MARCOS PAULO DE
OLIVEIRA SANTOS
mpoliv@bol.com.br
Taguatinga,
Distrito Federal
(Brasil)
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Livre-arbítrio e
responsabilidade
A liberdade
é um tema
candente no bojo
da humanidade.
Não se pretende,
aqui, realizar
um mergulho
integral ao
tema. Até
porque, há uma
alentada e mais
complexa
produção
literária.
Porém, não vamos
resvalar em
simplificações
impróprias.
Dosaremos o tema
à luz da
Doutrina
Espírita.
A ínclita obra
"O Livro dos
Espíritos", que
veio a lume a 18
de abril de
1857, destina um
capítulo
exclusivo para a
Liberdade.
Insculpido no
capítulo X, da
parte terceira,
da referida
obra, ela é
tratada como uma
lei universal.
Mas há um
detalhamento
maior acerca
disso por parte
dos Espíritos. É
o que veremos
adiante.
No subtítulo “liberdade
natural”, os
numes tutelares
dizem que a
liberdade
absoluta não
existe, uma vez
que necessitamos
uns dos outros
para uma
convivência e
subsistência.
Deste modo, a
liberdade
termina quando
inicia a do
outro. Desde
que se tenham
dois seres
humanos há uma
liberdade
relativa
colocada;
exceção feita
aos que optam
por se isolar.
E, como exemplo,
os Espíritos nos
dão a visão de
um eremita no
deserto.
No item
subsequente,
denominado “escravidão”,
os Espíritos
repudiam toda
forma de
subjugação dos
semelhantes. Ou
seja, eles são
totalmente
contrários à
escravidão. Nada
a justifica.
Contudo, porque
estamos em
processo
evolutivo, é
necessário
relativizar o
contexto. É fora
de dúvida que a
escravidão é um
mal. Obviamente
que cada um
responderá de
conformidade com
o seu grau de
conhecimento e,
consequentemente,
de
responsabilidade
sobre um
determinado
fato. Dizem
eles:
"O mal é sempre
o mal e não há
sofisma que faça
se torne boa uma
ação má. A
responsabilidade,
porém, do mal é
relativa aos
meios de que o
homem disponha
para
compreendê-lo.
Aquele que tira
proveito da lei
da escravidão é
sempre culpado
de violação da
lei da Natureza.
Mas, aí, como em
tudo, a
culpabilidade é
relativa.
Tendo-se a
escravidão
introduzido nos
costumes de
certos povos,
possível se
tornou que, de
boa-fé, o homem
se aproveitasse
dela como de uma
coisa que lhe
parecia natural.
Entretanto,
desde que mais
desenvolvida e,
sobretudo,
esclarecida
pelas luzes do
Cristianismo,
sua razão lhe
mostrou que o
escravo era um
seu igual
perante Deus,
nenhuma desculpa
mais ele tem"
(Resposta à
questão
830).
Neste sentido,
com o advento do
conhecimento,
dos ideais
libertários e
revolucionários,
sob a égide da
razão e da nova
concepção de
direitos
humanos, a
sociedade
moderna não
compactua mais
com qualquer
forma de
exploração do
ser humano.
No subtítulo “liberdade
de pensar”,
como o próprio
nome pode
sugerir, o ser
humano é livre
de qualquer
amarra. Ou seja,
ele é
absolutamente
livre pelo
pensamento e
somente a Deus
deve
satisfações.
Deus, na sua
Onipresença e
infinita
sabedoria e
bondade, é o
Único que pode
fazer qualquer
tipo de
julgamento,
analisar o
contexto, a
intenção e a
natureza daquele
pensamento etc.
Na “liberdade
de consciência”,
os Espíritos
esclarecem que
“A consciência é
um pensamento
íntimo, que
pertence ao
homem, como
todos os outros
pensamentos”
(Resposta à
questão 835).
Portanto,
somente a Deus
cabe qualquer
tipo de
julgamento.
Estabelecem
ainda que não se
podem aviltar as
consciências,
seja em que
sentido for. Do
contrário, isso
seria faltar com
a caridade e o
respeito que
caracterizam o
homem de bem.
Quanto ao “livre-arbítrio”,
o ser humano
também goza de
liberdade para
as próprias
ações. Ou seja,
é livre para
arbitrar,
escolher,
decidir sobre o
seu próprio
destino. É óbvio
que toda escolha
importa numa
responsabilização
do autor, seja
positiva ou
negativa. “Sem o
livre-arbítrio,
o homem seria
máquina”
(Resposta à
questão 843).
O livre-arbítrio
sofre influência
da matéria (do
corpo, do meio
social em que
está inserido o
ser humano
etc.), mas isso
não é escusa
para as ações
negativas que
porventura venha
tomar.
O livre-arbítrio
também está
relacionado com
o conhecimento
que se tem. Em
outras palavras,
uma criança não
tem o mesmo grau
de
responsabilização
de um adulto;
bem como o ser
humano
considerado
“selvagem” ou
“primitivo” não
pode ser
imputado da
mesma forma que
um ser humano
que goza dos
privilégios da
civilização, da
modernidade, do
conhecimento
formal...
“É inegável que
sobre o Espírito
exerce
influência a
matéria, que
pode
embaraçar-lhe as
manifestações.
Daí vem que, nos
mundos onde os
corpos são menos
materiais do que
na Terra, as
faculdades se
desdobram mais
livremente.
Porém, o
instrumento não
dá a faculdade.
Além disso,
cumpre se
distingam as
faculdades
morais das
intelectuais.
Tendo um homem o
instinto do
assassínio, seu
próprio Espírito
é,
indubitavelmente,
quem possui esse
instinto e quem
lho dá; não são
seus órgãos que
lho dão.
Semelhante ao
bruto, e ainda
pior do que
este, se torna
aquele que
nulifica o seu
pensamento, para
só se ocupar com
a matéria, pois
que não cuida
mais de se
premunir contra
o mal. Nisto é
que incorre em
falta, porquanto
assim procede
por vontade
sua.”
(Resposta à
questão 846)
Quando, porém, o
ser humano vê as
suas faculdades
limitadas por
quaisquer
motivos e ele
não pode
concatenar seu
pensamento e,
por conseguinte,
escolher o que
deseja, isso é a
reação de uma
ação malograda
de uma
existência
transata.
“Já não é senhor
do seu
pensamento
aquele cuja
inteligência se
ache turbada por
uma causa
qualquer e,
desde então, já
não tem
liberdade. Essa
aberração
constitui muitas
vezes uma
punição para o
Espírito que,
porventura,
tenha sido,
noutra
existência,
fútil e
orgulhoso, ou
tenha feito mau
uso de suas
faculdades. Pode
esse Espírito,
em tal caso,
renascer no
corpo de um
idiota, como o
déspota no de um
escravo e o mau
rico no de um
mendigo. O
Espírito, porém,
sofre por efeito
desse
constrangimento,
de que tem
perfeita
consciência.
Está aí a ação
da matéria.”
(Resposta à
questão 847)
Nem mesmo as
ações
decorrentes da
embriaguez são
escusas para o
ser humano, uma
vez que ele
mesmo teve
ensejo de
escolher...
“848. Servirá de
escusa aos atos
reprováveis o
ser devida à
embriaguez a
aberração das
faculdades
intelectuais?
– Não,
porque foi
voluntariamente
que o ébrio se
privou da sua
razão, para
satisfazer a
paixões brutais.
Em vez de uma
falta, comete
duas.”
Assim, Allan
Kardec encerra o
referido
capítulo,
afirmando:
“A questão do
livre-arbítrio
se pode resumir
assim: O homem
não é fatalmente
levado ao mal;
os atos que
pratica não
foram
previamente
determinados; os
crimes que
comete não
resultam de uma
sentença do
destino. Ele
pode, por prova
e por expiação,
escolher uma
existência em
que seja
arrastado ao
crime, quer pelo
meio onde se
ache colocado,
quer pelas
circunstâncias
que sobrevenham,
mas será sempre
livre de agir ou
não agir. Assim,
o livre-arbítrio
existe para ele,
quando no estado
de Espírito, ao
fazer a escolha
da existência e
das provas e,
como encarnado,
na faculdade de
ceder ou de
resistir aos
arrastamentos a
que todos nos
temos
voluntariamente
submetido. Cabe
à educação
combater essas
más tendências”
(Item 872).
Nossas
considerações
não esgotam em
hipótese alguma
os debates
acerca da
liberdade. Mas
contribuem para
o início das
reflexões sobre
esta lei tão
especial. O
capítulo aqui
evocado é
bastante
profícuo e
merece reflexão
por parte dos
confrades
espíritas.