O leitor Adelpho Barros, do
Rio de Janeiro, RJ, em carta
publicada nesta mesma
edição, enviou-nos a
seguinte pergunta:
Diante de terríveis
sofrimentos pelos quais
milhões de crianças
inocentes estão diária e
sistematicamente passando,
atribuir ao simples resgate
de vidas passadas não seria
uma doutrina cruel?
Em resposta, diremos que
agir como o leitor diz é,
antes de tudo, um equívoco,
um erro, uma tolice – bem
contrários, aliás, ao que
nos ensina o Espiritismo.
No capítulo V d´O
Evangelho segundo o
Espiritismo, Allan
Kardec escreveu:
Não há crer (...) que todo
sofrimento suportado neste
mundo denote a existência de
uma determinada falta.
Muitas vezes são simples
provas buscadas pelo
Espírito para concluir a sua
depuração e ativar o seu
progresso. Assim, a expiação
serve sempre de prova, mas
nem sempre a prova é uma
expiação. Provas e
expiações, todavia, são
sempre sinais de relativa
inferioridade, porquanto o
que é perfeito não precisa
ser provado.
Pode, pois, um Espírito
haver chegado a certo grau
de elevação e, nada
obstante, desejoso de
adiantar-se mais, solicitar
uma missão, uma tarefa a
executar, pela qual tanto
mais recompensado será, se
sair vitorioso, quanto mais
rude haja sido a luta. Tais
são, especialmente, essas
pessoas de instintos
naturalmente bons, de alma
elevada, de nobres
sentimentos inatos, que
parece nada de mau haverem
trazido de suas precedentes
existências e que sofrem,
com resignação toda cristã,
as maiores dores, somente
pedindo a Deus que as possam
suportar sem murmurar.
Pode-se, ao contrário,
considerar como expiações as
aflições que provocam
queixas e impelem o homem à
revolta contra Deus. Sem
dúvida, o sofrimento que não
provoca queixumes pode ser
uma expiação; mas, é indício
de que foi buscada
voluntariamente, antes que
imposta, e constitui prova
de forte resolução, o que é
sinal de progresso.
(O Evangelho segundo o
Espiritismo, capítulo V,
item 9.)
No capítulo VIII da 2ª Parte
do livro O Céu e o
Inferno, Kardec relata o
caso de Marcel, um menino de
cerca de 10 anos que se
encontrava internado num
hospital de província.
Totalmente contorcido, já
pela sua deformidade inata,
já pela doença, as pernas se
lhe torciam roçando pelo
pescoço, num tal estado de
magreza, que eram pele sobre
ossos. O corpo, uma chaga;
os sofrimentos, atrozes.
Marcel era oriundo de uma
família israelita. A
moléstia dominava aquele seu
organismo havia oito longos
anos, e no entanto
demonstrava o enfermo uma
candura, uma paciência e uma
resignação edificantes.
Um dia, o menino disse ao
médico que o assistia:
– Doutor, tenha a bondade de
me dar ainda uma vez aquelas
pílulas ultimamente
receitadas.
– Para quê? replicou-lhe o
médico, se já te ministrei o
suficiente, e maior
quantidade pode fazer-te
mal...
– É que eu sofro tanto, que
dificilmente posso orar a
Deus para que me dê forças,
pois não quero incomodar os
outros enfermos que aí
estão. Essas pílulas
fazem-me dormir e, ao menos
quando durmo, a ninguém
incomodo.
O fato basta para demonstrar
a grandeza daquela alma
encerrada num corpo informe.
Onde teria ido essa criança
haurir tais sentimentos?
Certo, não foi no meio em
que se educou; além disso,
na idade em que principiou a
sofrer, não possuía sequer o
raciocínio. Tais sentimentos
eram-lhe inatos; mas então
por que se via condenado ao
sofrimento, admitindo-se que
Deus houvesse
concomitantemente criado uma
alma assim tão nobre e
aquele mísero corpo
instrumento dos suplícios? É
preciso negar a bondade de
Deus, ou admitir a
anterioridade de causa; isto
é, a preexistência da alma e
a pluralidade das
existências.
Os últimos pensamentos
daquele menino, ao
desencarnar, foram para Deus
e para o caridoso médico que
o assistiu por longo tempo.
Decorrido algum tempo, foi
seu Espírito evocado na
Sociedade de Paris, onde deu
em 1863 a seguinte
comunicação:
"A vosso chamado, vim fazer
que a minha voz se estenda
para além deste círculo,
tocando todos os corações.
Oxalá seu eco se faça ouvir
na solidão, lembrando-lhes
que as agonias da Terra têm
por premissas as alegrias do
céu; que o martírio não é
mais do que a casca de um
fruto deleitável, dando
coragem e resignação.
"Essa voz lhes dirá que,
sobre o catre da miséria,
estão os enviados do Senhor,
cuja missão consiste na
exemplificação de que não há
dor insuperável, desde que
tenhamos o auxílio do
Onipotente e dos seus bons
Espíritos. Essa voz lhes
fará ouvir lamentações de
mistura com preces, para que
lhes compreendam a harmonia
piedosa, bem diferente da de
coros de lamentações
mescladas com blasfêmias.
"Um dos vossos bons
Espíritos, grande apóstolo
do Espiritismo, cedeu-me o
seu lugar por esta noite.
Por minha vez, também me
compete dizer algo sobre o
progresso da vossa Doutrina,
que deve auxiliar em sua
missão os que entre vós
encarnam para aprender a
sofrer. O Espiritismo será a
pedra de toque; os
padecentes terão o exemplo e
a palavra, e então as
imprecações se transformarão
em gritos de alegria e
lágrimas de contentamento."
(O Céu e o Inferno, 2ª
Parte, cap. VIII.)
Kardec perguntou-lhe: – Pelo
que afirmais, parece que os
vossos sofrimentos não eram
expiação de faltas
anteriores.
O Espírito de Marcel
respondeu:
"Não seriam uma expiação
direta, mas asseguro-vos que
todo sofrimento tem uma
causa justa. Aquele a quem
conhecestes tão mísero foi
belo, grande, rico e
adulado. Eu
tivera turiferários e
cortesãos, fora fútil e
orgulhoso. Anteriormente fui
bem culpado; reneguei
Deus, prejudiquei meu
semelhante, mas expiei
cruelmente, primeiro no
mundo espiritual e depois na
Terra. Os meus sofrimentos
de alguns anos apenas, nesta
última encarnação,
suportei-os eu anteriormente
por toda uma existência que
ralou pela extrema velhice.
Por meu arrependimento
reconquistei a graça do
Senhor, o qual me confiou
muitas missões, inclusive a
última, que bem conheceis. E
fui eu quem as solicitou,
para terminar a minha
depuração. Adeus, amigos;
tornarei algumas vezes. A
minha missão é de consolar,
e não de instruir. Há,
porém, aqui muitas pessoas
cujas feridas jazem ocultas,
e essas terão prazer com a
minha presença." (Marcel)
Essa mania – tão comum em
certos meios – de apontar
supostas causas para
determinados fatos deve ser
evitada, sobretudo pelas
pessoas que usam a tribuna
ou se valem da imprensa para
divulgar os ensinamentos
espíritas. Trata-se da
prática do conhecido
achismo, que somente
prejudica e em nada
beneficia a divulgação da
doutrina espírita.
Se não temos condições nem
conhecimento de causa para
formular uma explicação ou
dar uma resposta a
determinada pergunta, basta
dizer: Não sei; e,
conforme o caso: Não sei,
mas vou pesquisar e então
lhe darei a resposta.
Agir de forma diferente é
prestar um desserviço à
doutrina que abraçamos.
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