MARCELO BORELA DE
OLIVEIRA
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Londrina, Paraná
(Brasil) |
|
Sexo e Destino
André Luiz
(Parte
7)
Damos continuidade ao
estudo da obra
Sexo e Destino,
de André Luiz,
psicografada pelos médiuns
Waldo Vieira e
Francisco Cândido Xavier
e
publicada em 1963 pela
Federação Espírita
Brasileira.
Questões preliminares
A. Alguma coisa
conseguia atenuar o
suplício moral que
Marita passou a
experimentar aos onze
anos de idade?
Sim. Seu sofrimento era
atenuado pela dedicação
incessante do pai
adotivo, que se lhe
confirmava mais terno à
medida que D. Márcia,
sua mãe adotiva, e
Marina se lhe afastavam
da comunhão espiritual.
As duas juntas, à frente
dela, significavam
provação inqualificável
que lhe competia
aguentar em silêncio.
(Sexo e Destino,
capítulo VII, pp. 68 e
69.)
B. O trabalho fora de
casa ajudou-a a minorar
a provação que o destino
lhe reservara?
Sim. Ela contava 17 anos
quando começou a
trabalhar em uma loja.
De começo, tudo fora
hesitação e novidade.
Depois, as coisas se
modificaram. Aliciara
relações confortadoras,
expandiram-se-lhe os
interesses, permutava
confidências,
conquistava simpatias.
E a imaginação agora se
lhe excitava em
descontrole,
sugerindo-lhe
adornar-se com esmero,
de modo a se destacar
diante do jovem que lhe
viria, decerto, governar
o império emotivo,
oferecendo-lhe um lar.
(Obra citada, capítulo
VII, pp. 70 e 71)
C. Nas recordações de
Marita surgiu uma
revelação surpreendente.
Que é que André Luiz
descobriu?
André Luiz descobriu que
Marita amava Gilberto, o
mesmo rapaz que estava
envolvido afetivamente
com Marina. Marita
conhecera Gilberto seis
meses antes, no gabinete
do chefe. Ela prestava
informações de serviço,
ele representava o pai
em negócios alusivos à
venda de imóveis. Ao se
conhecerem, elos de
intensa afinidade
passaram, desde então,
a jungi-los um ao outro,
sem que lhe fosse
possível justificar a
sede crescente de
comunhão que a dominava.
Até que, no dia anterior
a essas reflexões, ela
surpreendera a irmã e
Gilberto num colóquio
que não lhe deixara
dúvidas. O grande amor
de sua vida, ela o
perdera, e justamente
para a irmã.
(Obra citada, capítulo
VII, pp. 75 a 77.)
Texto para leitura
31. Viver ali era
uma provação
inqualificável -
O suplício moral que
Marita adquirira aos
onze anos de idade
atenuava-se tão-somente
pela dedicação
incessante do pai
adotivo que se lhe
confirmava mais terno, à
medida que D. Márcia e
Marina se lhe afastavam
da comunhão espiritual.
A jovem era sozinha em
assuntos de sexo. Mãe e
filha empenhavam-se,
deliberadamente, na
abstenção de qualquer
parecer, quando se
tratasse das incertezas
dela na escolha de
figurinos. Vez por
outra, D. Márcia a
escutava com ternura
maternal, mas via-se que
a esposa de Cláudio
possuía vasto patrimônio
de compreensão e
carinho, abafado, porém,
sob o peso de
conveniências e
convenções, semelhando
tesouro enterrado nas
raízes de sólido
espinheiro. Nessas horas
de efusão, a jovem
exibia-lhe todas as
dúvidas e perplexidades
que possuía, e D.
Márcia respondia-lhe
entre beijos,
demonstrando vivamente
que o lume da dedicação
e da confiança de outros
tempos não se lhe
arrefecera no coração.
Mas esses momentos de
felicidade escoavam-se
rapidamente, logo que
Marina chegava, pois o
ambiente se turvava e D.
Márcia se transformava
de súbito. Ocultava-se
então a mãezinha
espiritual, afável e
acolhedora, e aparecia
D. Márcia, avalentoada e
cortês, na atmosfera
psíquica. Unidas, ela e
Marina completavam-se em
pequeninas torpezas
para deprimi-la,
humilhá-la.
Concediam-lhe,
raramente, a honra da
companhia para compras
no centro, mas, se as
lojas não dispunham de
meios para a entrega das
encomendas, não se
pejavam de carregá-la
com pacotes diversos,
exercitando crueldade
risonha nos pejorativos
com que lhe agravavam o
constrangimento e a
subalternidade. D.
Márcia e Marina, juntas,
à frente dela,
significavam provação
inqualificável que lhe
competia aguentar em
silêncio. Bem cedo
percebeu que a irmã,
filha única, não abriria
mão de ínfima parcela
dos mimos caseiros de
que se supunha senhora
e, dominado o segredo de
sua origem, modificara
completamente a conduta
para com ela e não
deixava passar as
oportunidades para
biografá-la, junto às
amigas. (Cap. VII, pp.
68 e 69)
32. Marita começa
a trabalhar fora
- Sentindo a solidão no
próprio lar, Marita
buscou manter contatos
com os familiares de
Aracélia, mas suas
mensagens nunca
mereceram resposta.
Notícias procedentes da
remota cidade em que a
mãe nascera davam conta
de que todos eles
haviam demandado outras
regiões do país,
procurando melhor sorte.
A jovem estava realmente
só... Adveio-lhe, então,
a ideia de buscar na
recreação fora do lar o
alívio para os empeços
do caminho. Relacionou,
assim, os primeiros dias
de atividade na
profissão de comerciária
a que se afizera. Surgiu
na memória o movimentado
estabelecimento
comercial em que
Cláudio lhe obtivera a
função de balconista.
Era um pequeno mundo da
preferência feminina.
Bijuterias, perfumes,
tecidos leves, roupas
feitas... No dia
imediato àquele em que o
pai adotivo lhe trouxera
da rua um bolo enfeitado
com dezessete rosas
pequenas, para
comemorar-lhe o
aniversário, ela entrara
em serviço. De começo,
tudo hesitação e
novidade. Vira-se,
depois, atirada aos
embates do sentimento,
ligações novas, ideias
renovadas. Aliciara
relações confortadoras,
expandiram-se-lhe os
interesses, permutava
confidências,
conquistava simpatias.
A imaginação agora se
lhe excitava em
descontrole,
sugerindo-lhe
adornar-se com esmero,
de modo a se destacar
diante do jovem que lhe
viria, decerto, governar
o império emotivo,
oferecendo-lhe um lar...
Ingênua, entendia que os
fatos do amor se
limitavam aos romances
em que cinderelas
anônimas acabavam nos
braços de príncipes...
Entusiasmava-se com
novelas e filmes que
terminassem pelo
altruísmo coroado ou
pelas supremas
aspirações humanas,
convenientemente
atendidas. O destino,
no entanto, escarnecera
de sua inocência. (Cap.
VII, pp. 70 e 71)
33. A
primeira desilusão fora
de casa
- A princípio, a
desilusão lhe veio
através de um colega que
a obsequiava,
repetidamente, com
entradas de cinema.
Conhecia-lhe a noiva,
professora jovem e
distinta que se lhe
afeiçoara ao convívio.
Que mal em se verem
juntos para uma fita, de
vez em vez? Iniciaram-se
momentos de encontro
fraterno. Um cafezinho
de bar, nas horas de
vento frio, um sorvete
na praia, quando o calor
vinha forte. Mera
camaradagem. Amiguinho,
fazendo o papel do irmão
que não tivera. Chegou,
porém, a noite em que
ele se apresentou,
transtornado. A noiva
fora a Petrópolis, um
fato natural, embora
raro. Nada prenunciava
sucessos desagradáveis,
nenhum motivo de
inquietação. Conversaram
pacificamente nas areias
do Leme. O trabalho na
loja fora banho de suor
copioso, no dia cálido,
e a Lua nascera plena,
inspirando-lhes
pensamentos mansos e
alegres, ante o sopro
refrigerante do mar.
Falavam acerca de
freguesas apressadas,
mencionando clientes
ásperos. Riam-se,
despreocupados, como
colegiais, no intervalo
das lições. De repente,
tomando-lhe as mãos, o
rapaz puxou-a, num gesto
brusco, de encontro ao
peito, gaguejando
declarações. Marita,
impetuosamente
submetida aos lábios do
colega, que se colavam
aos seus, desfaleceu
por segundos. O hálito
sedutor do primeiro
homem que a retinha,
submissa, destilava o
magnetismo da serpente,
quando hipnotiza o
pássaro confiante, mas o
desmaio durou um
instante só. A profunda
e invencível reação da
feminilidade unida à
consciência foi rápida.
A noção de
responsabilidade
relampagueou-lhe no
raciocínio e bastou isso
para o impulso sexual
esmorecer, neutralizado.
Marita ideou a imagem da
amiga ausente,
compreendeu todo o
perigo e, tocada de
súbita resistência,
arrojou longe o
perseguidor que lhe
pressionava o busto
tremente. Desembaraçada,
o pranto explodiu-lhe
quente e doloroso, e
inúmeras interpelações
da alma sincera,
relativamente à conduta
do colega, estouraram,
contundentes e francas.
Onde os compromissos do
noivado? que fazia da
jovem correta que lhe
empenhara o destino?
trazia, assim, o coração
rolando tão baixo? (Cap.
VII, pp. 72 e 73)
34. O amor oculto
da jovem Marita
- Lívido e atarantado, o
colega escusou-se,
asseverando que não a
supunha meninota
antiquada. Estava
comprometido, noivo, há
meses, mas, a seu modo
de ver, era natural que
ele e ela, Marita, ainda
jovens, desfrutassem o
tempo, acrescentando,
ainda, em sua filosofia
desabusada, que todo
viajante consciente,
embora conheça o
caminho certo, é livre
para saborear os frutos
que pendam de plantas
erguidas à margem. Dito
isso, retirou-se
gargalhando, sarcástico,
para depois hostilizá-la
em serviço. Ocorreram
depois outros
impedimentos e
tentações. O sobrinho do
chefe, rapagão
recém-casado,
insinuara-se, começando
por um presente de
aniversário e
terminando por
solicitar-lhe
colaboração no
escritório, onde
pretendeu arrancar-lhe
atitudes inconfessáveis.
Era novo inimigo que lhe
surgia. Enquanto isso,
em casa, Marita observou
que Marina se alterara,
sensivelmente. Tendo
alcançado o diploma de
contadora, situara-se
com manifestas
vantagens e, certamente
por ganhar expressivas
somas na profissão,
sustinha,
desajuizadamente,
prodigalidades e
excessos. Roupas caras,
penteados extravagantes,
bebedeiras e tafulices...
Nesse ponto das
confidências mudas, que
André ia registrando,
raiou o vulto de um
jovem, nítido. Ao
estampá-lo na paisagem
de seus pensamentos,
transfigurou-se a
castigada criança.
Desanuviou-se-lhe o
firmamento íntimo e sua
aura clareou-se...
Marita amava o escolhido
com a firmeza da árvore
que se levanta sobre a
raiz principal de apoio,
com a abnegação das mães
que preferem morrer,
felizes no sacrifício
extremo, se for essa a
condição para que os
filhos queridos logrem
viver. André lembrou-se
de ter visto aquele
vulto de homem... Era o
mesmo rapaz cujo
semblante repontava dos
pensamentos de Marina,
disputando-lhe o
coração com Nemésio. As
jovens jaziam
espiritualmente imanadas
a ele por laços
idênticos.
Cruzavam-se-lhes as
preferências, sócias de
análogo destino. André
olhou para Neves e
viu-lhe a face transida
de mágoa. Neves
aproximou-se então e
disse, transtornado:
"Ainda não nos
entendemos devidamente.
Sabe você quem é este? É
meu neto, Gilberto,
filho de Beatriz..."
(Cap. VII, pp. 74 e 75)
35. Nova decepção
na vida de Marita
- André Luiz sopitou, a
custo, o espanto que tal
revelação lhe causara e
não sabia de que modo o
pesar lhe doía mais, se
ao refletir em Marina, a
dividir-se entre pai (Nemésio)
e filho (Gilberto), ou
se ao concentrar a
atenção naquela moça
triste, profundamente
lesada nos tesouros do
sentimento. Estancando
no íntimo tais
impressões, André
continuou a pesquisa. A
muda confissão de Marita
avançou em
reminiscências vivas e
francas. Conhecera
Gilberto seis meses
antes, no gabinete do
chefe. Ela prestava
informações de serviço,
ele representava o pai
em negócios alusivos à
venda de imóveis. Com
que deslumbramento lhe
recebera os primeiros
olhares afetuosos e
indagadores! Elos de
intensa afinidade
passaram, desde então,
a jungi-los um ao outro,
sem que lhe fosse
possível justificar a
sede crescente de
comunhão que a dominava.
Para surpresa maior, no
primeiro encontro que
lhes precedera a série
de passeios e
entretenimentos felizes,
ficara sabendo,
satisfeita, que Marina
se fizera contadora da
firma em que o pai dele
era a figura mais
importante. Riram-se da
coincidência com a
ingenuidade de duas
crianças. Marita
confiara-se a ele,
integralmente. Amava-o,
sentia-se amada, e desde
então mais vastos
horizontes se lhe
descerraram à alma.
Tolerava as alfinetadas
do cotidiano. A Natureza
lhe desvendava encantos
novos. Admitia que outra
luz se lhe acendera nos
olhos, permitindo-lhe
descobrir a beleza do
mar. Desligara-se do
calvário doméstico; o
tempo voava, doce, ao
coração. O amor
correspondido
anestesiara-lhe a
sensibilidade. Marita
dera-se a Gilberto,
copiando a passividade
da planta que se rende
ao cultivador, da fonte
que se entrega ao
sedento. O filho de
Nemésio Torres
prometera-lhe casamento.
Falava do futuro
risonho, suscitava-lhe
sonhos de maternidade e
ventura e, para fazê-la
integralmente feliz,
aguardava apenas a
melhoria econômica, que
adivinhava perto.
Apesar de tudo, Marita
apresentava agora o
coração abatido,
farpeado. Convencia-se
de que Gilberto se
enfastiara e que ambos,
precipitados à fome de
prazer, haviam colhido,
antes do tempo, a flor
da felicidade. Marina
adiantara-se, sempre
Marina... Na véspera,
surpreendera a irmã e
Gilberto num colóquio
que não deixava dúvidas.
Ouvira-lhes a
conversação impregnada
de ternura ardente, sem
ser pressentida. E
nesse ponto das
lembranças amargas,
estirou o corpo
desgovernado,
abandonando-se a
lágrimas convulsas.
(Cap. VII, pp. 75 e 77)
(Continua no próximo
número.)