O perigo da
idolatria
espírita
Por enquanto
pertencemos a
uma época
instável e
compomos, no
geral, uma
sociedade
instável. Porém,
ser moderno não
é apenas estar
vivendo
atualmente
(2013), mas
também procurar
compreender o
que denuncia
nosso
Zeitgeist,
ou seja, tentar
discernir os
ecos do plano
invisível que
guiam os padrões
do existir no
plano visível –
e, portanto, os
comportamentos
sociais não são
apenas “eventos
externos”,
eventos da
esfera
privado-público,
mas também
“internos” e
como ocorrências
ou fatos da
alma.
Por isso somos
obrigados a
tornar
conscientes
motivos e/ou
convicções que
no geral estão a
orientar nossas
vidas para que
possamos viver
“menos” às
cegas, mais
conscientes em
relação a nós
mesmos, nossos
deveres,
tarefas,
compromissos e
para que não
sejamos escravos
da biografia
alheia.
É fato que as
pessoas na
Antiguidade
tinham por
hábito cultuar
deuses. Não sem
razão, Jung
perguntou para
onde foram os
deuses depois
que deixaram o
Olimpo, e ele
mesmo adivinhou
que tinham ido
para o plexo
solar. Mais
tarde, quando os
homens
descartaram as
catedrais
medievais – e o
culto a reis e
papas –, o mesmo
Jung escreveu
numa carta que
eles, os
ocidentais,
despencaram no
abismo do
Si-mesmo.
Em consequência,
embora a
diversidade de
facetas da
experiência
moderna, uma há
que chama a
atenção,
porquanto hoje
(como no
passado) os
homens estão a
cultuar deuses,
mas estes agora
estão
metamorfoseados
de líderes
políticos,
atores,
jogadores de
futebol,
celebridades em
geral e, no
contexto
espírita,
celebridades
espíritas!
Sem alarde,
sabemos, através
de estudos e
pesquisas
sérias, que
grande parte da
população
mundial sofre
nos tempos de
agora, em maior
ou menor grau,
da síndrome do
culto à
personalidade.
Além disso, os
adolescentes,
insinuam os
estudos
dedicados ao
tema, são os
mais suscetíveis
ao transtorno.
Mas
particularmente
observo muitos
adultos
preocupados com
o ídolo...
Compreendo o
respeito que se
tenha a pessoas
pela admiração
que elas nos
provocam quando
realizam (e/ou
realizaram)
ações (obras)
que nos afetam
ou cativam em
profundidade por
qualquer razão
ou motivo
sensato. É
humano e um belo
tributo à
pessoa, que terá
seu nome
inscrito na
história de um
povo, de uma
comunidade, e,
no nosso caso,
nos registros
espíritas...
Mas a meu ver
isso basta. A
idolatria não dá
certo.
Cada um de nós
pode, de tempos
em tempos,
regredir através
de um padrão que
polariza uma
pessoa (no caso
uma
personalidade
pública),
tornando-se
prisioneiro da
arte de
idolatrar.
E o mínimo então
que temos a
fazer diante do
risco das
grandes forças
regressivas
dentro de nós,
muito ligadas
talvez ao antigo
hábito de
idolatrar
‘deuses ou
bezerro de
ouro’, é
procurar retomar
a consciência e
se ater à
prudente
observação do
poeta persa Rumi:
“cada homem veio
ao mundo para
realizar um
trabalho
particular e
esse é o seu
propósito”. Quer
dizer, mesmo
“ele” [o ídolo]
está fadado à
realização de um
trabalho
particular e é
um ser humano
como qualquer
outro.
Assim somos
gratos a
Francisco
Cândido Xavier
por sua fecunda
mediunidade
dedicada aos
livros, por seus
exemplos de
consolo,
caridade e
humildade.
Igualmente, sem
olvidar que,
segundo o
próprio Jung,
a coisa mais
desastrosa sobre
o inconsciente é
que ele é
inconsciente,
somos gratos aos
livros que
alargaram nosso
entendimento
sobre o mundo
interior,
rigorosamente
escritos pelo
competente
Espírito Joanna
de Ângelis, e
através da
mediunidade de
Divaldo Franco,
cuja obra de
assistência e de
divulgação do
Espiritismo pelo
mundo é vasta e
por si mesma
denuncia o belo
“trabalho
particular”
desse homem,
trabalhador de
Jesus.
Mas condutas
que, no meio
espírita,
extrapolem o
justo
reconhecimento
aos
trabalhadores
espíritas,
infelizmente
fazem aliança
com o equívoco
da idolatria. E
creio que nenhum
trabalhador
espírita sério e
mesmo Divaldo
Franco mereçam
ser alvos disso.
Com ênfase,
muito menos
Divaldo Franco
(1) e
no instante do
seu
crepúsculo...
Tenho certeza de
que ele, se
pudesse, apenas
pediria para ser
reconhecido como
um trabalhador
que de forma
luminosa
completou sua
tarefa e que
honra a Obra de
Jesus.
Então,
espíritas, por
que dar vazão à
síndrome do
culto à
personalidade e,
em consequência,
a esses excessos
que observamos
na mídia
espírita, quando
há registros de
reportagens ou
escritos de
qualquer
natureza
carregados de
expressões
superlativas
e/ou adulações?
A discrição e
humildade são
sempre sinais de
maturidade
espiritual e
essenciais para
um existir
equilibrado.
Como aprendizes
da desistência
da necessidade
egoica de
identificação/comparação,
isto é, a
atitude de estar
ligado àquele
que não sou,
mas do qual
dependo para ser
quem sou, o
culto à
personalidade é
sempre algo que
urge ser
retificado e
evitado,
principalmente
no contexto
espírita (e aqui
me refiro
especialmente
aos responsáveis
pela imprensa
espírita), pois
somos convocados
a procurar nos
precaver contra
maneiras
vicárias de
viver.
Sabemos que
Jesus é o modelo
de todas as
virtudes. E
quando em sua
passagem se
reconheceu
Mestre
(Professor),
recusou o
qualificativo de
bom,
afirmando que
somente o Pai
merecia esse
adjetivo. Uma
clara prova de
humildade e
também uma
atitude
veementemente
pedagógica
contra o culto à
personalidade.
Por fim, em
julho deste ano,
Papa Francisco
pediu a remoção
de uma estátua
que o retrata, e
que fora
colocada nos
jardins da
Catedral
Metropolitana de
Buenos Aires.
Ele, segundo o
jornal Clarín,
pediu a um padre
da capital
argentina:
“tirem a minha
estátua de
Buenos Aires,
sou contrário ao
culto à
personalidade”.
Assim como o
Deus espírita
não é um ídolo,
“mas aquela
realidade que,
como dizia
Descartes, está
na consciência
do homem como a
marca do artista
na sua obra”
(Herculano
Pires), tratemos
pessoas e
trabalhadores
espíritas
(2) como
nossos irmãos
(alguns mais
experientes e,
por isso,
bem-sucedidos em
suas tarefas e
projetos), mas
não como ídolos;
afinal, o único
modelo, e para
todos nós, é
Jesus, nosso
Mestre e
irmão mais velho,
como bem
esclareceu
Francisco de
Assis.
(1) E que fique
claro o objetivo
deste escrito: o
problema não é
“Divaldo
Franco”,
trabalhador
honesto e autor
de uma obra
dedicada à causa
do Cristo bela e
decente, mas sim
os “divaldianos”.
Meus professores
diziam sempre
que o problema
dificilmente
reside no “autor
da obra”, mas no
geral o “fator
de complicação”
está nos
seguidores
(pensemos aqui
em Marx e os
marxistas; em
Kant e os
kantianos; em
Lacan e os
lacanianos
etc.). Com
exceções, é
claro, muitos
seguidores
correm o risco
do fanatismo. E
isso diz
respeito também
a uma das
facetas da
idolatria, e que
pode mascarar-se
como ideologia
etc.
(2) O culto à
personalidade
espírita é um
desserviço à
divulgação da
Doutrina,
especialmente
com o advento da
Internet e mesmo
das redes
sociais.
Poderíamos então
evitar cultuar
espíritas,
estejam eles
vivos ou mortos
(vida além da
vida). Senão
corremos o
risco,
principalmente
no Brasil, de
observamos um
“Espiritismo”
polarizado nas
figuras de
“Chico e
Divaldo” e isso
não é saudável,
pois muitos
outros
contribuíram e
contribuem para
a difusão desta
Doutrina
luminosa. E
penso que nós
temos o dever de
analisar as
coisas de
maneira serena e
compreensiva,
mas é preciso
dar nosso
testemunho
sempre. E o
Espiritismo,
como uma
Doutrina
evolutiva, não
pode por
ingenuidade/imaturidade
anuir com a
idolatria.
Fiquemos, pois,
com um só
Modelo: Jesus.