Doce partida
Uma cuidadora de idosos
contou-nos emocionada,
entre lágrimas, das
saudades que ela sentia
de uma senhora que ela
cuidara por algum tempo,
até sua desencarnação,
há alguns meses, com a
idade de 112 anos.
112 anos? Perguntamos
surpresa. 112, confirmou
ela.
E como ela estava? Tinha
muitas dificuldades?
Estava acamada? Tinha o
Mal de Alzheimer?
Não, de jeito nenhum!
Caminhava bem, fazia sua
caminhada diária, meia
hora por dia. Tinha a
memória melhor do que a
dos filhos e netos, não
esquecia o nome de
ninguém, tinha uma
conversa boa. Era bom
conversar com ela. Ela
era bem informada. Lia o
jornal todos os dias,
lia muito.
Lembramos que os estudos
da atualidade na área da
neurologia sugerem que
os idosos devem ler
muito e fazer
exercícios, pois isto
forma neurônios novos e
pode impedir ou retardar
o “mal de Alzheimer”.
Fazer o bem também, o
amor mantém a lucidez
mais tempo; quem
trabalha no bem e
vivencia o amor, mantém
a memória. A ciência
hoje nos mostra o que as
obras psicografadas por
Chico Xavier, escritas
por André Luiz, nos
revelaram há muito
tempo. Quem equilibra a
inteligência com o amor
tem equilíbrio mental. A
velhinha era assim.
Amava e era muito amada,
merecia.
Como foi a morte dela? –
perguntamos. É comum as
pessoas idosas verem
amigos e parentes que
morreram antes virem-nas
visitar. Ela comentava
algo?
Ah! Ela via muito,
citava os nomes,
mencionava esse ou
aquele que ali estava.
Começou a nos preparar
para a sua partida um
tempo antes, dizia que
eles estavam avisando
que em breve ela estaria
com eles. No último mês
chamou a família para se
despedir. Todos foram
chegando e ela
despediu-se de um por
um, lembrando-se de
todos. A última foi uma
bisneta, que ela ficou
esperando, pois vinha do
Canadá, onde mora.
Chegou com o marido,
grávida, exclusivamente
para despedir-se. Ela
abençoou a bisneta, pôs
a mão em sua barriga,
fez uma prece pela
criança, estava muito
bem.
A cuidadora saiu para
buscar um copo d´água,
que a velhinha
solicitou. Ela ficou só
por poucos instantes, a
conta da cuidadora ir e
voltar da cozinha com a
água. Ao voltar,
deparou-se com o corpo
sem vida da senhora. Em
sua face estava
estampado um lindo
sorriso. Foi uma morte
muito bonita, disse ela,
entre lágrimas. “Sinto
saudades. Ela era uma
pessoa excelente. Sinto
falta de conversar com
ela. Ela era muito
culta, aprendi muito com
ela”, disse-me a amiga.
112 anos não é fácil
atingir, ainda mais
assim, como ela se
revelava. Conhecemos uma
senhora que já tem essa
idade, mas o corpo não
obedece. Frágil, não tem
forças para levantar-se
do leito, memória do
idoso, do passado, com
detalhes, presente pouco
lembrado. Essa senhora
que nos foi citada foi
surpreendente. Espírito
completista, deu lições
de sabedoria até o fim.
Os velhos estão dando
verdadeiras lições de
luz aos mais jovens e
estão sendo finalmente
reconhecidos por seu
valor. Estão sendo
amados, respeitados,
ouvidos. Sua experiência
e suas histórias
fascinantes de um tempo
que passou são
envolventes quando se
pode ouvi-los. Estão
começando a receber o
respeito devido, mesmo
porque, com a melhora da
qualidade de vida, cada
vez estão mais
numerosos, mantendo-se
como auxiliares na renda
de suas famílias, e, uma
grande parte,
trabalhando
continuadamente, em
grande exemplo, enquanto
têm forças. Neste país
que cultua tanto o corpo
e a beleza, a beleza do
idoso brilha, pois é uma
beleza de fato, um
coração amoroso que se
revela numa face cheia
de rugas, mas que se
mostra nobre, num brilho
de amor no olhar.
No livro “Boa Nova”, de
Humberto de Campos,
psicografado por Chico
Xavier, Simão, o Zelote,
que se achava idoso, sem
forças, dialoga com
Jesus, comentando que os
moços eram fortes e ele
se sentia humilhado,
porque não se achava
capaz como eles,
fisicamente.
– Mas escuta Simão -
disse Jesus - achas que
os moços de amanhã
poderão fazer alguma
coisa sem os trabalhos
dos que agora estão
envelhecendo?! Poderia a
árvore viver sem a raiz,
a alma sem Deus?
Lembra-te da tua parte
do esforço e não te
preocupes com a obra que
pertence ao
Todo-Poderoso,
Sobretudo, não olvides
que a nossa tarefa, para
a dignidade perfeita de
nossas almas, deve ser
intransferível...
... Não te magoe a
palestra dos jovens da
Terra...
... Quando te cerque o
burburinho da mocidade,
ama os jovens que
revelam trabalho e
reflexão; entretanto,
não deixes de sorrir,
igualmente, para os
levianos e inconstantes:
são crianças que pedem
cuidado, abelhas que
ainda não sabem fazer o
mel. Perdoa-lhes o
entusiasmo sem rumo,
como se deve esquecer os
impulsos de um menino na
inconsciência dos seus
primeiros dias de vida.
Esclarece-os Simão, e
não penses que outro
homem pudesse efetuar,
no conjunto da obra
divina, o esforço que te
compete. Vai e tem bom
ânimo! Um velho sem
esperança em Deus é um
irmão triste da noite;
mas eu venho trazer ao
mundo as claridades de
um dia perene.
Jesus terminou e, como
sempre, grande foi sua
lição!
Cada Espírito encarnado
é um ser precioso em sua
colaboração com a vida,
engrandecendo-a com sua
jornada laboriosa.
Espíritos maravilhosos
têm passado por nós,
dando-nos grandes
ensinamentos na velhice,
mantendo bom ânimo e
coragem, aos moldes de
Simão ante os conselhos
de Jesus.
Um halo de doçura e
delicadeza envolve os
idosos, que
exteriorizam, à medida
que os anos passam, a
fragilidade de seus
corpos e a fortaleza de
seus espíritos. Paremos
para ouvi-los. Prestemos
atenção neles, escutemos
as suas histórias.
Revelam um tempo que não
mais existe e, que
encantados, podemos
imaginar.
A idosa de 112 anos
tinha muitas histórias.
Foi amada e muito amou
e, pelo tanto que amou,
mereceu ser amada.
Desencarnou muito fácil.
Era espírita? Não! Isso
não importa. Os atos,
sim, importam. Tomara
que, ao chegar nossa
vez, possamos
desencarnar tão fácil
assim. Preparemo-nos,
desde jovens, com uma
semeadura de amor,
cotidianamente. Só
nossos mentores sabem,
como Espíritos mais
elevados, nosso amanhã.
Nós não sabemos, mas
podemos ficar em paz,
com o coração
pacificado, com a nossa
atitude de amor. E,
quando chegar nossa
hora, que possamos nos
despedir docemente desta
nossa querida morada
chamada Terra, e partir
para o mundo espiritual
em paz e – quem sabe?
–com um doce sorriso na
face.