Continuamos o estudo metódico do livro “O Céu e o Inferno, ou a Justiça Divina segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec, cuja primeira edição foi publicada em 1º de agosto de 1865. A obra integra o chamado Pentateuco Kardequiano. As respostas às questões sugeridas para debate encontram-se no final do texto abaixo.
Questões para debate
A. Como é descrito o inferno pela teologia católica?
B. As crianças vão para o limbo. Que significa essa palavra?
C. Segundo a descrição da teologia católica, Deus produz dois milagres para tornar ainda mais terríveis os sofrimentos dos condenados ao inferno. Que milagres são esses?
D. O inferno cristão excede o inferno pagão. Quais as suas diferenças?
Texto para leitura
35. Desde todas as épocas o homem acreditou, por intuição, que a vida futura seria feliz ou infeliz, conforme o bem ou o mal praticado neste mundo. A ideia, porém, que ele faz dessa vida está em relação com o seu desenvolvimento, senso moral e noções mais ou menos justas do bem e do mal. (Primeira Parte, cap. IV, item 1.)
36. Não podendo compreender senão aquilo que vê, o homem primitivo moldou o seu futuro pelo presente; para compreender outros tipos, além dos que tinha à vista, ser-lhe-ia preciso um desenvolvimento intelectual, que só o tempo lhe deveria dar. (Primeira Parte, cap. IV, item 2.)
37. Dessa forma, o quadro por ele ideado acerca das penas futuras não é senão o reflexo dos males da Humanidade, em mais vasta proporção, reunindo-lhe todas as torturas, suplícios e aflições que achou na Terra. É por isso que, salvo pequenas diferenças de forma, os infernos de todas as religiões se assemelham. (Primeira Parte, cap. IV, item 2.)
38. O inferno pagão, descrito e dramatizado pelos poetas, foi o modelo mais grandioso do gênero e se perpetuou no seio dos cristãos. Comparando-os, encontram-se neles numerosas analogias; ambos têm o fogo material por base de tormentos, como símbolo dos sofrimentos mais atrozes. Mas, coisa singular! os cristãos exageram em muitos pontos o inferno dos pagãos. (Primeira Parte, cap. IV, item 3.)
39. Localizados o céu e o inferno, as seitas cristãs foram levadas a não admitir para as almas senão duas situações extremas: a felicidade perfeita e o sofrimento absoluto. O purgatório é tão-somente uma posição intermediária e passageira, ao sair da qual as almas passam, sem transição, para a mansão dos bem-aventurados. (Primeira Parte, cap. IV, item 7.)
40. Outra não poderia ser a hipótese, dada a crença na sorte definitiva da alma após a morte. Se não há mais do que duas habitações, a dos eleitos e a dos condenados, não se podem admitir muitos graus em cada uma sem admitir a possibilidade do progresso. Ora, se há progresso, não há sorte definitiva; se há sorte definitiva, não há progresso. Jesus resolveu a questão quando disse: "Há muitas moradas na casa de meu Pai". (Primeira Parte, cap. IV, item 7.)
41. O conhecimento do inferno pagão nos é fornecido quase exclusivamente pela narrativa dos poetas Homero e Virgílio. Fénelon, no "Telêmaco", também o descreve, sem os exageros peculiares à forma poética. (Primeira Parte, cap. IV, item 9.)
42. Uma pergunta que se impõe é esta: como há homens que dizem ter visto o inferno em estado de êxtase, se ele não existe? A explicação é simples: o êxtase é a mais incerta de todas as revelações. (1) (Primeira Parte, cap. IV, item 15.)
Respostas às questões propostas
A. Como é descrito o inferno pela teologia católica?
O inferno cristão teve por modelo o inferno pagão e apresenta com este numerosas analogias. Ambos têm o fogo material por base de tormentos, como símbolo dos sofrimentos mais atrozes. Mas, coisa singular! os cristãos exageraram em muitos pontos o inferno dos pagãos. Exemplo disso são as caldeiras ferventes cujos tampos os anjos levantam para ver as contorções dos supliciados, enquanto Deus, sem piedade alguma, ouve-lhes os gemidos por toda a eternidade. Os cristãos têm, como os pagãos, o seu rei dos infernos - Satã - com a diferença, porém, de que Plutão se limitava a governar o sombrio império, que lhe coubera em partilha, sem ser mau; retinha em seus domínios os que haviam praticado o mal, porque essa era a sua missão, mas não induzia os homens ao pecado para desfrutar, tripudiar dos seus sofrimentos. Satã, porém, recruta vítimas por toda parte e regozija-se ao atormentá-las com uma legião de demônios armados de forcados a revolvê-las no fogo. Quanto à localização do inferno, alguns doutores o têm colocado nas entranhas mesmas do nosso globo; outros não sabemos em que planeta, sem que o problema se haja resolvido por qualquer concílio. (O Céu e o Inferno, Primeira Parte, cap. IV, itens 3 a 5, 11 e 12.)
B. As crianças vão para o limbo. Que significa essa palavra?
As crianças falecidas em tenra idade, sem fazer mal algum, não podem ser condenadas ao fogo eterno. Mas, também, não tendo feito bem, não lhes assiste direito à felicidade suprema. Ficam nos limbos, diz-nos a Igreja, nessa situação jamais definida, na qual, se não sofrem, também não gozam da bem-aventurança. A natureza do limbo, contudo, não foi jamais definida.(2) (Obra citada, Primeira Parte, cap. IV, itens 7 e 8.)
C. Segundo a descrição da teologia católica, Deus produz dois milagres para tornar ainda mais terríveis os sofrimentos dos condenados ao inferno. Que milagres são esses?
O primeiro milagre seria a ressurreição dos corpos, algo inimaginável sobretudo quando o corpo do indivíduo que morreu se tenha dissolvido com o decurso do tempo. O segundo milagre é dar a esses corpos mortais a virtude de subsistirem sem se dissolverem numa fornalha, onde se volatilizariam os próprios metais. (Obra citada, Primeira Parte, cap. IV, item 13.)
D. O inferno cristão excede o inferno pagão. Quais as suas diferenças?
Além das observações constantes da resposta à questão A, no inferno pagão não se vê o requinte das torturas que constituem o fundo do inferno cristão. Juizes inflexíveis, porém justos, proferem a sentença, sempre proporcional ao delito, ao passo que no império de Satã são todos confundidos nas mesmas torturas, com a materialidade por base, e banida toda e qualquer equidade. No inferno cristão, as sentenças não são proporcionais à gravidade do pecado cometido, mas, sim, iguais para todos que nele se encontrem. (Obra citada, Primeira Parte, cap. IV, itens 9 a 15.)
Notas:
(1) Veja a esse respeito o ensinamento contido nas questões 443 e 444 d'O Livro dos Espíritos. Devemos considerar também que o indivíduo possa ter visto cenas da região chamada Umbral grosso, a que se refere o livro “Cidade no Além”, de Heigorina Cunha, onde há “choro e ranger de dentes”, como dizia Jesus.
(2) Recentemente a Igreja Católica tornou sem efeito todas as disposições que se referiam ao limbo, por entender que Deus tem meios invisíveis, não comunicados aos homens, para salvar todas as crianças, mesmo as que morrem sem o batismo.