homens que
a compuseram. Também
tínhamos nossa
participação no contexto
geral. Não nos cabiam
escolhas pessoais de
nações, continentes,
ares e culturas.
Seríamos conduzidos pela
sabedoria divina onde
fosse mais adequado às
nossas necessidades
atuais. Ali, deixamos de
ser crianças choronas e
frágeis, pedindo colo e
proteção. Ali éramos
fortes, valentes,
empunhando o bastão das
bem-aventuranças que
deveríamos alcançar.
Naquela manhã em
especial, recebemos a
visita de alguém de
extrema importância
dentro do trabalho de
Jesus. Não vinha apenas
das alturas, da esfera
das governanças
planetárias, vinha
também das regiões
umbralinas onde visita
constantemente levando a
luz da sua presença, a
paz da sua palavra.
Espíritos assim não se
isolam em seus casulos
alcandorados de magnas
benesses. Vão até o
sofredor, o perdido, o
andarilho para indicar
caminhos, estimular
corações. Chegamos bem
cedo à instituição que
nos acolhia para os
estudos preparatórios.
Formávamos um grupo de
duzentos pretendentes à
reencarnação. Cem homens
e cem mulheres. Duas
centenas de almas que se
juntaram fazia quinze
anos e que, estimulados
pelas promessas de
Jesus, colocaram-se ao
dispor do trabalho e do
estudo para formar um
contingente efetivo de
soldados do bem.
Adentramos o salão
nobre. Sentamo-nos em
nossas poltronas
previamente marcadas. Os
da frente tinham
compromissos maiores. Os
do meio seriam os
intermediários das ações
e os últimos os
sustentadores das
mesmas. Um exército,
pois. O comandante
renasceria primeiro e
nos aguardaria um a um,
para de novo agruparmos
num futuro
pré-estabelecido. Marina
Sales tocou ao piano
melodias encantadoras.
Nossa irmã renascerá no
final deste século para
as músicas do futuro. De
olhar terno e mãos
delicadas
transportou-nos a
regiões superiores da
consciência através das
notas que harmonizava
ali, perante nós. Era
uma canção jamais
composta. Era para nós,
era para o nosso
visitante. Os sons
evoluíam naquele
ambiente e evoluíamos
com eles. Ah, o poder da
música! Ah, o poder da
música celeste! Bendito
futuro que nos aguarda!
Perdemos a noção do
tempo. Lágrimas com
certeza rolariam em
nossas faces. Sonhos não
faltariam. E todos nos
demos as mãos e cantamos
uma letra que alguém
iniciou e todos deram
continuidade. Era o
entrelaçar de almas que
ao estímulo inicial das
notas tiradas ao piano,
compuseram um poema,
proposta do renascer. As
luzes em formatos
diversos fizeram-se
presentes
envolvendo-nos,
balsamizando-nos. Poucos
conhecem a luz. Difícil
descrevê-la em suas
magnas nuances. Ao
término daquele concerto
de duas centenas de
almas, mais uma,
estávamos em êxtase. Uma
voz suave e terna surgiu
e era do tamanho de todo
aquele esplendor:
– Assim serão as
reuniões das almas no
futuro que virão para o
plano físico da Terra.
Descansamo-nos naquela
suavidade. De olhos
fechados imaginamos o
futuro. Uma relva,
pássaros, árvores bem
vestidas em suas
folhagens, lago doce e
sereno, pessoas
contritas em profundo
recolhimento e a brisa a
perpassar corpos
inundando-os de cálida
paz. Multicores
balouçando quais
dançarinas enérgicas e
plenas no ato de
encantar. E a voz
suprema de Jesus,
confortando e
alinhavando épocas inda
mais felizes. Quem
éramos nós? Quais feitos
nos granjearam aquele
momento? Era a pergunta
geral em face de tantas
dádivas. – Sois daqueles
que deixam para trás as
torturas de um ego
inferior, em desalinho e
corrompido e buscam a
Deus, em regime de
perfeita comunhão.
Lentamente abrimos
nossos olhos.
Entreolhamo-nos e nos
felicitamos. As belezas
ali se confundiam.
Homens e mulheres
desapareceram, surgiram
almas, Espíritos em
busca de si emergindo
das profundezas abismais
que um dia escolhemos
por morada, mas que
agora ficariam para
trás. – Sois partes da
Criação. A ela deveis
vossos concursos
eficazes. Há o tempo
para ser menino e
menina. Há o tempo para
crescer. Eis, agora, a
vossa proposta.
Vimo-nos crianças
correndo em busca de
algo que nunca
encontrávamos. E íamos
de lado a lado, lugar a
lugar e não nos
plenificávamos. Tudo era
pouco, vazio, esparso.
Toda a graça terminava
ao contato das nossas
mãos com o objeto
cobiçado. Objetos
pequenos, efêmeros que
se esvaíam. Ouros que se
tornavam pó, fumaça,
névoa e desapareciam
deixando-nos perplexos,
à deriva, saltando como
se salta na tentativa de
pegar nas mãos as bolas
de sabão que flutuam e
vão e estouram e nos
esvaziam. Depois os
risos desengonçados, o
saltitar de corpos,
muitos seminus, prontos
para as enfermidades. A
troca insalubre das
energias deletérias à
guisa de prazeres
temporários, infiéis,
irresponsáveis. As
mútuas acusações. Os
regimes parcos das
diferenças sociais. A
fome, a miséria, mas o
balançar frenético ao
som de notas desatentas
e de cadências confusas
que em nada enfeitam a
vida para suas
plenitudes. Tudo isto
passou como um bólido em
nossas mentes, ao som
daquele piano e à
melodia daquela voz
amena mesmo que forte e
sincera.
– Aprumai-vos. Novos
corpos os aguardam.
Respeitai-os. São
frágeis e podem fenecer
se não souberem bem
conduzir-vos neles.
A canção acelerou um
pouco, bem como nossos
corações. Vimos-nos
belíssimos; moços e
moças e nos olhamos.
Éramos cheios de graças.
Nunca a beleza foi tão
manifesta aos nossos
sentidos em se tratando
de corpos, templos da
divindade. As moças eram
divinas deusas, os
moços, Apolos da sábia
mitologia. Não nos
desejamos, apenas nos
felicitamos. Qual ali o
mais belo ou bela? Todos
o eram. Não havia
disputas sobre beleza.
Beleza o é, foi e será
em todos os tempos. O
belo é concepção
espiritual de cada alma.
O belo é luz que surge
para endireitar
caminhos, conduzindo
transeuntes. – Não mais
descereis como outrora o
faziam quando das
reencarnações transatas.
A Terra doravante será
para os mansos e
pacíficos. Ela atingiu
novo grau cósmico. Então
subireis aos planos dos
ajustes em estagiando no
corpo físico.
Nossos corações bateram
fortes. Ouvimos seus
ruídos. Uma onda de
harmonia perpassou-nos.
Não era uma harmonia
passiva e sim a harmonia
que acelera ideais.
Sentimos vontade enorme
de renascer e ser entre
os seres os mais ágeis
na arte das
transformações. Erigir
coisas e causas novas.
Plantar novas sementes –
colhê-las depois e
distribuir gratuitamente
seus frutos para todos
em igual proporção. As
etnias desapareceram. As
culturas quase se
fundiram. As latitudes
não separavam povos. Os
continentes eram
uníssonos ao comando
geral de Jesus. Sua
presença era para todos
numa sequência feliz e
agradecida. Novas
academias surgiram.
Respeitavam as academias
do passado, porém tinham
agora como princípio a
absoluta certeza de Deus
e as efusivas
manifestações da vida em
todo o Universo. Pelo
campus transitavam
flores ambulantes em
busca da rega para seus
frutos. E se respeitavam
como tal, alunos entre
si. Mestres entre si,
alunos e mestres numa
sinfonia onde os
pássaros participavam
como tenores,
contraltos, baixos e
sopranos. Também eles
desejavam tempos novos
para si e os teriam pela
afirmação divina que
traziam em seus
gracejos. – Nada temeis.
O comando geral é de
Deus sob a proteção do
Divino Cordeiro, Jesus.
Apascentai vossas
chamas. Conduzi-vos
pelos caminhos do
Evangelho do Senhor.
Sede felizes. Sois
partícipes da nova era.
Como aves soltamo-nos
das nossas poltronas e
nos abraçamos em pleno
ar, quais voos
alcandorados das aves em
festa e nos fizemos
cotovias, cantando em
plena altura. Quem
éramos, que nomes
tínhamos? Nada importava
ali. Éramos filhos de
Deus. Sentimo-nos assim,
responsáveis por nós e
por todos. Ah! se todos
vivessem aquele
instante! Certamente o
mundo veria a magia das
transformações num
piscar de olhos, quais
movimentos que encantam
olhares atentos sem nada
entenderem. E os
mágicos, em seus
volteios rápidos e
coerentes a olhar a
plateia, apresentando-os
à nova Terra! – Ide e
pregai através dos
vossos comportamentos.
Somente eles terão a
força para conduzir
almas.
Fechamos os olhos.
Sentimos nossas
respirações. Acalmamos
nossas volúpias. Nossas
paixões atingiram a
linha do equilíbrio.
Éramos assim um grupo de
almas qual oceano
grandioso num justo
momento das calmarias.
Permitimos que os
navegantes singrassem
nossas águas puras e
salutares. Éramos seus
baluartes. Depois
retornamos à posição de
humanos cheios de
coragem e vigor,
revigorados que fomos
pela certeza de Deus em
nós.
A música cessou. Aquele
momento era findo.
Marina Sales levantou-se
da banqueta. Tomou o
rumo das suas
necessidades. O
visitante teria outras
estâncias a visitar.
Ficamos nós. Duas
centenas de almas
devidamente ungidas para
o renascimento.
Turbinados para as
tarefas, prontos para
espargir em nós e onde
estivermos as glórias de
um tempo após as
tempestades do presente.
Não cansem de trabalhar
e aguardar.
Renasceremos. Depois
retornaremos e
voltaremos a renascer,
nós e todos vocês.
Formemos a corrente do
bem a partir de já. Os
tempos após serão
regidos por almas após
suas tormentas, após
suas fraquezas, após
seus desencantos. Os
tempos atuais não
prevalecerão. Aqueles
que assim pensarem,
haverão de fenecer. E
serão mortos a cuidar de
mortos, nalguma estância
além, até os dias
futuros dos grandes
reencontros. Somos
imortais pela proposta
de Deus, sejamos também
por nossas convicções
próprias. É tempo de
deixar o menino e a
menina. É tempo de
permitir-lhes os justos
repousos, após tantos
séculos a nossos
serviços. É tempo das
metamorfoses, de trocar
as peles, de amadurecer
tendões. É tempo de
florescer onde Deus nos
plantar, como disse o
sábio. É tempo de
rejubilar-se por ser
parte ativa e integrante
da Criação. É tempo de
preparar-se para os
tempos após.