Em carta publicada nesta
mesma edição, uma leitora
radicada na Holanda diz ter
estranhado o que Kardec
escreveu na Revista Espírita
sobre o Islã. Segundo ela
diz, o Alcorão teria várias
passagens que induzem à
violência e ao ódio. E mais:
o que os jihadistas estão
fazendo agora não é nada que
não esteja incluso no
Alcorão.
É bom lembrar que o Antigo
Testamento contém igualmente
passagens em que a indução à
guerra e à violência é
bastante explícita. Aliás, a
chamada Terra da Promissão
não foi dada por Deus ao
povo conduzido por Moisés,
mas tomada à força, mediante
a agressão, a guerra e a
morte.
Não conhecemos o inteiro
teor do Alcorão, o livro
sagrado dos muçulmanos, mas
podemos deduzir que
determinadas passagens
mencionadas pela leitora
talvez se devam ao fato de
que se trata de uma obra
mediúnica que foi certamente
publicada sem o necessário
exame, algo tão importante
quando se trata da
publicação de obras
supostamente ditadas por
Espíritos.
Segundo Léon Denis, Maomé, o
fundador do Islã, redigiu o
Alcorão sob o ditado de um
Espírito, que adotou, para
se fazer escutar, o nome e a
aparência do anjo Gabriel.
(Cf. No Invisível, 3ª
Parte. XXVI - A mediunidade
gloriosa.)
Acerca das faculdades
mediúnicas de Maomé, assim
escreveu E. Bonnemère:
“Maomé caía de vez em quando
num estado que metia medo
aos que em torno se achavam.
Nesses momentos em que sua
personalidade lhe fugia e
ele se sentia subjugado por
uma vontade mais poderosa
que a sua, subtraía-se às
vistas estranhas. Os olhos,
desmesuradamente abertos, se
tornavam fixos e sem
expressão; imóvel, Maomé
parecia invadido por um
desfalecimento que nada
lograva dissipar. Em
seguida, pouco a pouco, a
inspiração fluía, e ele
escrevia, com vertiginosa
rapidez, o que vozes
misteriosas lhe ditavam”.
A natureza mediúnica do
Alcorão é também citada por
Kardec em dois longos
artigos publicados na
Revista Espírita de 1866,
dos quais extraímos as
informações seguintes.
No princípio a religião dos
árabes consistia na adoração
de um Deus único, a cuja
vontade o homem devia ser
completamente submisso. Essa
religião, que era a de
Abraão, chamava-se Islã e os
que a professavam diziam-se
muçulmanos, isto é,
submetidos à vontade de
Deus. Pouco a pouco, porém,
o puro Islã degenerou em
grosseira idolatria. Cada
tribo tinha seus deuses e
seus ídolos e isso foi a
causa de muitas guerras
entre elas.
Havia, contudo, em certas
tribos homens piedosos que
adoravam a Deus único e
repeliam o culto dos ídolos.
Chamados Hanyfas, eram eles
os verdadeiros muçulmanos,
que conservavam a fé pura do
Islã, embora fossem pouco
numerosos e com escassa
influência sobre as massas.
Nascido em Meca no dia 27 de
agosto de 570, no seio da
tribo dos Coraychitas, uma
das mais importantes da
Arábia, Maomé tinha o
espírito meditativo e
sonhador e um caráter de uma
solidez e maturidade tão
precoces, que seus
companheiros o designavam
pelo sobrenome de El-Amin,
“o homem seguro, o homem
fiel”.
Mesmo quando jovem e pobre,
convocavam-no às assembleias
da tribo para os negócios
mais importantes. Fazia
parte, então, de uma
associação formada entre as
principais famílias
coraychitas, cujo objetivo
era prevenir as desordens da
guerra, proteger os fracos e
lhes fazer justiça.
Até os 49 anos, quando
morreu sua esposa Khadidja,
sua vida pacífica nada
apresentara de saliente.
Apenas um fato o tirou um
instante da obscuridade. Foi
quando, estando Maomé com 35
anos, os coraychitas
resolveram reconstruir a
Caaba, que ameaçava ruína.
Sua intervenção numa
polêmica suscitada na época
satisfez a todos.
Aos 40 anos, no monte Hira,
teve ele uma visão durante o
sono: o anjo Gabriel lhe
apareceu mostrando-lhe um
livro que o aconselhou a
ler. Três vezes resistiu a
essa ordem e só para escapar
ao constrangimento sobre ele
exercido é que consentiu em
o ler. Ao despertar, disse
ter sentido “que um livro
tinha sido escrito em seu
coração”, frase
posteriormente tomada ao pé
da letra por seus
seguidores.
Maomé ficou profundamente
perturbado em sua visão e,
tendo voltado ao monte Hira,
presa da mais viva agitação,
julgou-se possuído por
Espíritos malignos e ia
precipitar-se do alto de um
rochedo quando uma voz se
fez ouvir: “Ó Maomé! tu és
enviado de Deus; eu sou o
anjo Gabriel!” Então,
levantando os olhos, viu o
anjo sob forma humana, que
desapareceu pouco a pouco no
horizonte. Essa nova visão
aumentou-lhe a perturbação,
embora a esposa se
esforçasse por acalmá-lo.
Varaka, primo dela, velho
afamado por sua sabedoria e
convertido ao Cristianismo,
lhe disse: “Se o que acabas
de dizer é verdade, teu
marido foi visitado pelo
grande Nâmous, que outrora
visitou Moisés; ele será
profeta deste povo”. A
missão de Maomé não foi,
pois, um cálculo premeditado
de sua parte, porque ele
mesmo só se convenceu depois
de nova aparição do anjo.
Nesse período, ele era
sujeito a desfalecimentos e
síncopes.
O Alcorão não é uma obra
escrita por Maomé com a
cabeça fria e de maneira
continuada, mas o registro
feito por seus amigos das
palavras que pronunciava
quando inspirado. Nesses
momentos, ele caía num
estado extraordinário e
apavorante; o suor
corria-lhe da fronte; os
olhos tornavam-se vermelhos;
ele soltava gemidos e a
crise terminava geralmente
por uma síncope que durava
mais ou menos tempo, estando
ele em casa, montado em seu
camelo ou em meio à
multidão. “A inspiração”,
diz Kardec, “era irregular e
instantânea, e ele não podia
prever o momento em que
seria tomado.” (Revista
Espírita de 1866, pág. 233.)
Mais tarde, quando tomou a
sério seu papel de
reformador, Maomé falava
mais com conhecimento de
causa e misturava às
inspirações o produto de
seus próprios pensamentos,
conforme os lugares e as
circunstâncias, acreditando,
talvez de boa-fé, falar em
nome de Deus. O fato, porém,
é que os fragmentos do que
ele pronunciara, destacados
e recolhidos em diversas
épocas, em número de 114,
formam no Alcorão as suratas
ou capítulos. Esparsos
durante sua vida, foram
reunidos após sua morte num
corpo oficial de doutrina,
pelos cuidados de Abu-Becr e
de Omar. Os mais diferentes
assuntos são aí tratados, e
apresentam uma tal confusão
e tão numerosas repetições,
que uma leitura seguida é
penosa e fastidiosa para
quem quer que não seja um
fiel.
As primeiras prédicas de
Maomé foram secretas durante
os primeiros dois anos, em
que ele se ligou a cerca de
50 adeptos, entre membros de
sua família e amigos.
Foi em Medina que Maomé
mandou construir a primeira
mesquita, em que trabalhou
com as próprias mãos e
organizou um culto regular.
Ali ele pregou pela primeira
vez em 623. Dois anos após
instalar-se em Medina, os
Coraychitas de Meca, unidos
a outras tribos hostis,
sitiaram a cidade. Maomé
teve de defender-se,
iniciando-se para ele um
período guerreiro que durou
dez anos e durante o qual se
mostrou um tático hábil.
Como a guerra era o estado
normal daqueles povos, que
só conheciam o direito da
força, ao chefe era
necessário o prestígio da
vitória para firmar sua
autoridade. A persuasão
exercia efeito reduzido
sobre aquela gente
turbulenta e uma grande
mansuetude teria sido tomada
como fraqueza. É por isso
que, mesmo sem querer, o
grande líder fez-se
guerreiro.
O sucesso de Maomé em tantas
batalhas foi realmente
notável, pois, com exceção
de um dos primeiros
combates, em 625, em que foi
ferido e os muçulmanos
derrotados, suas armas foram
sempre vitoriosas, a ponto
de em poucos anos submeter a
Arábia inteira à sua lei.
Maomé pôde, então, entrar
triunfalmente em Meca, após
dez anos de exílio, seguido
por perto de cem mil
peregrinos, realizando ali a
célebre peregrinação dita de
adeus, cujos ritos os
muçulmanos conservaram
escrupulosamente, porque no
mesmo ano, dois meses depois
de seu regresso a Medina, em
8 de junho de 632, ele
morreu.
Sobre Maomé e sua obra,
Kardec destaca os seguintes
pontos que achamos
importante transcrever:
-
É um equívoco,
disseminado pelos
adversários de Maomé,
apresentá-lo como um
indivíduo ambicioso,
sanguinário e cruel.
-
Também não se deve
torná-lo responsável
pelos excessos de seus
sucessores, que
pretenderam conquistar o
mundo para a fé
muçulmana de espada em
punho.
-
Maomé, mesmo em meio aos
seus sucessos, havendo
chegado ao topo de sua
glória, fechou-se no seu
papel de profeta, sem
jamais usurpar uma
autoridade temporal
despótica: não se fez
rei, nem potentado e
jamais se manchou, na
vida privada, por nenhum
ato de barbárie ou de
cupidez.
-
Se o papel de guerreiro
lhe foi uma necessidade
e se esse papel pode
escusá-lo de certos atos
políticos, há, no
entanto, alguns senões
que ele poderia ter
evitado, como a
consagração da poligamia
em sua religião, que foi
o seu mais grave erro,
pois isso opôs uma
barreira entre o
Islamismo e o mundo
civilizado.
-
Permitindo quatro
mulheres legítimas,
Maomé esqueceu que, para
que sua lei se tornasse
a da universalidade dos
homens, era preciso que
o sexo feminino fosse ao
menos quatro vezes mais
numeroso que o
masculino.
-
Apesar de suas
imperfeições, o
Islamismo não deixou de
ser um grande benefício
para a época em que
apareceu e para o país
onde surgiu, porque
fundou o culto da
unidade de Deus sobre as
ruínas da idolatria. A
religião cristã tinha
muitas sutilezas
metafísicas, por isso é
que todas as tentativas
para a implantar nessas
regiões tinham falhado.
-
Compreendendo os homens
de seu tempo, Maomé
deu-lhes uma religião
apropriada às suas
necessidades e ao seu
caráter.
-
Bastante simples, o
Islamismo prega a crença
num Deus único, que vê
nossas ações mais
secretas e que premia ou
castiga, numa outra
vida, os atos que
cometemos. O culto
islâmico consiste na
prece, repetida cinco
vezes por dia, nos
jejuns e mortificações
do mês de ramadã,
e em certas práticas,
como as abluções
diárias, a abstenção do
vinho, das bebidas
inebriantes e da carne
de certos animais.
-
A sexta-feira foi
adotada como o dia santo
da semana e Meca
indicada como o ponto
para o qual todo
muçulmano deve voltar-se
ao orar.
-
A atividade pública nas
mesquitas consiste em
preces em comum,
sermões, leitura e
explicação do Alcorão.
-
A proibição de
reproduzir pela pintura
ou escultura qualquer
ser vivo foi feita
visando a destruir a
idolatria e impedir que
ela se renovasse.
-
A peregrinação a Meca,
que todo fiel deve
realizar ao menos uma
vez na vida, é um ato
religioso, mas seu
objetivo na época era
aproximar, por um laço
fraternal, as diversas
tribos inimigas,
reunindo-as num mesmo
lugar consagrado.
-
A religião muçulmana
admite o Antigo
Testamento por inteiro,
até mesmo Jesus, que
reconheceu como profeta.
Segundo Maomé, Moisés e
Jesus foram enviados por
Deus para ensinar a
verdade aos homens. Como
os Dez Mandamentos, o
Evangelho é a palavra de
Deus, mas os cristãos
teriam alterado o seu
sentido.
-
No último discurso que
pronunciou em Meca,
pouco antes de sua
morte, Maomé aconselhou
seus seguidores a que
fossem humanos e justos,
guardando-se de cometer
injustiça, porque um dia
todos apareceremos
diante do Senhor e ele
pedirá contas de nossas
ações.
Das suratas selecionadas por
Kardec, eis algumas frases
marcantes que permitem
aquilatar o valor da
referida obra:
“Deus não exigirá de nós
senão conforme as nossas
forças.”
“Jamais digas: Farei isto
amanhã, sem acrescentar: se
for a vontade de Deus.”
“Deus exalta as boas obras,
mas pune rigorosamente o
celerado que trama
perfídias.”
“Nada no céu e na terra pode
opor-se às vontades do
Altíssimo.”
“Jesus é filho de Maria,
enviado do Altíssimo e seu
Verbo.”
“Crede em Deus e nos
apóstolos; mas não digais
que há uma trindade em Deus.
Ele é uno.”
“Os que sustentam a trindade
de Deus são blasfemos; há
apenas um só Deus.”
“Se te acusarem de
imposturas, responde-lhes:
Tenho por mim as minhas
obras; que as vossas falem
em vosso favor.”
“Fazei prece, dai esmolas; o
bem que fizerdes
encontrareis junto a Deus,
pois ele vê as vossas
ações.”
“Para ser justificado não
basta virar o rosto para o
Oriente e para o Ocidente; é
preciso ainda crer em Deus,
no juízo final, nos anjos,
no Alcorão, nos profetas. É
preciso pelo amor de Deus
socorrer o próximo, os
órfãos, os pobres, os
viajantes, os cativos e os
que demandam.”
“Se vosso devedor tem
dificuldade em vos pagar,
perdoai-lhe o tempo; ou se
quiserdes fazer melhor,
perdoai-lhe a dívida.”
“A vingança deve ser
proporcional à injúria; mas
o homem generoso que perdoa
tem sua recompensa
assegurada junto a Deus, que
odeia a violência.”
“Deus ama a beneficência.”
“Os jardins do Éden serão a
habitação dos justos.”
Em face de conselhos tão
sensatos e justos, alguém há
de perguntar: – Como podem
partidários do Islã valer-se
do Alcorão para cometer atos
de barbárie e terrorismo?
Não nos custa, porém,
refrescar a memória e
lembrar os desmandos da
Inquisição, que ao longo dos
séculos perseguiu e matou um
número incalculável de
pessoas, uma mancha
inapagável da Igreja de
Roma, que agiu de igual
forma, ao arrepio do que
recomenda o Evangelho do
reino.
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