A Morte e os seus
Mistérios
Ernesto
Bozzano
(Parte
10)
Damos sequência nesta edição
ao
estudo do livro A
Morte e os seus
Mistérios,
de Ernesto Bozzano,
conforme
tradução de Francisco
Klörs Werneck.
Questões preliminares
A. De que trata a
segunda monografia que
integra a obra em
estudo?
Com o título “Marcas e
impressões supranormais
de mãos de fogo”,
Bozzano trata nessa
monografia de fatos
surpreendentes em que o
agente do fenômeno,
valendo-se do fogo,
produz sinais e marcas
nos sensitivos e em
objetos diversos.
(A Morte e os seus Mistérios, 2ª Monografia – Marcas e
impressões supranormais
de mãos de fogo.)
B. Que fatos compõem o
primeiro caso relatado
na monografia?
Conforme relato que
devemos ao professor
Charles Richet, no ano
de 1654, um Espírito se
manifestou a uma moça
chamada Regina Fischerin,
residente em Presburg,
na Hungria. Entre os
fatos ocorridos,
registraram-se a
impressão inflamada de
uma mão do Espírito, que
ficou gravada num
tecido, e outras
impressões do mesmo
gênero, em forma de
cruz, traçadas na mão da
vidente. Uma fototipia
dessas impressões foi
reproduzida por Richet.
(Obra citada, 2ª Monografia – Caso I.)
C. Que acontecia com
Regina Fischerin durante
os fenômenos?
Regina ficava sem
conhecimento e como
inanimada, durante duas
horas. Segundo o relato,
manifestamente esgotada
por todos esses fatos,
ela adormecia
profundamente, o que
indica que a vidente era
médium e que caía em
transe no momento em que
se produziam os
fenômenos de efeitos
físicos.
(Obra citada, 2ª
Monografia – Caso I.)
Texto para leitura
137. A 2ª Monografia de
que trata esta obra tem
o título “Marcas e
impressões supranormais
de mãos de fogo”.
138. O professor Charles Richet publicou em 1905, nos Annales
des Sciences Psychiques,
um artigo intitulado
"Fenômenos metapsíquicos
de outrora", no qual
traduziu do latim uma
crônica do ano de 1654,
relativa aos "milagres"
operados por um Espírito
que se manifestou a uma
moça chamada Regina
Fischerin, residente em
Presburg, na Hungria.
Entre os milagres em
referência,
registraram-se a
impressão inflamada de
uma mão do Espírito, que
ficou gravada num
tecido, e outras
impressões do mesmo
gênero, em forma de
cruz, traçadas na mão da
vidente. Uma fototipia
dessas impressões foi
reproduzida no artigo.
139. Em 1908 e 1910, o Sr. Francesco Zingaropoli, advogado em
Nápoles, publicou, por
sua vez, na revista
Luce e Ombra, dois
longos estudos sobre o
mesmo assunto, e, depois
de citar o caso relatado
pelo Sr. Richet,
acrescentou doze outros
casos semelhantes, todos
tirados de crônicas
antigas. Ele tratou
igualmente das
impressões de mãos de
fogo gravadas em roupas
brancas e outras vestes
e nos corpos dos
percipientes, por
fantasmas de defuntos.
Na maior parte dos
casos, essas
manifestações eram
acompanhadas de diálogos
com os Espíritos, assim
como de fenômenos
supranormais diversos,
em grande parte
semelhantes aos que se
produzem em nossos dias.
140. Infelizmente, porém, a insuficiência da documentação dessas
narrações antigas
leva-me a não grupá-las
em uma classificação
científica, ainda que o
Sr. Zingaropoli tenha
razão em notar que as
relações de
circunstâncias
existentes entre essas
diversas manifestações
contribuam, de modo
elevado, em favor de sua
autenticidade. Em uma
classificação
científica, devem-se
eliminar inexoravelmente
elementos que apresentem
lacunas ou defeitos, sem
o que seria inútil
submeter os fatos aos
processos de análise
comparada.
141. De qualquer forma, observarei sempre a respeito dos fatos em
questão que, mesmo que
se quisesse relegar para
as "lendas místicas"
quase todos os casos que
as compõem (o que não
constituiria uma decisão
racional), eles não
deixariam de apresentar
certo interesse
introdutivo. Com efeito,
assim como fez notar o
Prof. Richet "ninguém
teria pensado em imitar
ou inventar
manifestações
supranormais de uma
ordem muitas vezes
estranha e inesperada,
se manifestações
autênticas da mesma
natureza não tivesse
ocorridos antes".
142. Folheando com cuidado minhas classificações, encontrei vários
casos dessa natureza; a
maior parte, porém, é
infelizmente tirada
também de crônicas
antigas,
insuficientemente
documentadas. Achei
alguns, todavia, que se
recomendam pelo nome
autorizado das pessoas
que os recolheram;
observei, além disto,
entre eles, dois
pequenos incidentes que
se renovaram
mediunicamente em nossos
dias, nos quais mãos de
fantasmas provocaram a
queimadura e a
inflamação da parte do
corpo das pessoas em que
tocaram.
143. CASO I - Começo por mencionar os fatos, apresentando antes um
resumo do caso narrado
pelo Prof. Richet, assim
como dois outros bem
documentados, citados
pelo Dr. Zingaropoli.
144. A crônica latina
traduzida pelo Prof.
Richet foi pela primeira
vez publicada em 1654,
por ordem de Monsenhor
Jorge Lippai, Arcebispo
de Sttigont. Ela está
guardada no "Venerável
Capítulo" de Pest. A
narrativa diz que vivia
em Presburg um alemão
chamado João Klemens,
que se convertera à
religião luterana, mas
que, mais tarde, quando
já velho, voltara ao
catolicismo, tendo
falecido aos 60 anos.
Vivera ele de modo pouco
louvável e, depois de
morto, aparecera a
várias pessoas, mas a
crônica em referência se
ocupa mais especialmente
de suas manifestações a
uma moça de Hallstad,
Áustria, chamada Regina
Fischerin, de 19 anos,
católica fervorosa e de
costumes
irrepreensíveis.
145. Passo por cima das manifestações que nada têm com o assunto de
que nos ocupamos aqui:
fenômenos luminosos,
transportes e
deslocamentos de
objetos, "voz direta"
que conversou com os
padres teólogos que
acorreram ao local e que
reconheceram, como
verdadeira, a voz do
defunto.
146. É de notar, também, que numa circunstância em que se produziam
os mais interessantes
fenômenos de transporte
de objetos sem contato,
sob uma direção
evidentemente
inteligente, "Regina
ficava sem conhecimento
e como inanimada,
durante duas horas", ao
passo que noutro trecho
diz que "Regina,
manifestamente esgotada
por todas essas provas,
adormecia
profundamente".
147. Estas duas preciosas passagens demonstram que a vidente era
médium e que caía em
transe no momento em que
se produziam os
fenômenos físicos, o que
serve para demonstrar a
autenticidade dos fatos
relatados.
148. Passo agora a citar os episódios que nos interessam. Em dado
ponto, o narrador diz
que o Espírito se
mostrava irritado e
violento, batia portas e
arrastava cadeiras ao
tempo em que Regina
perdia o uso da fala e
ficava desmaiada por
algum tempo. O pai
aconselhou a filha a
procurar agarrar o
Espírito para
imobilizá-lo. A filha
obedecia, mas nada
retinha em seus braços:
foi assim que ela se
apercebeu de que se
tratava de uma sombra
vã.
149. A crônica continua
assim: "Temendo, então,
ser vítima de uma
ilusão, ela disse ao
Espírito que, se ele
fosse um Espírito bom, a
tocasse com o dedo. Ele
a tocou no braço
direito, o que sentiu
com fogo. Subitamente,
apareceu no lugar tocado
uma bolha com a dor que
produz uma queimadura e
os criados a viram.
Depois, a fim de
verificar se não se
tratava da obra de um
Espírito mau, Regina
pediu-lhe, como prova de
que era um Espírito bom,
que fizesse o sinal da
cruz. ‘Eis, disse ele, o
que me pedes.’ Na mesma
ocasião, sobre a sua
roupa, mostra uma cruz
de chamas e queima,
profundamente, a mão de
Regina, deixando
impressa nela uma cruz
que todos puderam ver. A
moça, porém, desejando
provas mais amplas, pede
ainda outro sinal.
Mostra-lhe cartas que o
Bispo de Smirna
escrevera e assinara, e
nas quais perguntava
diversas coisas que a
moça ignorava. O
Espírito respondeu que
não sabia ler cartas;
iria, entretanto, dar
satisfação; então
segurando as cartas com
seus três primeiros
dedos, sua mão sendo,
sem dúvida, uma mão de
chamas, atravessou-as,
como se fossem postas ao
contato de uma chama.
Recordou, a seguir, com
dor, o crime que
cometera, dizendo que o
dinheiro produzido pelo
crime existia ainda (o
que se verificou, em
seguida, ser verdade),
que uma parte servira
para encargos domésticos
e que a outra devia
servir para outros
fins.”
150. Regina continuou a pedir-lhe outras provas, apesar da cruz na
mão ser já uma prova
muito apreciável. Isto,
todavia, não bastou à
Regina que, para ficar
certa da presença de um
Espírito bom, lhe pediu
que fizesse o mesmo
sinal em uma moeda. O
Espírito obedeceu, tomou
a moeda, jogou-a no chão
e arrancando das mãos da
moça um pano, atirou-o
sobre ela; depois,
segurando-lhe uma das
mãos, com força e,
queimando-a
profundamente, como
dantes, nela imprimiu o
desenho de uma tríplice
cruz. "Eis outro sinal",
disse ele, e isto fez
com tanta força que a
chama atingiu a moça e
foi tocar na parede que
estava defronte. Regina
tombou desmaiada. Sua
irmã viu e ouviu tudo
isto, e mais tarde os
criados puderam ver, com
seus próprios olhos, as
queimaduras produzidas
no pano e na moeda. E
muitas pessoas puderam
ver e tocar as marcas no
pano, o dinheiro, assim
como as cartas
queimadas.
151. O fato é extraordinário. Primeiro porque uma cruz e uma
impressão de mão direita
ficaram marcadas, em
seguida porque a marca
de fogo não ultrapassou
seus traços, embora, no
pano que arde, o fogo
tenha tendência para
estender-se. Finalmente,
a mão direita, que ficou
marcada, representa
exatamente a mão direita
de Klemens, como se
fosse sua mão material.
Com efeito, quando vivo,
uma parte do dedo
indicador fora cortada
por um cirurgião, devido
a uma enfermidade que se
chama "Vermes", o que se
verificou na marca
supranormal produzida.
152. A narração desses
fatos é antes confusa e
em parte insuficiente;
mas não se poderia
pretender de um narrador
de três séculos atrás a
precisão científica nem
a clareza literária que
se exigiria em uma
narração moderna dos
fenômenos metapsíquicos.
Assim, por exemplo, o
fenômeno mais
importante, o da mão em
brasa que ficou gravada
na fazenda, é nela
relatado de modo
imperfeito. Felizmente,
essa impressão de mão
foi conservada até nós e
testemunha a
autenticidade do
fenômeno e da perfeita
conformação da impressão
obtida com a prova de
identificação
constituída pela falta
da falangeta do dedo da
mão direita.
153. O Prof. Charles Richet analisou o caso com uma prudência
extrema, distinguindo os
fenômenos que teriam
sido produzidos pela
intervenção consciente
de Regina daqueles em
que sua intervenção
parecia muito duvidosa
ou inadmissível. Mas
Richet não considerou
que Regina caía em
transe no momento em que
eram produzidos os mais
importantes fenômenos
físicos e também se
esqueceu da "voz direta"
que foi reconhecida por
alguns padres como sendo
a do falecido João
Klemens.
154. A propósito dos
fenômenos que estudamos
aqui, escreveu o Prof.
Richet: "Os fenômenos
relativos à impressão da
mão de fogo no pano e do
estigma em forma de cruz
na mão são de explicação
um pouco delicada.
Certamente que não é
impossível reproduzir-se
marcas de fogo em
cartas, mas numa
fazenda, fazer a
impressão de uma mão
(semelhante ou não à mão
do defunto Klemens) é
coisa um pouco mais
difícil e seria uma
fraude habilíssima, se
tivesse havido fraude;
imprimir num pano de
linho a marca de uma mão
que queima o tecido é
outra coisa. Não se pode
contestar, creio, que a
marca foi feita."
155. Tudo bem considerado, o professor Richet termina dizendo que
os fatos estão provados
e que a narração é
verdadeira. Quanto à
interpretação de alguns
desses fatos, escreveu:
"Há também as bolhas e a
marca de uma cruz na mão
de Regina. Não
acreditamos que se trate
de fenômenos simulados
ou falsificados, porque
sabemos, de fonte limpa,
que os estigmas podem
aparecer nos histéricos,
com formas determinadas,
sob a influência de uma
emoção moral ou de um
delírio religioso. São
fatos cientificamente
estabelecidos, provando
apenas a influência das
emoções cerebrais sobre
a circulação e o
tropismo da pela."
156. Esta interpretação poderia ser admitida para a bolha no braço
e para cruz na mão, mas
como servir ela para o
mesmo fenômeno capital
da mão de fogo que ficou
gravada no pano? Aqui, a
tese dos estigmas por
autossugestão não tem
lugar. E, se assim é, se
esta hipótese não pode
explicar o conjunto dos
fatos, não deverá ser
admitida para a bolha no
braço e a cruz na mão,
tanto mais que, nas
circunstâncias em
apreço, a vidente não
pensava de modo algum na
possibilidade de
produzir esses
fenômenos, e não podia,
pois,
autossugestionar-se
graças a uma "emoção
moral intensa" nesse
sentido.
(Continua na próxima
edição.)