Continuamos
o estudo
metódico e sequencial do
clássico "No Invisível",
de Léon Denis, cujo
título no original
francês é
Dans l'Invisible.
Questões preliminares
A. É verdade que Kant, o
célebre autor da
Crítica da razão pura,
também atestou as
faculdades mediúnicas de
Emmanuel Swedenborg?
Sim. Numa carta enviada
à Srta. De Knobich, Kant
disse que a Sra.
Harteville, viúva do
embaixador alemão em
Estocolmo, obteve por
intermédio de Swedenborg
uma comunicação de seu
defunto marido, relativa
a um documento precioso
que não fora possível
encontrar, apesar de
repetidas buscas. O
documento estava
guardado numa gaveta
secreta, cuja existência
foi revelada à mulher
pelo falecido, e que só
ele conhecia.
(No Invisível, 3ª Parte.
XXVI - A mediunidade
gloriosa.)
B. Balzac foi médium?
Sim. Em “Ursule Mirouet”,
“Séraphita”, “Louis
Lambert”, “La Peau de
Chagrin”, Balzac tocou
em todos os problemas da
vida invisível, do
ocultismo e do
magnetismo. Todas essas
questões lhe eram
familiares e ele as
tratava com a
competência de
verdadeiro mestre, numa
época em que ainda eram
pouquíssimo conhecidas.
Era ele não somente um
profundo observador, mas
também um vidente na
mais elevada acepção do
termo.
(Obra citada, 3ª Parte.
XXVI - A mediunidade
gloriosa.)
C. Os mortos são
invisíveis, mas não são
ausentes. Quem disse
tais palavras?
Foi o poeta e escritor
francês Victor Hugo,
que, como se sabe,
acreditava na comunhão
com os mortos. São
conhecidas suas sessões
de Espiritismo em
Jersey, com a Sra. De
Girardin e Augusto
Vacquerie, descritas por
este em suas “Miettes de
l'Histoire”, como são
conhecidos os versos por
ele dirigidos ao
Espírito Molière e os
terrivelmente irônicos
que a “Sombra do
Sepulcro” lhe ditava com
o auxílio dos pés de
urna mesinha. Foi ao pé
do túmulo de Emília
Putron que ele proferiu
estas palavras que se
tornaram célebres: “Os
mortos são os
invisíveis, mas não são
os ausentes.”
(Obra citada, 3ª Parte.
XXVI - A mediunidade
gloriosa.)
Texto para leitura
1256. Jerônimo Cardan,
em “De Rerum Varietate”
(VIII, 3), felicitava-se
por ter os “dons” que
permitem cair em êxtase
à vontade, ver objetos
estranhos com os olhos
do espírito e ser
informado do futuro.
1257. Schiller declarou
que seus mais belos
pensamentos não eram de
sua própria criação;
ocorriam-lhe tão
rapidamente e com tal
energia que ele tinha
dificuldade em
apreendê-los com
suficiente presteza para
os transcrever.
1258. As faculdades
mediúnicas de Emmanuel
Swedenborg, o filósofo
sueco, são atestadas
pela célebre carta de
Kant à Srta. De Knobich.
Nessa missiva, o autor
da “Crítica da razão
pura” refere que a Sra.
Harteville, viúva do
embaixador alemão em
Estocolmo, obteve por
intermédio do Barão de
Swedenborg uma
comunicação de seu
defunto marido, relativa
a um documento precioso
que não fora possível
encontrar, apesar de
repetidas buscas; estava
guardado numa gaveta
secreta, cuja existência
foi revelada pelo
falecido, e que só ele
conhecia.
1259. O incêndio de
Estocolmo, visto e
descrito por Swedenborg
a trezentas milhas de
distância, é também uma
prova da pujança de suas
faculdades. Pode-se,
portanto, admitir que as
teorias por ele
formuladas acerca da
vida invisível não são
produto de sua
imaginação, mas lhe
foram inspiradas por
visões e revelações.
Quanto à forma sob a
qual ele as descreveu,
não se lhe deve ligar
mais que uma importância
relativa. Todos os
videntes cedem à
necessidade, em que se
encontram, de traduzir a
percepção que têm do
invisível com o auxílio
das formas, das imagens,
das expressões impostas
por sua educação e
familiares ao meio em
que vivem. É assim que,
conforme o tempo e as
latitudes, darão aos
habitantes do outro
mundo os nomes de
deuses, anjos, demônios,
gênios ou espíritos.
1260. Vejamos agora os
grandes escritores do
século XIX.
Chateaubriand e sua irmã
Lucília têm igual
direito a ser
considerados inspirados:
“A primeira inspiração
do poeta, sua primeira
musa – assegura-se – foi
sua irmã Lucília. Não há
a mínima dúvida de terem
os anos passados ao pé
dessa criatura sonhadora
e mística deixado um
sulco no coração do
moço, comovido, como o
recorda ele (Memórias de
Além-Túmulo), pelos
súbitos desalentos dessa
natureza consternada e
extática. Essa criatura
misteriosa, meio
sonâmbula, quase dotada
da dupla vista, como uma
habitante das ilhas
Hébridas, atravessou a
infância de
Chateaubriand como a
figura da dor.
Transmitiu sua poética
enfermidade moral a esse
irmão já tão
mortificado; é assim que
ela entra por metade em
todas as concepções do
poeta. Nesse coro de
brancas visões... por
toda parte a
encontraremos. Suas
estranhas predições não
lhe teriam feito
entrever o tipo de uma
Veleda?”
1261. Balzac, em “Ursule
Mirouet”, “Séraphita”,
“Louis Lambert”, “La
Peau de Chagrin” etc.,
tocou em todos os
problemas da vida
invisível, do ocultismo
e do magnetismo. Todas
essas questões lhe eram
familiares. Tratava-as
com a competência do
verdadeiro mestre, numa
época em que ainda eram
pouquíssimo conhecidas.
Era não somente um
profundo observador, mas
também um vidente na
mais elevada acepção do
termo.
1262. Edgard Quinet teve
as mesmas intuições
geniais, se acreditarmos
no Sr. Ledrain, crítico
literário extremamente
céptico, que assim se
exprimia num artigo do
“L'Éclair”, por ocasião
do seu centenário, em
1903:
“Ao mesmo tempo em que o
mundo visível o
extasiava, tinha ele os
olhos fixos no mundo
invisível. Foi um
fervoroso
espiritualista, como
todos os de sua geração,
como Lamartine, Victor
Hugo, Michelet.
Acreditava na ‘cidade
imortal das almas’, na
pátria de onde se não
pode ser banido por
homem algum. O sopro de
não-sei-quê país
supraterrestre em certo
momentos o envolve e
transporta como suspenso
em asas, aos espaços
infinitos. Lede seu
discurso ao pé do túmulo
de sua mãe, de seu genro
Georges Mourouzi; que
inflexões do Alto! É um
nabi (profeta), a
elevar-se acima de todos
os sacerdócios e a falar
em nome do Eterno, como
investido de uma missão
direta.”
1263. Lamartine, em
“Jocelin” e na “Chute d'un
Ange”, e Jean Reynaud,
em “Terre et Ciel”,
podem também ser
considerados inspirados.
Lamartine escrevia a
Arlès Dufour, para se
defender de uma censura
de Infantin:
“Eu tenho meu objetivo;
não o suspeita ele;
ninguém sabe qual seja,
exceto eu. Elevo-me em
sua direção, na medida
que o comporta o tempo e
não mais depressa. Esse
objetivo é impessoal e
puramente divino. Mas
tarde será desvendado.
Enquanto espero, como
quer ele que eu fale a
homens de carne e osso a
pura linguagem dos
Espíritos?”
1264. Michelet, em
certas ocasiões, parece
estar sob o império de
algum poder
desconhecido. Escutai-o
falando de sua “Histoire
de la Révolution”:
“Nunca, desde a minha
Donzela de Orléans,
havia eu sentido
semelhante lampejo do
Alto, uma tão luminosa
projeção do Céu...
Inolvidáveis dias; quem
sou eu para os haver
descrito? Ainda não sei,
nem saberei jamais, como
os pude reproduzir. A
inacreditável felicidade
de encontrar de novo
isso tão vivo, tão
intenso, depois de
sessenta anos, tinha-me
intumescido o peito de
uma alegria heroica.”
1265. Inspirado,
pregoeiro do invisível,
não é menos Victor Hugo:
“Deus se manifesta
através do pensamento do
homem – disse ele –; o
poeta é sacerdote”. Ele
acreditava na comunhão
com os mortos. São
conhecidas suas sessões
de Espiritismo em
Jersey, com a Sra. De
Girardin e Augusto
Vacquerie, descritas por
este em suas “Miettes de
l'Histoire”, como são
conhecidos os versos por
ele dirigidos ao
Espírito Molière e os
terrivelmente irônicos
que a “Sombra do
Sepulcro” lhe ditava com
o auxílio dos pés de
urna mesinha.
1266. Sem dúvida, a
propósito dos homens de
gênio, ele repele esse
“erro de todos os
tempos, de pretender-se
dar ao cérebro humano
auxiliares exteriores”.
Semelhante opinião –
Antrum adjuvat vatem –
melindra o seu orgulho.
Mas a si próprio se
contradirá ele em muitos
casos. Leiam-se, por
exemplo, estes seus
versos:
“Les morts sont des
vivants mêlés à nos
combats.
Et nous sentons passer
leurs flèches
invisibles.”
1267. Ao pé do túmulo de
Emília Putron, proferia
estas palavras que se
tornaram célebres: “Os
mortos são os
invisíveis, mas não são
os ausentes.” Na
poltrona dos
antepassados, que se via
na sala de jantar de
Hauteville-house,
inscrevera estas
palavras expressivas:
Absentes adsunt. Não
representa isso uma
constante evocação dos
que ele amara? Em todas
as suas obras se
encontram magníficas
invocações às “vozes da
sombra”, às “vozes do
abismo”, às “vozes do
espaço”.
1268. Certamente não
pretendemos que Victor
Hugo fosse médium no
sentido restrito do
vocábulo, como grande
número de pessoas, aptas
a obter fenômenos de
mínimo valor. Esse
pujante espírito não
podia ser restringido ao
papel secundário de
intérprete dos
pensamentos de outrem.
Queremos dizer que o
Além projetava sobre ele
suas radiações e
harmonias, as quais
fecundavam o seu gênio e
dilatavam-lhe até ao
infinito o horizonte do
pensamento.
1269. Em Henri Heine
essa colaboração do
invisível se traduz de
modo sensível. Eis o que
ele dizia no prefácio de
sua tragédia “W.
Radcliff”:
“Escrevi William
Radcliff em Berlim, sob
tílias, nos derradeiros
dias de 1821, enquanto o
Sol com seus
enlanguescidos raios
iluminava os tetos
cobertos de neve e as
árvores despojadas de
suas folhas. Escrevia
sem interrupção e sem
fazer emendas. E, à
medida que escrevia,
parecia-me ouvir por
cima da cabeça um como
que ruflar de asas.
Quando referi esse fato
aos meus amigos, jovens
poetas berlinenses, eles
se entreolharam de um
modo singular e me
declararam unanimemente
que, escrevendo, nada de
semelhante a isso haviam
jamais observado.”
1270. O que há de mais
notável é que essa
tragédia é inteiramente
espírita; o
desenvolvimento da ação
e seu desenlace
patenteiam a recíproca
influência do mundo
terrestre e do mundo dos
Espíritos.
1271. Muitos autores
célebres foram médiuns
sem o saber. Outros
tiveram disso
consciência. Paul Adam,
um dos mais fecundos
escritores
contemporâneos,
francamente o confessou:
“Fui um poderoso médium
escrevente. A Força que
me inspirava tinha tal
intensidade física, que
obrigava o lápis a subir
sozinho pelo declive do
papel, que eu inclinava
com a mão contrariamente
às leis do peso. Essa
Força não somente via no
passado, que eu
ignorava, como possuía a
presciência do futuro.
Suas predições eram de
surpreendente
realização, visto como,
nada, absolutamente
nada, me podia fazer
prevê-las.”
1272. Nem todos têm essa
franqueza, e preferem
deixar crer em seus
méritos pessoais, mas em
geral os grandes gênios
reconhecem de bom grado
que são dirigidos por
Inteligências
superiores. Encontra-se
em grande número de
escritores
contemporâneos essa
espécie de obsessão do
invisível. Hoffmann,
Bullwer-Lytton, Barbey
d'Aurevilly, Guy de
Maupassant etc. a
conheceram e exprimiram
em algumas de suas
obras. Participaram, em
graus diversos, dessa
comunhão das almas, de
que surge desvendado o
imenso mistério da vida
e do espaço.
1273. Como se vê, em
todos os domínios da
arte e do pensamento os
Céus vivificam a Terra.
Os grandes músicos, os
príncipes da harmonia,
parece terem estado mais
diretamente ainda sob a
influência da
mediunidade. Não somente
a precocidade de alguns,
como, por exemplo, de
Mozart, atesta o
princípio das
reencarnações, mas
também há, na vida dos
compositores célebres,
fenômenos absolutamente
mediúnicos, que seria
demasiado longo referir
aqui. Sua história é de
todos conhecida.
1274. Vimos atrás (no
cap. XIV) que Mozart e
Beethoven deram
testemunho das
influências
ultraterrenas que lhes
inspiravam o gênio.
Outro tanto se poderia
dizer de Haydn, Haendel,
Gluck etc. Chopin tinha
visões que, às vezes, o
aterravam. Suas mais
belas composições – sua
“Marcha Fúnebre”, seus
“Noturnos” – foram
escritos em completa
obscuridade. Toda a obra
de Wagner repousa sobre
um fundo de
espiritualidade. E isso
tanto é expresso nas
palavras de “Lohengrin”,
do “Tannhauser” e de “Parsifal”,
como em toda a própria
música.
1275. Os homens ilustres
têm sido, em sua maior
parte, médiuns
auditivos. Foi ao
despertar que, na
maioria das vezes,
compuseram suas obras.
Dante denominava a manhã
“a hora divina”, por ser
aquela em que se
exprimem as inspirações
da noite. Belíssimas
coisas haveria que dizer
acerca das revelações
noturnas feitas ao
gênio. Os antigos
conheciam o mistério
dessa iniciação. Diziam
eles: “O dia é dos
homens; a noite pertence
aos deuses.”
1276. Durante o sono as
almas superiores
remontam às esferas
sublimes; mergulham nas
irradiações do
pensamento divino, em um
oceano de sonoridade, de
harmoniosas vibrações;
aí descobrem os
princípios e as causas
da sinfonia eterna.
Francisco de Assis e
Nicolau de Tolentino
sentiram-se imersos no
êxtase, por terem
escutado um eco
longínquo, algumas notas
esparsas dos concertos
celestes, isto é, da
orquestra infinita das
esferas.
1277. O “Requiem” de
Mozart não tem outra
origem. Algumas horas
apenas antes de seu
desprendimento corporal,
o mestre, com a mão já
invadida pelo gelo da
morte, traçou esse hino
fúnebre, que foi a
derradeira manifestação
do seu gênio. Convinha
que o ilustre médium,
que durante toda a vida
percebera as vozes
melodiosas do Espaço,
expirasse numa última
harmonia e que sua alma
se exalasse num lamento
sobre-humano, de
inefáveis inflexões, de
que só são capazes os
grandes inspirados, ao
assomarem o limiar dos
mundos gloriosos.
1278. Rafael Sanzio
dizia que suas mais
belas obras lhe haviam
sido inspiradas e
apresentadas numa
espécie de visão.
Dannecker, escultor
alemão, afirmava que a
ideia do seu Cristo, uma
obra-prima, lhe tinha
sido comunicada por
inspiração, num sonho,
depois de a ter
inutilmente procurado em
suas horas de estudo.
1279. Alberto Durer
velava, uma noite, e
meditava. Queria pintar
os quatro evangelistas
e, tendo retocado
esboços, que não
exprimiam a seu gosto o
ideal que imaginava,
atirou os pincéis, abriu
a janela e pôs-se a
contemplar as estrelas.
A inspiração lhe veio
nesse momento de
tristeza; invocou os
seus modelos
espirituais. A Lua
projetava sua claridade
nos monumentos e nas
agulhas das catedrais de
Nuremberg. E disse ele:
“Permitistes a homens
transformar aí lascas de
pedra em construções
harmônicas, de
majestosas linhas.
Consenti-me transportar
para a tela esses santos
enviados que trago na
alma.”
1280. Ele viu então a
igreja de São Sebald
avermelhar-se em fogo, e
nuvens azuis formarem um
fundo em que se
desenhavam as imponentes
figuras dos quatro
evangelistas, e
exclamou: “Eis aí os
rostos que tenho
inutilmente procurado
fixar!” Não é esse um
caso de mediunidade, e
não vemos atualmente o
mesmo fato reproduzir-se
com Helena Smith, a
médium de Genebra?
1281. Muito havia que
escrever sobre a
intervenção das
inspirações superiores
no domínio da arte. Não
haveria também a
influência do Alto nesse
poder da oratória que
subleva e arrebata as
multidões, como o vento
subleva as ondas do
oceano? Ela parece
manifestar-se
principalmente nos
oradores de arrojados
surtos que, em certos
momentos, são como que
suspensos da Terra e
transportados em
possantes asas, ou ainda
nesses improvisadores,
de frases sugestivas e
sonora linguagem, cuja
palavra flui em
acelerados jorros, e que
Cícero denominava “a
torrente do discurso”.
(Continua no próximo
número.)