ANGÉLICA
REIS
a_reis_imortal@yahoo.com.br
Londrina, Paraná
(Brasil) |
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A
Personalidade Humana
Fredrich
Myers
(Parte 28)
Damos
sequência ao estudo
metódico e sequencial do
livro A Personalidade
Humana, de Fredrich
W. H. Myers, cujo título
no original inglês é Human
Personality and
Its Survival of Bodily
Death.
Questões preliminares
A. Que significa
percepção refratada?
|
O exemplo que Fredrich
Myers menciona diz
melhor sobre o assunto
do que qualquer
definição. No caso da
senhora Clerke (Phantasms
of the Living, II, 61),
seu irmão moribundo (ou
morto) não conseguiu
atrair a atenção dela,
mas foi percebido por
uma enfermeira que não o
conhecia nem nunca o
vira. Parece que a
enfermeira foi
simplesmente uma
assistente dotada de
sensibilidade especial,
que deu mostras de ser
mais eficaz do que o
parentesco de sua ama.
(A Personalidade Humana.
Capítulo VI –
Automatismo sensorial.)
B. Existe uma certa
transição entre
hiperestesia e
telestesia? |
A título de suposição,
sim. Se isso for
verdade, é provável que,
quando a sensação
periférica não seja
possível, a percepção
central consiga agir
através de obstáculos de
outro modo invencíveis.
Assim sendo, pode ser
que a percepção central
se adapte às formas de
percepção a que estão
acostumadas as
trajetórias centrais do
cérebro, e que o
conhecimento superior, o
conhecimento telestésico,
de alguma forma
adquirido, se apresente
antes de tudo, quer como
clarividência, quer como
clariaudiência, como
certa forma da vista e
do ouvido.
(Obra citada. Capítulo
VI – Automatismo
sensorial.)
C. A solidez da matéria,
qual a conhecemos, é
real para os Espíritos
superiores a nós?
Não parece. A matéria
sensível, que vemos e
tocamos, possui uma
realidade “sólida” para
os Espíritos
constituídos de forma
que tenham a sensação
subjetiva de sua
solidez. Mas para os
outros Espíritos,
dotados de outra forma
de sensibilidade, para
os Espíritos talvez
superiores aos nossos,
essa matéria sólida pode
parecer discutível e
irreal, enquanto o
pensamento e a emoção,
percebidos por vias
desconhecidas para nós,
representam para eles a
única realidade.
(Obra citada. Capítulo
VI – Automatismo
sensorial.)
Texto
para leitura
666. Citarei, como
exemplo de percepção
refratada, o caso da
senhora Clerke (Phantasms
of the Living, II, 61),
cujo irmão moribundo (ou
morto) não conseguiu
atrair sua atenção e só
foi percebido por uma
enfermeira que não o
conhecia nem o havia
visto nunca em carne e
osso. Parece-me que a
enfermeira foi
simplesmente uma
assistente dotada de
sensibilidade especial,
que deu mostras de ser
mais eficaz do que o
parentesco de sua ama.
667. Abordarei agora um
novo grupo de casos, os
de telestesia, onde o
agente e o sujeito
invadido estão reunidos
na mesma pessoa, que faz
uma incursão
clarividente (de caráter
mais sério do que as
meras psicorragias
descritas até aqui) e
supõe uma certa
recordação da cena vista
psiquicamente. Essa
lembrança pode não
existir ou então a
pessoa interessada não
quer dar ciência dela.
Nos casos desse gênero,
como nos de telepatia de
que já falei, acontece
que o fantasma incursivo
foi observado por um
assistente e isso em
circunstâncias que
excluem qualquer ideia
de uma alucinação
subjetiva deste último.
668. A Sra. Mc Alpine
estava sentada, num belo
dia de verão, às margens
de um lago nos arredores
de Castleblaney,
aguardando sua irmã que
devia chegar por trem,
quando, de repente,
sentiu um calafrio e uma
rigidez nas pernas até o
ponto de não poder
levantar-se do lugar
onde se encontrava e
sentiu o olhar fixo,
como através de uma
força externa, na
superfície do lago. A
seguir, apareceu uma
nuvem negra, no centro
da qual encontrava-se um
homem de enorme
envergadura que caiu no
lago e desapareceu.
669. Dias depois
inteirou-se de que um
certo Espy, homem muito
alto e que, de acordo
com a descrição,
vestia-se da mesma forma
que o viu a Sra. Alpine,
afogara-se naquele lago,
e isso vários dias após
a visão de seu suicídio,
tida pela referida
senhora. Ao que parece,
Espy concebera de há
muito a ideia de
suicidar-se, afogando-se
no lago de Castleblaney
(informação da Comissão
de Alucinações, em
Proceedings of the S. P.
R., X, pág. 332. O
relato do suicídio
apareceu no Northern
Standard, de 6 de julho
de 1889).
670. É possível explicar
essa aparição como um
simples pressentimento,
como uma imagem do
futuro que se
apresentara, de uma
forma desconhecida,
diante da visão interna
do sujeito. Logo,
encontramo-nos na
presença de casos que
parecem justificar essa
hipótese extrema. Mas
aqui parece mais simples
supor que o infeliz
premeditara o
afogamento, no instante
em que a senhora Alpine
encontrava-se sentada na
margem do lago, e sua
ideia foi autoprojetada,
consciente ou não, de
uma parte do seu eu.
671. As reflexões desse
gênero se referem a um
suicídio projetado e
proporcionam, talvez, o
exemplo mais notável da
preocupação mental,
relacionada com um
determinado lugar. Mas
tendo em vista nossa
ignorância da verdadeira
qualidade do pensamento
e da emoção necessária
para auxiliar uma
incursão psíquica, não é
de surpreender que em
certos casos essa
incursão nos pareça
idêntica à que se
observa nos chamados
casos de aproximação,
como o do coronel Bigge,
anteriormente citado. O
que tornou notável esse
caso foi a roupa
incomum, na qual estava
metido o colega do
coronel, enquanto que a
chegada deste último ao
lugar onde aparecera era
um fato totalmente
provável e possível.
672. Citarei agora os
casos em que a chegada
de um homem é
inesperada, de forma que
o fato de seu fantasma
ser visto num lugar para
o qual se dirige, antes
que chegue realmente,
constitui uma verdadeira
coincidência. O senhor
Carroll (Phantasms of
the Living, II, pág. 96)
viu, certa noite, em seu
quarto, quando ainda não
pensava em deitar-se, a
imagem de seu irmão que
vivia em Londres,
enquanto ele vivia em
Sholebrook Lodge,
Towcester,
Northamptonshire.
Assustou-se um pouco com
a aparição e, antes que
tivesse tempo de se
recobrar da emoção,
ouviu que o chamavam,
através da janela do
quarto: era seu irmão,
desta vez em carne e
osso, que viera
expressamente de Londres
para vê-lo, sem
anunciar-lhe previamente
sua visita. Temos de
acrescentar que o irmão
de Carroll desconhecia o
local onde habitava este
último e, como ele mesmo
disse, encontrou a casa
e chamou à janela, certo
de encontrar o irmão
naquela casa e atrás
daquela janela.
673. Eis agora um caso
de pressentimento
auditivo de uma chegada
(Phantasms of the
Living, II, pág. 100). O
senhor Stevenson estava
em sua casa, sentado
junto à sua esposa. Eram
19 horas. O quarto
encontrava-se em
silêncio, quando
distinguiu claramente
estas palavras: “David
chega”. Pensando que sua
mulher as pronunciara,
interrogou-a; mas ela
assegurou-lhe que não
dissera uma só palavra.
David era o irmão de
Stevenson, que tinha o
hábito de sair todas as
tardes entre as 5 e 6 e
não voltava nunca antes
das 10. Mas não
transcorreram mais do
que três minutos, desde
que Stevenson ouvira a
frase citada
anteriormente, quando a
porta se abriu e David
entrou, sem que o
esperassem àquela hora.
674. Não acho necessário
dizer que minha hipótese
de uma manifestação real
do espaço que se acha
transformado num centro
fantasmogenético
aplica-se tanto à voz
fantasmal como às
figuras fantasmais. A
voz não se distingue
acusticamente, nem a
figura é vista
oticamente. Mas uma voz
fantasmal pode vir de
determinado lugar, no
usual sentido da
palavra. Sem dúvida, nos
casos como o de
Stevenson, onde a voz
foi ouvida somente por
uma pessoa, é mais
simples supor que a
trajetória auditiva do
sujeito invadido foi o
único trecho do espaço
afetado.
675. Esses casos de
telestesia e outros
semelhantes têm como
particularidade a
incursão psíquica que
não supõe qualquer
aquisição de
conhecimentos
supraliminares. Existem,
não obstante, casos
caracterizados por uma
verdadeira aquisição de
novos conhecimentos. De
que forma se realiza
essa aquisição?
676. Esses conhecimentos
podem, primeiramente,
ser adquiridos graças ao
acréscimo do potencial
dos sentidos comuns.
Outras vezes a aquisição
é feita por intermédio
de artifícios
particulares que
utilizam os sentidos
comuns num caminho novo,
como na cristaloscopia.
Um terceiro modo é
constituído pela
telepatia, que
frequentemente adquire a
forma da telestesia
pura, quando o Espírito
incursivo é atraído não
por outro Espírito
distante, antes por uma
cena distante.
Finalmente, acredito ser
útil rememorar que os
exemplos mais notáveis
de telestesia aqui
citados produziram-se
principalmente sob a
forma de sonho e visão.
677. Existe um meio de
relacionar entre si
todos esses diversos
meios de percepção?
Podemos encontrar, no
próprio estado do
sujeito invadido, um
elemento que seja comum
a todos? Até determinado
grau é possível essa
coordenação. Assim, a
telestesia é
caracterizada quase
sempre por uma tendência
a algo semelhante ao
sonho; e, ainda que a
hiperestesia se observe,
às vezes, entre pessoas
totalmente acordadas,
constitui um atributo
característico dos
estados sonambúlicos.
678. Durante o
desenrolar de nossa
discussão sobre o
hipnotismo, vimos que às
vezes era possível
estender, mediante uma
sugestão gradual, a
potência perceptiva do
sujeito, até o ponto de
transformar uma
hiperestesia, que pode
inclusive aplicar-se
pela ação dos órgãos dos
sentidos, numa
telestesia que não
explica essa ação.
Note-se que, nos casos
desse gênero, os
sujeitos, ao descreverem
suas sensações, falam,
com frequência, de
impressões recebidas ou
de imagens vistas, como
se estivessem colocados
diante deles; outras
vezes acreditam estar
viajando e visitar cenas
distantes; ou,
igualmente, a sensação
oscila entre os dois
gêneros de impressão, da
mesma forma que o
sentido da relação do
tempo na imagem vista
oscila entre o presente,
passado e futuro.
679. Os fenômenos de
cristaloscopia
apresentam analogias
bastante estreitas com
todas essas sensações
tão complexas. Insisti
sobre o fato curioso de
que o simples artifício
de olhar num cristal tem
como efeito provocar
fenômenos que pertencem
a todos esses grupos
diversos. Em si, as
imagens que no cristal
apresentam o mesmo
aspecto podem ter
origens diversas e estar
acompanhadas de
determinadas sensações,
não só da sensação de
contemplação, mas também
(ainda que raramente) da
possessão, bilocação e
presença psíquicas entre
as cenas desenhadas no
cristal, mas que não
estão limitadas nem
contidas nele.
680. Essa ideia da
incursão psíquica deve,
portanto, ser
reconciliada com o
caráter frequentemente
simbólico dessas visões.
Na cristaloscopia,
trata-se, com
frequência, não de uma
simples transcrição de
fatos materiais, antes
de uma seleção sucinta
que age entre esses
fatos e, inclusive, de
uma modificação
audaciosa desses mesmos
fatos, com o fim de
tornar o relato da
história mais claro e
completo. Conhecemos
essa mesma sucessão de
cenas simbólicas no
sonho, no sono e na
vigília.
681. Um elemento
semelhante é comum a
todas as visões
telestésicas, indício de
que o Espírito colaborou
na construção da imagem,
de que a cena não foi
apresentada, por assim
dizer, na sua
objetividade crua, antes
com uma certa seleção de
detalhes e um certo
simbolismo, no modo em
que estes foram
apresentados.
682. Vejamos agora o
modo pelo qual essas
particularidades afetam
as teorias que concernem
ao mecanismo da
clarividência.
Suponhamos primeiro que
existe uma certa
transição entre
hiperestesia e
telestesia, de forma que
quando a sensação
periférica não é
possível, a percepção
central pode agir sempre
através de obstáculos de
outro modo invencíveis.
Assim sendo, é muito
provável que a percepção
central se adapte às
formas de percepção a
que estão acostumadas as
trajetórias centrais do
cérebro, e que o
conhecimento superior, o
conhecimento telestésico,
de alguma forma
adquirido, se apresente
antes de tudo, quer como
clarividência, quer como
clariaudiência, como
certa forma da vista e
do ouvido.
683. Essa vista e esse
ouvido telestésicos
guardam, contudo, certos
resquícios de sua origem
inusitada. Apresentam,
por exemplo, uma
coordenação imperfeita
com as sensações visuais
e acústicas
proporcionadas pelos
órgãos externos e, como
constituem, por assim
dizer, uma tradução de
impressões supranormais,
em termos sensoriais,
apresentam, com certeza,
um caráter simbólico.
684. Em cada uma das
etapas de nossas
investigações tropeçamos
com essa tendência ao
simbolismo subliminar.
Como exemplo de sua
forma mais simples,
citarei aqui o caso do
estudante de botânica
que, passando
distraidamente diante de
um restaurante francês,
acreditou ter lido no
cartaz: Verbascum
Thapsus. Mas a palavra
que realmente estava
impressa era Bonillon; e
a palavra Bonillon
constituía a designação
francesa vulgar da
planta Verbascum Thapsus.
Aqui produziu-se uma
transformação subliminar
da percepção ótica real,
e as palavras Verbascum
Thapsus foram uma
mensagem enviada ao eu
supraliminar distraído,
pelo eu subliminar, mais
preocupado com a
botânica do que com a
comida.
685. Sabemos ainda que
nossa própria percepção
ótica é, no seu gênero,
simbólica no mais alto
grau. A cena que a
criança vê
instintivamente, que o
pintor impressionista
trata de ver, através de
uma autossimplificação
forçada, é muito
diferente da forma pela
qual um homem maduro
comum interpreta o mundo
visível e se representa
a distribuição das
cores. Mas nos adultos
adotamos, a respeito do
simbolismo subliminar, a
mesma atitude que tem a
criança sobre nosso
simbolismo ótico
aperfeiçoado.
686. Da mesma forma que
a criança não capta a
terceira dimensão, nós
não captamos a quarta,
ou o que quer que seja a
lei do conhecimento
superior, que dá ao
homem, de forma
fragmentada, o que seus
sentidos comuns são
incapazes de discernir.
687. Não quero dizer, de
forma alguma, que todo
conhecimento simbólico
seja um conhecimento que
nos vem de um Espírito
externo ao nosso. O
simbolismo pode ser a
linguagem inevitável,
através da qual uma das
camadas de nossa
personalidade se
comunica com outra.
Resumindo: o simbolismo
pode ser a lembrança
psíquica, mais fácil ou
possível, dos fatos
objetivos atuais, e
esses fatos podem ter
sido fornecidos nessa
forma por outros
Espíritos, dispostos
para serem digeridos
pelo nosso, como o
alimento normal é
elaborado tendo em vista
a nossa digestão
corporal, a partir de um
primitivo estado de
crueza.
688. Do ponto de vista
idealista, podemos,
contudo, nos perguntar
se nos casos desse
gênero existe uma
diferença real entre o
simbolismo e a
realidade, entre o
subjetivo e o objetivo,
no sentido comum dessa
palavra. A matéria
sensível, que vemos e
tocamos, possui uma
realidade “sólida” para
os Espíritos
constituídos de forma
que tenham a sensação
subjetiva de sua
solidez. Mas para os
outros Espíritos,
dotados de outra forma
de sensibilidade, para
os Espíritos talvez
superiores aos nossos, e
mais numerosos que os
nossos, essa matéria
sólida pode parecer
discutível e irreal,
enquanto o pensamento e
a emoção, percebidos por
vias desconhecidas para
nós, representam para
eles a única realidade.
689. Este mundo material
constitui, com efeito,
um “caso específico”, um
exemplo simplificado,
entre todos os mundos
perceptíveis aos
Espíritos encarnados.
Para os Espíritos
desencarnados não é já
um “caso específico”;
é-lhes, aparentemente,
mais fácil discernir os
pensamentos e as emoções
com ajuda de signos
imateriais. Todavia não
estão desprovidos
totalmente da faculdade
de perceber as coisas
materiais, como os
Espíritos encarnados não
estão desprovidos da
faculdade de perceber as
coisas imateriais, as
emoções e as ideias,
simbolizadas de forma
fantasmal.
690. Parece emanar
dessas reflexões a
existência de uma
contínua transição da
telestesia à telepatia,
da percepção supranormal
de ideias existentes nos
outros Espíritos à
percepção supranormal do
que conhecemos como
matéria.
(Continua no próximo
número.)