MILTON SIMON
PIRES
cardiopires@gmail.com
Porto Alegre, RS
(Brasil)
Karma versus
livre-arbítrio
– O
Espiritismo e o
Efeito Borboleta
Edward Norton
Lorenz
(1917-2008) foi
um matemático e
meteorologista
norte-americano.
Preocupado com
as constantes
mudanças do
tempo e com a
dificuldade de
previsão exata
dos fenômenos,
por vezes
catastróficos,
Lorenz
trabalhava
frequentemente
com um problema
que ele definia
como
“dependência
sensitiva das
condições
iniciais”. Sem
querer entrar
aqui em detalhes
técnicos a
respeito, basta
dizer que ele
achava possível,
do ponto de
vista
matemático, que
o bater das asas
de uma borboleta
em uma parte do
planeta pudesse
provocar um
furacão em
outra.
O presente
artigo é uma
tentativa de
definir os
conceitos de
karma e
livre-arbítrio
conforme a
Doutrina
Espírita e
abordar o
suposto paradoxo
existente entre
os dois quando a
questão é
abordada do
ponto de vista
lógico.
Logo no início
de sua obra,
Kardec deixou
claro que toda
fé que não
contempla a
razão está
fadada a
desaparecer.
Herdeiro de
tradições como a
de Santo
Agostinho e
Tomás de Aquino,
o codificador
mais de uma vez
insistiu em
reconciliar
estas duas
formas de saber
e o fez, a nosso
ver, de forma
brilhante.
A palavra Karma
tem sua origem
no sânscrito.
Define-se
originalmente no
hinduísmo como o
conjunto de
ações executadas
pelos homens e
as consequências
que delas
decorrem.
Observe-se aqui
que difere
totalmente da
ideia de um
destino
pré-traçado do
qual ninguém
pode escapar,
uma vez que
contempla a ação
humana como
causadora de um
resultado.
Livre-arbítrio,
por sua vez, é
basicamente a
expressão usada
para significar
a vontade livre
de escolha, as
decisões livres.
A polêmica
existente entre
a ideia de karma
ou
livre-arbítrio
deriva,
portanto,
diretamente do
nosso problema
em definir o que
é a liberdade
humana. Sem
saber o que é
ser livre não é
possível sequer
afirmar que
existe
contradição
entre as duas
ideias.
Do ponto de
vista
filosófico,
parece-nos claro
que a única
liberdade, da
qual homem algum
pode ser privado
ou mesmo
abdicar, é a
liberdade de
escolha. A
partir daí
faz-se
necessária uma
distinção
fundamental
entre os dois
conceitos acima,
e ela precisa
ser feita,
necessariamente,
do ponto de
vista
ontológico.
Karma e
livre-arbítrio
não existem de
forma separada,
mas simultânea.
Cada escolha que
fazemos constrói
um modelo, uma
espécie de mapa
de
possibilidades
semelhantes aos
mapas
meteorológicos
de Lorenz e que
resulta num
universo moral
específico.
Nesse sentido, a
livre escolha
vem sempre antes
do “destino”,
mas há que se
salientar que
este não é único
e cada opção que
fizermos define
não uma única,
mas sim um leque
de alternativas
que, com a
passagem do
tempo, vão se
reduzindo.
Em excelente
artigo
disponível na
internet e
intitulado
“Carma, Destino
e Livre-arbítrio”,
Victor Sérgio de
Paula, em suas
conclusões e de
forma magistral,
demonstra o
perigo de se
confundir karma
com destino.
Mais do que
isso, ele deixa
muito claro que
o simples
conceito de
“destino” só
pode existir em
religiões que
não contemplam a
possibilidade da
reencarnação,
conceito que,
como mostramos
em artigo
recente,
revolucionou a
própria noção de
“tempo”.
Em vista do que
escrevemos
acima, e como
conclusão,
parece-nos
importante dizer
que nós,
espíritas,
devemos entender
como única e
verdadeira
contradição os
conceitos de
“destino” e de
reencarnação. A
cada
reencarnação
Deus nos dá a
chance de mudar
nosso “destino”
através das
provas e
resgates que
tanto
conhecemos,
tornando assim a
Doutrina
Espírita um
caminho para
liberdade e para
responsabilidade.
Parece-nos,
portanto, que a
borboleta de
Lorenz, mesmo
capaz de
provocar um
furacão, é muito
pequena perante
a ação de homens
de boa vontade e
que, se o clima
dependesse
sempre deles,
poderíamos viver
num mundo sem
tempestades.
O autor é
médico em Porto
Alegre, RS.