Prece no campo
O lavrador de
uns quarenta
anos, enxada ou
machado às
costas, voltava
à tardezinha do
seu duro labor.
No corpo, o
cansaço e o
suor. Na alma
simples, o
pensamento em
Deus, na
família, nas
suas criações,
no seu pedaço de
chão.
Próximo a sua
casa, sentava-se
sob frondosa
árvore, onde
encostara um
toco de pau, à
maneira de um
banco. Todos os
dias, no seu
retorno, ali se
sentava, nela se
recostando,
refazendo
energias e
meditando.
Quando chegava
àquele ponto,
esquecia a
exaustão e o dia
de lutas. E se
punha a ouvir e
a olhar a
natureza à sua
volta, enquanto
pensava.
Ouvia a música
do vento na
folhagem das
árvores e da
plantação: aqui
do arrozal, ali
do milharal
soltando
bonecas; o
cantar dos
pássaros, ora
pousados, ora em
revoadas pelo
ar; mais além, a
'voz' do
monjolo, a pilar
o arroz, o
milho, ou o
café; do riacho
próximo, a
'cantiga' da
água, a marulhar
entre pedras; em
meio ao pasto, o
berrar de
bezerros e
vacas, o
relinchar dos
cavalos; próximo
à casa, o cantar
das aves no
quintal (o galo,
a galinha, os
patos), o latir
dos cães e o
grunhir dos
porcos no
chiqueiro. Até o
pipilar de
grilos era
música aos seus
ouvidos.
Ah! e ouvia
então o riso de
seus filhos
inocentes e
bons, a correr e
a brincar! E
ouvia muito
mais: parece que
a alma das
coisas lhe
falava nestes
momentos,
naquele universo
de sons e de
cores!
Enquanto ouvia,
seu olhar
buscava a origem
dos sons. E
então via, ora o
peixe no regato
cristalino; ora
os animais,
pelos campos a
pastar; ora os
pássaros em
bandos, ou aos
pares, a voar
pelos céus.
Ah! o céu! Que
encantamento,
para sua alma,
todas as tardes
olhar as nuvens
e mirar no
poente o sol a
se pôr, a cada
dia com novos
desenhos e novos
tons no
colorido, pois
que Deus é
poeta: poeta da
vida, a mais
bela das artes.
E nunca repete
um quadro! A
cada momento, o
céu se modifica
e o amanhecer ou
o entardecer é
sempre novo, aos
olhos de sua
ternura.
Então, nestes
momentos, em que
ali se sentava e
tudo via e
ouvia, sua alma
se deslumbrava,
extasiada, com
tanta beleza; e
seu coração se
voltava a Deus,
numa prece.
Prece de
gratidão, pela
generosidade com
que o tratava, a
ele, simples
homem do campo:
além da fartura
dos grãos e dos
frutos, em tudo
a beleza e a
música da vida.
Não contente em
criá-lo e em
nutri-lo, o Pai
o cumulava de
tantas bênçãos.
E agradecia pelo
ar que
respirava, pelas
coisas belas que
o cercavam, pela
vida que levava;
pela família,
pelo pedaço de
chão que lhe
dera a cultivar;
pelos campos e
pelos animais!
Como amava tudo
que lhe viera à
vida! Era-Lhe
grato por tudo!
Trazia na alma,
nessa hora de
paz, ternura
infinita!
Em todos os
dias, àquela
hora sagrada ao
seu coração, o
mesmo
encantamento!
Sua alma, toda
em prece, e ele
só, tão-somente
ele,
diariamente, no
seu encontro com
Deus, para a
prece do muito
obrigado!
Aos seus olhos,
isso era bem
pouco, diante da
grandeza e da
generosa
presença; mas
era o que, com
alegria e
reverência, lhe
cabia fazer.
Era, para ele,
nobre e modesto
dever que
rigorosamente
cumpria todos os
dias!