EUGÊNIA PICKINA
eugeniapickina@gmail.com
Campinas, SP
(Brasil)
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Des-aprender o
bullying
e educar para a
paz!
Sabemos (desde
sempre) que as
crianças sempre
atacaram umas às
outras, e os
mais fracos
viraram
vítimas.
Recordo com
muita nitidez os
dias redondos do
jardim de
infância, quando
era molestada
diariamente por
dois colegas de
sala, primos,
que insistiam em
puxar minhas
tranças, agredir
o precioso
material
escolar, meus
adoráveis lápis
(escassos) e, no
recreio, me
ameaçavam bater
e maltratar.
Foram meses de
igual jeito e
nunca contei
nada à minha
mãe.
Simplesmente na
minha meninice,
ou talvez já
motivada pelo
meu padrão
introspectivo de
ser,
considerava
aquele terrível
estado de coisas
como algo que
pertencesse à
minha natural
condição escolar
e fui seguindo
aquele destino
opressivo
comprido até um
dia, véspera de
um feriado –
apenas tenho
esse registro
consciente –,
quando os dois
meninos me
empurraram
contra uma
carteira, no
fundo da sala de
aula, e em
seguida,
assustados,
correram; e eu,
ferida no
joelho,
intimidada pelo
sangue que
corria vermelho,
pus a boca no
mundo... Depois
desse evento,
Milton e Sandro,
valentões e
brigões, me
esqueceram. Mas
eu (a criança
que tinha quatro
anos), não...
Não há dúvida.
Bullying
é uma das formas
de violência que
mais cresce no
mundo. Pode
ocorrer em
qualquer
contexto social:
escolas,
universidades,
famílias,
vizinhanças,
locais de
trabalho etc. E
o que à primeira
vista parece
um simples
apelido
inofensivo
pode,
repetidamente,
afetar emocional
e fisicamente o
alvo da ofensa –
a vítima.
E, no caso do
bullying
escolar, a
independer de
queda de
rendimento
escolar,
crianças e
adolescentes que
passam por
humilhações
racistas,
difamatórias ou
separatistas
podem
desenvolver
doenças
psicossomáticas,
podem sofrer
traumas que por
sua vez
influenciarão
negativamente
traços da
personalidade,
gerando
consequências
que afetarão
diretamente sua
vida de relação,
pois muito do
seu tempo de
infância foi
tristeza,
sofrimento e
lamento. Basta o
claro indício
que hoje e cada
vez mais cedo as
crianças estão
na escola,
enquanto pai,
mãe, e/ou o
adulto que as
educa, tornam-se
presenças cada
vez mais
rarefeitas.
E embora
especialistas
saibam pouco
ainda sobre o
bullying
escolar por
aqui, no País,
pois este
fenômeno começou
a ser estudado
há cerca de 30
anos na Europa,
e há menos de
dez no Brasil,
ele ocorre
sempre entre
iguais e na
verdade se trata
de um ataque à
autoestima,
ganhando
visibilidade em
situações
variadíssimas,
tais como
colocar
apelidos,
ofender,
humilhar,
perseguir,
discriminar,
excluir, isolar,
intimidar,
aterrorizar,
amedrontar,
tiranizar,
dominar,
agredir, chutar,
bater, empurrar,
ferir, roubar,
quebrar
pertences etc.
Além disso, se o
limite entre o
bullying
e as
brincadeiras
maldosas típicas
de algumas
crianças é
muitas vezes
difícil de ser
identificado, o
ato repetido
de uma agressão
ou
constrangimento
contra um
determinado
colega pode,
sim, ser
considerado
bullying,
pois o fenômeno
envolve uma
intenção de
dominação de um
autor sobre o
outro – a
criança (ou
adolescente) que
recebe a carga
agressiva e
sofre (vítima).
Para pôr fim ao
sofrimento e
antes que cause
um mal mais
profundo, há
sinais que são
“pistas”
significativas
de que uma
criança passou a
ser molestada no
ambiente
escolar. Se
antes gostava de
ir à escola
começa a arrumar
pretextos, como
dores de cabeça,
estômago etc.,
para permanecer
segura em casa.
Além disso, pode
se tornar
retraída,
quieta; se for
menino, pode
aparecer em casa
com escoriações
ou marcas roxas;
algumas crianças
perdem o apetite
e muitas passam
a ter pesadelos,
apresentando
também quadros
de tristeza e
introspecção.
Por isso, e
segundo estudos
e práticas
terapêuticas,
observamos que
as vítimas de
bullying no
geral
desenvolvem
depressão,
pânico,
distúrbios
psicossomáticos,
temendo retornar
à escola. A
fobia escolar
geralmente tem
como causa algum
tipo dessa
violência.
Infelizmente,
ainda, muitas
crianças que
sofrem com esses
constrangimentos
reiterados
(combinados a
contextos
familiares
difíceis, por
exemplo) poderão
não superar os
traumas sofridos
na escola e,
desse modo,
poderão crescer
com
baixa
autoestima. Isso
prejudica o
desenvolvimento
de suas
potencialidades
e afeta
negativamente a
qualidade de
seus
relacionamentos
no futuro, a
fruição de suas
potencialidades
e mesmo a
alegria de
dispor do
direito de
participar da
vida e ser
feliz.
Assim, se há
suspeita de que
a criança (ou
adolescente)
esteja sofrendo
algum tipo de
violência na
escola, o melhor
é falar com ela.
Conversar com
calma, em um
diálogo franco,
deixando-a
confortável e à
vontade. Anotar
os fatos de
forma objetiva.
Na sequência,
após verificar o
regimento
interno escolar
para saber se
existe um
procedimento
para reclamações
sobre os casos
de bullying,
procurar a
escola para
exercer o justo
direito de
proteger a
criança. Mas
isso implica
agir com
educação e
respeito, pois
gritos e ameaças
de processos
judiciais contra
tudo e todos
apenas
tornam a vítima
de bullying
mais desamparada.
Todavia, os pais
devem ficar
atentos a
qualquer tipo de
alteração de
comportamento da
criança.
Sim... Tantas
coisas
divertidas a
gente pode fazer
na infância. O
mundo, ali, é
para ser
brincado. Jogos
de palavras,
gizes, bola,
gato e bicho do
mato, histórias
de fadas,
princesas,
amarelinha, boca
de forno,
forno!
E tão feia e
obsoleta é essa
atitude bruta,
aprendida e
repetida, por
parte do
agressor,
comumente
criança
antipática,
arrogante, mal
amada, na
verdade, pois
muitos estudos
avisam que esse
ser humano em
desenvolvimento,
um bully –
“valentão,
brigão”, vem de
família
disfuncional,
com pobre
relacionamento
afetivo entre
seus membros,
vivendo,
portanto, em um
ambiente no qual
o exemplo
repetido é o uso
nocivo do
comportamento
explosivo de um
adulto,
igualmente mal
amado, que teima
em dizer ao
menino que
brinquedo,
infância, não
produz
alegria...
Para uma cultura
da paz, insisto,
é preciso
resgatar então o
“valentão”
e ajudá-lo a
recuperar sua
natureza de
príncipe,
quebrar o
feitiço e assim
des-ensinar ao
sapo sua
realidade sapal
e para que ele
volte à sua
natureza real e
assim possa
desfrutar da
infância,
brincar para
simplesmente
crescer e
aprender a fazer
amigos, pois a
cidade tem o
destino comum
mantido pela
amizade.
Uma educação
para a paz. E o
pai do bully,
também valentão
– ou talvez
um infeliz
bruxo? –,
pode ser avisado
também que
possui o íntegro
e feliz direito
a reinventar-se
para resgatar,
presa na sua
natureza real, a
paz que ajuda a
gente viver
sereno e sem
tirania, mesmo
como gente
grande...
Notas:
Bullying
escolar é uma
situação que se
caracteriza por
agressões
intencionais,
verbais ou
físicas, feitas
de maneira
repetitiva, por
um ou mais
alunos contra um
ou mais colegas.
O termo
bullying tem
origem na
palavra inglesa
“bully”,
que significa
“valentão”,
“brigão”. Mesmo
sem uma palavra
em português, é
entendido como
ameaça, tirania,
opressão,
humilhação e
maltrato.
Na Espanha a
incidência de
bullying se
situa em torno
de 15% a 20% nas
pessoas em idade
escolar, com
índices
semelhantes em
Portugal e na
União Europeia.
Segundo alguns
autores o
bullying
pode se
manifestar de
quatro formas
diferentes:
verbal, físico,
psicológico e
sexual. Os
meninos estão
mais envolvidos
com o
bullying, e
com uma
frequência muito
maior – e tanto
como autores,
quanto como
alvos. Já entre
as meninas,
embora com menor
frequência, o
bullying
ocorre e se
caracteriza,
principalmente,
como prática de
exclusão ou
difamação.
Há três tipos de
pessoas
envolvidas na
situação de
bullying: o
espectador
(presencia o
constrangimento
e não
interfere);
agressor e a
vítima.
Há profissionais
da aérea da
psicologia que
insistem em
aplicar o
conceito de
bullying na
relação de pais
e filhos e entre
professor e
aluno.
Discordamos
porque entre
pais e filhos ou
entre
professores e
alunos há uma
relação que se
funda na
hierarquia,
mesmo nos
contextos
democráticos. O
conceito de
bullying
exige, portanto,
para ser
configurado, a
violência que se
dá entre iguais
(por isso, entre
colegas, por
exemplo).