Punição ou educação?
A questão da redução da
maioridade penal voltou
a ser discutida pela
sociedade brasileira no
momento em que se sabe
pela mídia do
recrudescimento dos
delitos graves
praticados por jovens e
adolescentes. As
características de
crueldade e frieza com
que são cometidos têm
levado muita gente a
exigir maior rigor penal
para os menores
infratores e a clamar
contra a impunidade.
Entretanto, há muitos
que pensam que o assunto
deva ser discutido sem
paixões, com respaldo
nos princípios aceitos
internacionalmente em
relação aos menores.
Mesmo porque, dizem, o
problema envolve
questões mais complexas
que a simples referência
etária.
No Brasil, a “maioridade
penal” (idade em que o
acusado pode ser
processado como adulto)
conta a partir dos 18
anos, e a
“responsabilidade
criminal” (idade em que
o acusado pode ser
penalizado em regime
diferenciado) a partir
dos 12 anos. Na maioria
dos países esses
critérios são bem
semelhantes ao modelo
brasileiro.
Popularmente, essa
diferenciação não é
conhecida e, segundo os
entendidos, ela é
importante na discussão
do problema. Dos 12 aos
18 anos, o menor
infrator no Brasil pode
ser penalizado, mas em
regime especial regulado
pelo Estatuto da criança
e do adolescente que,
conforme os
especialistas, contempla
soluções “corretivas”
adequadas à faixa
infanto-juvenil,
caracterizada por
necessidades
diferenciadas dos
adultos (1).
De qualquer forma,
parece ser opinião
predominante entre as
autoridades no assunto
que alterar de 18 para
16 anos a maioridade
penal não reduzirá a
violência e não logrará
afastar o adolescente da
criminalidade. Mas é
consenso também, na
população em geral, que
medidas urgentes
precisam ser tomadas
para garantir não só que
os números estatísticos
da criminalidade
diminuam, mas,
principalmente, que não
se percam tantas vidas
irracionalmente.
Na questão 796 de “O
Livro dos Espíritos”,
Allan Kardec quis saber
dos Espíritos se a
severidade das leis
penais não era uma
necessidade no estado
atual da sociedade (2),
ao que eles afirmaram:
“Uma sociedade depravada
tem certamente
necessidade de leis mais
severas. Infelizmente
essas leis se destinam
antes a punir o mal
praticado do que a
cortar a raiz do mal
(grifei). Somente a
educação pode reformar
os homens, que assim não
terão mais necessidade
de leis tão rigorosas”.
Os Espíritos deixaram
claro que atitudes
repressoras tão-somente
são ineficientes para
corrigir o infrator,
principalmente porque
quase nunca são
acompanhadas de medidas
capazes de influir
beneficamente no seu
caráter. Apesar de
indicarem a educação
como legítimo preventivo
dos delitos humanos, não
deixaram de referir-se a
leis mais severas para
as sociedades
turbulentas.
O Espírito Deolindo
Amorim, no seu livro
“Convite à reflexão”
(3), psicodigitado pelo
médium baiano Elzio
Ferreira de Souza,
reforça a reflexão sobre
o problema, ponderando:
“Leis apenas não são
suficientes, não se
reformam relações
sociais somente com sua
edição, não se extingue
a violência por
torná-las mais rigorosas
(...). A repressão não
pode aprimorar
caracteres deformados”.
A questão da impunidade
também é tratada por
Deolindo: “Tornou-se
lugar comum indicar a
impunidade como um dos
fatores aliciadores da
criminalidade, e não há
qualquer dúvida sobre
isto, porque certos
indivíduos são
impulsionados a praticar
ou a repetir atos
violadores das leis
penais quando percebem a
inércia do poder
judicial”. Afirma o
Espírito que a
impunidade é ainda mais
aliciadora quando
derivada da
discriminação, ou seja,
ricos e pobres não têm o
mesmo tratamento pela
justiça humana.
Respondendo a pergunta
793, ainda de “O Livro
dos Espíritos”, estes
disseram que a
civilização completa só
ocorrerá com o
desenvolvimento moral:
quando a moral estiver
tão desenvolvida quanto
a inteligência (P.791).
Deolindo Amorim,
seguindo na esteira do
raciocínio dos Espíritos
da codificação, alerta
para não confundirmos
esse desenvolvimento
moral simplesmente
“como uma modificação de
costumes sociais ou de
boas maneiras”. “O
aperfeiçoamento moral -
afirma ele - resultado
de uma verdadeira
educação, proveniente da
aquisição de hábitos
novos, da formação de
caracteres sadios,
conduzindo o homem à
espiritualização da
vida, será o fator
decisivo para expelir do
seio dos povos a
violência, a impunidade,
o desnivelamento social,
os guetos etc., etc.”.
Claro que se aguarda um
desfecho sensato e
equilibrado para essa
discussão, e a posição
espírita quanto à
solução do problema da
violência e da
criminalidade, sejam
elas perpetradas por
jovens ou adultos, foi
dada por Allan Kardec e
os Espíritos: sem a
preocupação de educar-se
moralmente a sociedade,
não se obterá êxito.
Por ora, será uma causa
justa que a sociedade
brasileira propugne para
que esse regime do ECA
seja plenamente
atendido e
convenientemente
aplicado, enquanto
trabalhamos todos por
melhores dias, em que as
condições éticas e
morais prevaleçam nas
nossas relações sociais.
Mas que é preciso a
adoção imediata de
medidas para
salvaguardar os
interesses gerais da
sociedade como um todo,
não há a menor dúvida.
Referências:
1 - Dados e enunciados
colhidos no site
Wikipédia (maioridade
penal), dentre outros.
2 - Essa preocupação de
Kardec em 1857 é a mesma
que temos ainda hoje.
3 - “Convite à
reflexão”, Lachâtre, 2ª
edição, 2012.