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Crônicas e Artigos

Ano 6 - N° 265 - 17 de Junho de 2012

MARIA ENY ROSSETINI PAIVA
menylins@terra.com.br
Lins, SP (Brasil)
 

O reino de Deus, na visão do filósofo Herculano

A tentativa


No livro O Reino, objeto de nosso estudo, o escritor, filósofo, mestre e jornalista, Herculano Pires, fala-nos do Reino sem Rei, o Reino dos Céus.

O meu Reino ainda não é deste mundo. No meu Reino, os que mandam são os que servem. Os grandes são os que se humilham, pois os que se exaltam são humilhados. Meu Reino é um Reino de Servidores.”

O Exemplo do Reino era tão estranho como um pesadelo. O Mundo o via, mas não entendia. João, o Evangelista, escreveria mais tarde: “A luz resplandeceu nas trevas, mas as trevas não a compreenderam”. Apesar disso, o Exemplo ali estava. Era possível viver no Reino em plena treva do Mundo. Multidões aflitas se aproximavam do Reino...

E os Grandes da Terra, ao ouvirem essas notícias, davam de ombro e riam com desprezo. Mas, quando viam a realidade dos fatos, tremiam de indignação e pavor.  Então era possível que aquele Mestre sonâmbulo roubasse aos homens o gosto do poder, a volúpia do dinheiro, o prazer dos sentidos, esse divino dom que Jeová concedia aos judeus e os Deuses concediam aos goyns? Não! O Exemplo do Reino era um mau exemplo. (Final do Cap. IV de O Reino.)

No capítulo V, Herculano trata da Tentativa dos discípulos de viverem O Reino na comunidade evangélica de Jerusalém, logo depois que a violência dos religiosos e dos romanos submetera Jesus à crucificação, matando-o, pelo suplício reservado aos que atentavam contra o poder de César.

A cruz não era para ladrões e outros delitos. Era o suplício público, para aterrorizar os rebeldes, reservado aos que tentavam revoluções, aos zelotes que faziam terrorismo político. Por isso, a ideia antiga, mas retomada modernamente, de que Barrabás, Dimas e Cleófas não eram ladrões, mas faziam parte da tentativa de expulsão dos romanos por um grupo de galileus.  O Evangelho de Lucas nos fala da invasão do Templo de Jerusalém, reprimida por Pilatos, que ocorreu exatamente quando Jesus veio para Jerusalém. Pelo mesmo motivo, os espíritas adotaram pela revelação de alguns médiuns confiáveis a tese antiga de que Judas não era um traidor, mas fazia parte do movimento de retomada do poder, por Israel, e pretendia que Jesus fosse o Rei desse Reino de Javé restaurado.

A decepção da morte na cruz do Mestre libertara os discípulos da pretensão de que Jesus iria restaurar, de imediato, o poder de Israel e expulsar os goyns, impuros. No entanto, a visão do Senhor, a sua aparição entre eles, em espírito, e o fenômeno do Pentecostes, em que as línguas de fogo os iniciam na divulgação do Reino, restauram-lhes a força e isso os faz retomar a vivência evangélica que haviam experimentado em companhia de Jesus. Mesmo porque Jesus em Espírito ficara com eles 40 dias, segundo o Evangelho, “falando-lhes do Reino”.

O poder judeu e o de Roma lançaram sobre Jesus a ignomínia da cruz, mas o Exemplo do Reino, daquele que o Mestre já vivia com os discípulos, em sua pequena comunidade dos doze, que são chamados apóstolos, e mais os discípulos, incentiva Pedro, e especialmente Tiago, o irmão do Senhor, a fundar a comunidade de Jerusalém. O Evangelho relata que se agregaram aos apóstolos três mil pessoas. Conforme o ensino de Jesus na ceia Pascal, que ao dividir o pão e o vinho lhes pedira: “Fazei isso em memória de mim”, dividiam o pão e oravam em comum. Herculano ensina: “Para esses Filhos do Reino, o pão era um só e todos participavam dele. Ninguém guardava o seu pãozinho particular, para secar e mirrar no embornal escondido. Todos davam o que tinham para poderem receber da abundância geral. E se alguém dava mais, para retirar menos, era com alegria que o fazia, pois, é alegre para os Filhos do Reino poderem dar da sua mesma abundância”.

É bem verdade que, da mesma forma que a comunidade de Jesus formada por ele e pelos apóstolos e discípulos, a pequena comunidade de Jerusalém, onde viviam o ideal de fraternidade, desapareceu. Os primeiros cristãos, nos séculos iniciais, não foram mais viver em comunidade, Muitos séculos ainda deviam passar até que a sociedade buscasse seu aperfeiçoamento, e essa semente do Reino pudesse frutificar começando a produzir amor e justiça para todos.

Essa semente da comunidade apostólica voltou ao seio da Terra e dela só restaram nos tempos futuros as ordens religiosas católicas regulares (leia congregações com regras, irmandades, onde tudo se possui em comum). Mas vieram tisnadas por uma visão orientalista de segregação sexual, celibato obrigatório que pretende a superação total dos instintos, além de regras rígidas e hierarquia dominadora.

Até mesmo a ideia do dízimo, que era obrigatório aos cristãos no início do Cristianismo, visando socorrer os irmãos em dificuldades e amparar órfãos e viúvas, foi adulterada e serve ainda hoje para enriquecer Igrejas e dar-lhes o poder do dinheiro.

Infelizmente as Igrejas perdidas em seus dogmas e rituais relegaram a ideia da vivência do Reino ao esquecimento. Claro que as estruturas sociais não tinham, como não têm, nenhum interesse em que essa experiência fosse divulgada. Crianças são evangelizadas sem saber dessa tentativa. Gerações, inclusive de espíritas, vivem e morrem, sem nem suspeitar que a implantação de um Reino de Amor e Justiça foi retomada claramente pelos Espíritos Superiores que nos trouxeram O Livro dos Espíritos. Os Espíritos consoladores estabelecem que O Reino, nascendo em nós, deve ser implantado aqui na Terra, pela nossa ação, na luta pela Justiça e Amor.

As sementes do Reino ficaram durante milênios enterradas. Através dos séculos, elas tentaram germinar, entre os homens que se diziam espiritualizados. Mas cresceram essas poucas sementes desenterradas, portando genes estranhos, implantados nelas pelos poderosos, especialmente a partir de Constantino. Cresceram como sementes transgênicas, carregando um sentido espiritual que é a morte do ser humano para a vida natural. A vida natural compreende a utilização equilibrada dos instintos que Deus nos permitiu adquirir em séculos de evolução, como facilitadores de nosso aperfeiçoamento. Adulterados os genes do espiritual, estabeleceu-se o cilício, o jejum, a castidade, se possível a virgindade, a obediência, a pobreza, como o ideal dos representantes da espiritualidade superior. O horror aos instintos, à ideia de culpa e pecado, à obrigação de superar o instinto, ao invés de utilizá-lo como ensina a questão n° 75 de O Livro dos Espíritos. O medo dos castigos terríveis que aguardam o “pecador” toma conta da literatura religiosa, inclusive atualmente da espírita, para manter o homem escravizado aos poderes da religião, de seus representantes, seus santos, médiuns ou “homens de Deus”.

As instituições religiosas, baseadas na culpa e no medo e não na Justiça e no Amor, enriquecem e fazem conúbios imorais com o poder constituído que lhes enche os cofres, para que divulguem a mentira e o que lhes convém. Fariseus modernos, a ressumar hipocrisia!



 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita