ALTAMIRANDO
CARNEIRO
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São Paulo, SP
(Brasil)
Auto-de-fé de Barcelona:
das cinzas nasceu a luz
Na segunda parte do
livro Obras
Póstumas, o
qual reúne os
derradeiros escritos e
as anotações íntimas de
Allan Kardec, destinadas
a servir mais tarde para
a História do
Espiritismo que ele não
pôde realizar, há uma
informação do
Codificador a respeito
do auto-de-fé de
Barcelona, ocorrido no
dia 9 de outubro de
1861, às dez e meia,
sobre a colina da cidade
de Barcelona, no local
onde eram executados os
condenados à pena última
e por ordem do bispo de
Barcelona, Don Antônio
Palau Y Termens,
desencarnado em 8 de
julho de 1862.
A pedido do livreiro
Maurice Lachatre, Allan
Kardec remeteu-lhe
grande número de
exemplares de O
Livro dos Espíritos, O
Livro dos Médiuns, coleções
da
Revista Espírita e
diversas obras e
brochuras espíritas, num
total de aproximadamente
300 volumes. “A
expedição foi feita
regularmente pelo seu
correspondente em Paris,
em uma caixa, que
continha outras
mercadorias e sem a
menor infração dos
regulamentos.”
Quando as obras
chegaram, foram cobrados
do destinatário os
direitos de importação,
mas, antes de lhe
entregarem as obras,
tiveram de obter o
despacho do bispo,
autoridade eclesiástica
que, na Espanha, tinha a
fiscalização dos livros.
Ele achava-se em Madri,
mas na sua volta, em
vista do catálogo,
ordenou que as obras
fossem apreendidas e
queimadas em praça
pública.
“Se tivesse havido
tentativa de passar
aquelas obras por
contrabando, a
autoridade espanhola
estava no direito de
dispor delas, como lhe
parecesse; desde porém
que não houve fraude,
nem ardil, tendo-se pago
os respectivos direitos,
era de rigorosa justiça
que se ordenasse a
reexportação se não lhe
convinha admiti-las no
país. As reclamações
feitas ao cônsul francês
em Barcelona de nada
valeram.”
Kardec informa que
Lachatre perguntou-lhe
se queria recorrer à
autoridade superior, mas
ele achou por bem
consultar o seu guia
espiritual. A decisão
foi muito diferente
daquela que qualquer um
de nós tomaria. Disse o
Espírito consultado:
“Tens o direito de
reclamar a devolução das
obras e certamente a
terás de volta desde que
faças a reclamação por
intermédio do Ministério
das Relações Exteriores
da França; a
minha opinião, porém, é
que maior bem resultará
do auto-de-fé que da
leitura de alguns
volumes. A perda
material será
grandemente compensada
pela repercussão que
terá o auto da queima
dos livros – o que
concorrerá para a
propaganda da doutrina.
Compreendes quanto uma
perseguição tão ridícula
e retrógrada pode fazer
progredir o Espiritismo
na Espanha? As ideias
espalhar-se-ão com tanto
mais rapidez, as obras
serão procuradas com
tanto maior avidez,
quanto maior for o
escândalo da
condenação.”
Allan Kardec perguntou
se convinha fazer um
artigo no próximo número
da Revista
Espírita, e
recebeu a resposta:
“Aguarda o auto-de-fé.”
O processo provocou
várias comunicações dos
Espíritos, entre as
quais, uma que
destacamos o trecho:
“Era preciso que alguma
coisa abalasse
violentamente certos
Espíritos encarnados
para que se decidissem a
ocupar desta grande
doutrina que há de
regenerar o mundo”.
Kardec informa que
foi-lhe enviado, de
Barcelona, um desenho de
aquarela, feito por um
grande artista,
representando a cena do
auto-de-fé. “Mandei
tirar, em ponto menor,
uma cópia fotográfica.
Possuo também cinzas
colhidas no lugar da
fogueira, no meio das
quais encontram-se
fragmentos, ainda
legíveis, das folhas
queimadas. Guardo-os em
urna de cristal.”