ANGÉLICA
REIS
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Londrina, Paraná
(Brasil) |
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A
Personalidade Humana
Fredrich
Myers
(Parte 43)
Damos
sequência ao estudo
metódico e sequencial do
livro A Personalidade
Humana, de Fredrich
W. H. Myers, cujo título
no original inglês é Human
Personality and
Its Survival of Bodily
Death.
Questões preliminares
A. Existe a chamada
possessão diabólica?
|
Segundo Myers, não. O
diabo não é uma criatura
cuja existência
independente esteja
reconhecida pela
ciência; e todos os
relatos concernentes ao
comportamento de diabos
invasores parecem
ditados pela
autossugestão.
(A Personalidade Humana.
Capítulo IX – Possessão,
arrebatamento, êxtase.)
B. Quem então produziria
os fenômenos de
possessão?
Myers entende que, em
casos assim, achamo-nos
na presença de Espíritos
que foram, em outra
época, homens iguais a
nós e que estiveram
sempre inspirados pelos
mesmos motivos que nós.
(Obra citada. Capítulo
IX – Possessão,
arrebatamento, êxtase.)
C. Nesses fenômenos pode
o sujeito, ou seja, o
sensitivo, falar uma
língua que jamais
aprendeu?
Não. Razão alguma temos
de esperar que um
Espírito exterior que
assumiu a direção do
organismo seja capaz de
facilmente modificá-lo,
a ponto de fazer com que
o sujeito fale uma
língua que jamais
aprendera. O
funcionamento do cérebro
se parece com o da
máquina de escrever e de
calcular.
Exemplificando: as
palavras alemãs não são
mero conjunto de letras,
senão fórmulas
específicas; só com
muita dificuldade
podemos reproduzi-las
numa máquina que não
tenha sido projetada
para esse fim.
(Obra citada. Capítulo
IX – Possessão,
arrebatamento, êxtase.)
Texto para leitura
1048. Veremos a seguir
as condições que estado
de possessão cria no
espírito do sujeito. No
que concerne ao
organismo, a invasão
parece completa e indica
uma potência com certeza
telepática no verdadeiro
sentido da palavra, mas
não no sentido que demos
até agora. Começamos
representando a
telepatia como a
comunicação entre duas
pessoas, enquanto no
caso presente trata-se
antes de uma comunicação
entre o espírito e o
corpo, cujo espírito é
externo e alheio a
respeito do corpo.
1049. Não há comunicação
aparente entre o
espírito desencarnado e
o espírito do autômato;
antes há uma espécie de
contato entre o primeiro
e o cérebro do autômato,
o espírito desencarnado
perseguindo os seus
próprios fins e
servindo-se de certa
maneira das capacidades
acumuladas pelo cérebro
do autômato, enquanto,
por outro lado, é
molestado pelas suas
incapacidades.
1050. O elemento mais
característico da
telepatia parece ter
desaparecido, pois não
há comunhão perceptível
entre o espírito do
sujeito e outro
espírito. O sujeito está
possuído, mas
inconsciente, e não
recupera jamais a
memória daquilo que
disse durante a crise.
1051. Mas será que
explicamos destarte
todos os fenômenos
relacionados com a
telepatia? Será que eles
não encerram um elemento
mais real, mais
centralmente telepático?
1052. Voltando às
primeiras etapas das
experiências
telepáticas, vemos que o
processo experimental
encerra dois diferentes
fatores. O espírito do
sujeito deve, de uma
maneira ou de outra,
receber a impressão
telepática, e não
podemos dar a essa
percepção nenhum
corolário físico
definido; e os centros
motores e sensoriais do
sujeito devem receber
uma excitação que pode
ser provocada, como já
sabemos, pelo próprio
espírito do sujeito e
pelos processos comuns,
ou pelo espírito do
agente, e isso de forma
mais ou menos direta,
que eu chamaria
telérgica, dando assim
um sentido mais exato à
palavra que eu sugerira
há longo tempo como
correlato da palavra
telepático.
1053. Isto significa que
pode haver nesses casos,
simples na aparência,
inicialmente uma
transmissão do agente
para o sujeito no mundo
espiritual, e depois uma
ação sobre o cérebro
físico do sujeito, do
mesmo gênero da
possessão espiritual.
Esta ação sobre o
cérebro físico pode ser
devida tanto ao espírito
do próprio sujeito, como
diretamente à ação do
espírito do agente.
1054. Pois devo repetir
que os fenômenos de
possessão parecem
indicar que o espírito
alheio age sobre o
organismo do sujeito
exatamente da mesma
maneira que o próprio
espírito do sujeito.
Podemos, pois,
considerar o corpo como
um instrumento que o
espírito toca, antiga
metáfora que é na
atualidade a mais
próxima da verdade.
1055. O mesmo caráter
duplo, os mesmos
vestígios dos dois
elementos misturados, em
proporções diversas, se
manifestam em aparições
telepáticas ou
verídicas. Do ponto de
vista espiritual, pode
existir o que chamamos
as visões clarividentes,
as imagens
manifestamente
simbólicas e não
localizadas pelo
observador, no espaço
comum das três
dimensões. Parecem
análogas às visões do
mundo espiritual de que
desfruta o sujeito
durante o êxtase. Vem, a
seguir, a categoria mais
numerosa de aparições
verídicas em que a
imagem parece ter sido
projetada fora do
espírito do sujeito por
algum estímulo aplicado
ao centro cerebral
apropriado.
1056. Esses casos de
“automatismo sensorial”
se parecem aos casos
experimentais nos quais
o sujeito adivinha, ou
melhor, enxerga à
distância os naipes do
baralho. Após estes
casos surgem, por ordem
física, ou melhor,
ultrafísica, essas
aparições coletivas que,
a meu ver, implicam uma
modificação de natureza
desconhecida de uma
certa porção do espaço
ocupada por nosso
organismo, opondo-se às
modificações que ocorrem
nos centros de um
cérebro determinado.
Realiza-se aqui a
transição gradual do
subjetivo ao objetivo e
a porção de espaço se
modifica de forma a
afetar um número cada
vez maior de sujeitos.
1057. Passando dessas
aparições de vivos às de
mortos, encontramos,
pode-se dizer, as mesmas
categorias. Encontramos
as visões simbólicas de
pessoas falecidas e as
circunstâncias nas quais
parecem achar-se.
Deparamo-nos com
aparições exteriorizadas
dos fantasmas de pessoas
falecidas, o que indica
que um ponto determinado
do cérebro do sujeito
foi estimulado por seu
próprio espírito ou por
outro espírito
diferente.
1058. E encontramos,
finalmente, como já
dissemos, que em certos
casos de possessões
esses dois gêneros de
influências foram
levados,
simultaneamente, ao
extremo. O autômato
ainda capaz de
percepção, como vimos
durante as primeiras
fases, converte-se num
autômato puro e simples,
que já nada percebe, ao
menos no que se refere
ao seu corpo, porque seu
cérebro, e não um ponto
único, parece dirigido e
estimulado por um
espírito estranho, não
se dando conta do que
seu corpo escreve ou
pronuncia. E durante
esse tempo seu espírito,
parcialmente liberto do
corpo, pode ser
acessível às percepções
e gozar desta outra
forma espiritual de
comunicação, mais
completamente que em
qualquer dos gêneros de
visão até aqui
descritos.
1059. Existe outro
estado que demonstra
certa analogia com o de
possessão. Falamos, em
particular, de
personalidades
secundárias, de
dissociações e
alternativas que afetam
o próprio espírito do
sujeito e apresentam
relações diversas com o
organismo. Mas o que é
que nos permite concluir
que, em cada caso, o
organismo do sujeito
está dirigido por sua
própria personalidade
modificada e não por uma
personalidade estranha,
exterior?
1060. Aqui é fácil a
confusão, e pode-se
dizer, de maneira geral,
que todas as vezes que o
estado de êxtase não vem
acompanhado da aquisição
de conhecimentos novos,
podemos excluir a
possibilidade de uma
possessão por espírito
estranho. Esta regra tem
uma consequência muito
importante e que
modifica completamente a
antiga ideia da
possessão: não existe, a
menos que a conheçamos,
qualquer prova a favor
da possessão angelical,
diabólica ou hostil.
1061. O diabo não é uma
criatura cuja existência
independente esteja
reconhecida pela
ciência; e todos os
relatos concernentes ao
comportamento de diabos
invasores parecem
ditados pela
autossugestão. Devemos
insistir sobre a regra
segundo a qual só o
conhecimento supranormal
permite confirmar a
intervenção de uma
influência exterior.
1062. Pode-se-nos
objetar que neste caso o
caráter manifestado pelo
diabo era hostil à
pessoa possuída e
perguntarmo-nos se é
possível que o
satanizador fosse, na
realidade, uma fração do
satanizado. Ao que
responderemos que esta
última suposição, longe
de ser absurda, está, ao
contrário, sendo
confirmada pelos
fenômenos
conhecidíssimos da
loucura e da histeria.
1063. Na Idade Média, em
especial, nas
autossugestões fortes e
terríveis, onde o diabo
era o personagem
principal, essas
quase-obsessões atingiam
uma intensidade e uma
violência que a
tranquila e céptica
atmosfera dos hospitais
modernos dissipa e
debilita. Os diabos de
nomes terríveis que
possuíam a sóror
Angelica de Loudun
figurariam, em nossos
dias, na Salpêtrière,
como simples
manifestações de
“palhaçadas” ou “atos
passionais”.
1064. Atualmente, como
no caso da Leonie, de
Pierre Janet, essas
desintegrações da
personalidade parecem
destruir, às vezes, até
o menor vínculo de
simpatia entre o
indivíduo normal e uma
de suas frações, donde
parece resultar que
nossa natureza moral
está submetida às
desintegrações no mesmo
grau que nossa natureza
intelectual, e quando
uma corrente secundária
de nossa personalidade
toma nova direção, pode
ocorrer que os vínculos,
tanto os morais como os
intelectuais, que a unem
à personalidade
principal se encontrem
quebrados.
1065. Sobre as
possessões diabólicas
observadas entre os
chineses, conta-nos
Nevius, sem citar
argumentos convincentes,
que os diabos
possessivos manifestam,
às vezes, um
conhecimento
supranormal. Isto seria
uma prova de sua
existência independente,
mais importante que o
argumento tomado de seu
caráter hostil, mas
ainda insuficiente para
confirmar esta
existência.
1066. O conhecimento em
questão não parece
totalmente apropriado ao
espírito que se lhe
atribui. Com frequência,
parece produto de um
exagero da memória,
acompanhado de certa
aptidão às percepções
telepáticas ou
telestésicas. O exagero
da memória é,
particularmente,
característica de certos
estados histéricos e,
inclusive, indícios
possíveis de telepatia
foram observados nos
estados em que nada
permitia o
reconhecimento da
intervenção de um
espírito invasor.
1067. A direção temporal
do organismo por um
fragmento relativamente
importante, separado do
resto da personalidade,
que degenera, em virtude
de uma autossugestão,
numa hostilidade para
com a personalidade
principal, resulta,
talvez, do fato desta
última alcançar e
manipular certas
impressões de reserva ou
inclusive certas
influências
supranormais. Seria essa
a fórmula à qual se
reduziriam,
provavelmente, a maioria
dos casos das chamadas
obsessões diabólicas. A
maioria, mas talvez, não
todas.
1068. Seria de fato
assombroso que os
fenômenos do gênero
apresentado pela Sra.
Piper tivessem surgido
no mundo sem ter tido
precedentes. Parece mais
seguro reconhecer que os
fenômenos do mesmo
gênero produziram-se
sempre esporadicamente,
desde os mais remotos
tempos, sem que os
homens tenham tido a
preocupação de
analisá-los.
1069. Seja o que for,
pode-se afirmar que os
únicos invasores do
organismo humano que até
aqui fizeram valer seus
títulos foram em
essência humanos e de
caráter amistoso. Os
“diabos de Loudun” e
outros não conseguiram,
repito-o, justificar sua
existência independente.
As influências
superiores que
inspiraram aos “mártires
de Cevennes” se
confundem, à distância,
com as inspirações do
gênio.
1070. Todas essas
considerações serão,
espero-o, de natureza a
fazer desaparecer essas
associações toscas que
se acumularam ao redor
da palavra possessão. No
que descrevemos, a
seguir, podem existir,
com frequência, motivos
de perplexidade, não de
terror. E, na
continuidade, ver-se-á
até que ponto o
sentimento final está
longe do terror.
1071. Reconhecendo,
pois, como acredito
estar agora autorizado,
que nos achamos somente
na presença de espíritos
que foram, em outra
época, homens iguais a
nós e que estiveram
sempre inspirados pelos
mesmos motivos que nós,
podemos examinar,
sucintamente, a questão
de saber quais os
espíritos mais
suscetíveis de chegar a
nós e que dificuldades
se antepõem à sua ação.
1072. Indubitavelmente,
somente a experiência
nos pode dar as
respostas a estas
perguntas; mas nossas
antecipações podem ser
modificadas utilmente,
se, ao refletir sobre as
mudanças da
personalidade que
conhecemos, tirarmos
delas indicações quanto
aos limites possíveis
dessas substituições
mais profundas. Mas que
sabemos sobre a adição
de uma nova capacidade
nos estados
alternativos? Em que
medida as modificações
desse gênero parecem
engendrar capacidades
que não nos sejam
familiares?
1073. Reportando-nos aos
casos já mencionados,
veremos, primeiramente,
que uma capacidade
existente é suscetível
de ser aumentada e
exaltada. Pode haver
exagero, tanto do poder
de percepção real, como
da lembrança e da
reprodução do que foi
percebido uma vez.
1074. Nos estados
secundários existe,
habitualmente, um poder
de controle maior no que
concerne aos movimentos
musculares, que se
manifesta, por exemplo,
na maior segurança da
mão, no caso do jogador
de bilhar. Mas, à parte
os fenômenos de
telepatia, não existe
prova alguma a favor da
aquisição real de um
conjunto de
conhecimentos novos,
como por exemplo um
idioma desconhecido ou
um nível desconhecido de
conhecimentos
matemáticos.
1075. Portanto, razão
alguma temos de esperar
que um espírito exterior
que assumiu a direção do
organismo seja capaz de
facilmente modificá-lo,
a ponto de fazer com que
o sujeito fale uma
língua que jamais
aprendera. O
funcionamento do cérebro
se parece com o da
máquina de escrever e de
calcular.
Exemplificando: as
palavras alemãs não são
mero conjunto de letras,
senão fórmulas
específicas; só com
muita dificuldade
podemos reproduzi-las
numa máquina que não
tenha sido projetada
para esse fim.
1076. Consideremos as
analogias relativas à
memória. Nos casos de
alternativas da
personalidade a memória
sucumbe e muda de uma
forma que parece
caprichosa. As lacunas
que surgem, como já
disse, assemelham-se às
amnésias ou a esses
espaços negros
impossíveis de rememorar
que, às vezes, seguem
aos traumatismos da
cabeça ou aos acessos de
febre, quando todas as
recordações relacionadas
a uma pessoa determinada
ou a um período da vida
desapareceram, enquanto
as demais permaneceram
intactas.
(Continua no próximo
número.)