MARCUS
VINICIUS DE AZEVEDO
BRAGA
acervobraga@gmail.com
Rio de Janeiro, RJ (Brasil)
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A semente do
homem de bem
Certa feita, em
uma reunião de
início de ano de
um trabalho
assistencial que
contava com
quase trinta
anos,
determinado
dirigente, que
labuta desde o
início naquela
seara, comentou
em tom
avaliativo que o
trabalho de
evangelização
infantil rendera
frutos naquele
longo período,
pois entre
outros sinais,
verificava-se
que os meninos
que frequentavam
aquela casa
espírita,
incrustada em
uma comunidade
carente, repleto
de tensões e
pressões, não
tinham bandeando
para o caminho
da
criminalidade.
Difícil
avaliarmos os
frutos dos
trabalhos
espíritas nas
plagas
assistenciais,
com pessoas que
se abeiram ali
muitas vezes à
busca apenas da
cesta básica que
será pega em
outra
denominação no
dia seguinte...
Difícil, pois
temos carência
de material
didático voltado
a pessoas de
baixa
escolaridade e
de produção
literária que
nos ampare a
lidar com
famílias em
condições de
vulnerabilidade,
às vezes
refletidas em
desagregações
familiares com o
alcoolismo e
outros problemas
comuns a
comunidades
carentes, em
especial na
cidade do Rio de
Janeiro, e suas
mazelas já
conhecidas.
Ainda que muito
frequente na
prática, os
trabalhos
assistenciais
não gozam de uma
discussão
robusta e de
produção que os
permitam avançar
sobre os
paradigmas
vigentes, com
raras e
valorosas
colaborações que
surgem por aí...
Essa falta de
discussão, por
vezes, nos leva
ao desânimo e à
valorização do
“bem
quantitativo”,
refletido na
soma de
benefícios
distribuídos, de
forma
descontextualizada,
social e
espiritualmente.
A evangelização
infantil, comum
em trabalhos de
natureza
assistencial,
necessita de uma
discussão
profunda sobre
currículo,
pressupostos,
abordagens e
visões
pedagógicas que
percebam ali, em
sala de aula,
Espíritos, em
verdade imersos
em um ambiente
de carência
material, mas
Espíritos
sequiosos de
conhecimento que
os console,
liberte e
ampare.
Nesse contexto,
temos, sim,
objetivos
programáticos de
melhoria a um
longuíssimo
prazo daquele
grupo humano,
ainda que nos
vejamos,
ocasionalmente,
frustrados pelas
forças presentes
na capacidade de
perpetuação de
hábitos tristes,
como a gravidez
precoce,
constantes a
cada geração, em
um ciclo de
difícil
rompimento. Mas
a feliz fala
desse amigo
dirigente nos
aponta para
interessantes
indicadores de
nossos trabalhos
espíritas no
campo da
infância, na
percepção da
importância de
plantarmos as
sementes do
homem de bem, em
qualquer espaço,
seja ele carente
ou não no campo
material. E o
homem de bem se
fará percebido
no futuro!
Jesus na
parábola do
semeador fala
que um homem
saiu a semear, a
espalhar
sementes por
diversos
terrenos, que,
diante das
diversidades,
buscavam
crescer. Todas
falharam, mas a
que
“caiu em boa
terra, deu boa
colheita, a cem,
sessenta e
trinta por um”,
indicando-nos
uma profunda
reflexão que
pode nos servir
ao
direcionamento
das finalidades
de nossos
trabalhos
assistenciais.
Uma reflexão do
nosso papel de
semeadores e do
crescimento no
ato de semear.
Amparamos
aquelas famílias
materialmente
pela bolsa, pelo
material
escolar, pelas
roupas...
Buscamos
instrumentalizá-las
a caminhar
sozinhas pelas
oficinas, que
possam com
dignidade
permitir a elas
ganhar algum
dinheirinho...
Apoiamos as suas
iniciativas no
campo escolar,
pretendendo que
a nova geração
transcenda a
miséria material
da anterior. As
abordagens
assistenciais
clássicas aqui
estampadas
cuidam do
emergencial, da
impossibilidade
de se falar de
Jesus para quem
tem fome, mas
necessitam de um
complemento, de
um pão mais
sublime, que
emancipe
espiritualmente
aquelas pessoas,
na reflexão de
sua condição de
Espíritos
encarnados, na
chamada
resignação
produtiva, que
converte dor em
amor.
Insta
desenvolver, com
igual força, as
nossas
atividades
doutrinárias nos
trabalhos
assistenciais, a
evangelização, a
palestra, o
estudo, que para
além de um
caráter
proselitista e
catequizador,
visem, por meio
dessa interação,
diria
“filosófica",
trabalhar
valores morais,
pela ótica da
imortalidade da
alma e da
reencarnação,
levando aos
chamados,
erroneamente a
meu ver de
assistidos, uma
reflexão que os
permitam adotar
disposições
renovadas,
diante das
provas da
carência
material e dos
desafios morais
da vida
encarnada.
A atividade de
discussão, de
interação
intelectual-moral
na área
assistencial,
tem um caráter
emancipador, que
liberta aqueles
Espíritos de
armadilhas
morais,
indicando o
caminho do
estudo, do
trabalho e do
esforço na
superação de
suas
dificuldades e
apontando que a
dor é uma mola
para despertar o
nosso amor. E
nessa
construção, nós,
ditos
trabalhadores,
amadurecemos,
pois a falação
bonita e vazia
não encontra eco
diante dessas
dores, nos
fazendo
amadurecer na
vivência do
Cristo.
A parte boa do
trabalho atinge
a todos os
atores, como
oportunidade
bendita de
amadurecimento e
reflexão,
representando
muito mais do
que ir lá
ensinar o
evangelho para
as pessoas
pobres. O pão
material que dá
o peixe, a
oficina que dá a
vara e ensina a
pescar são polos
fundamentais da
equação da
assistência...
Entretanto, a
discussão
doutrinária, o
fortalecimento
filosófico,
lastreado pelos
pilares da
doutrina
espírita, traz a
reflexão que faz
a pessoa
entender o
peixe, a vara, o
rio e os seus
braços,
convertendo
todos em
pescadores de
almas, como
disse Jesus. Não
queremos fazer
daquelas pessoas
espíritas no
sentido de que
elas leiam
avidamente as
obras básicas e
tenham um
conhecimento
formal.
Necessitamos de
uma abordagem
pedagógica que
mostre esse
conhecimento
espírita na
prática, no
mundo concreto,
sentido, como
forma de
espalhar as
sementes em cada
coração,
tornando-os sim,
eles e nós,
pessoas
melhores, fim
maior.
Essa abordagem
robustece a
bolsa e a
oficina,
contribuindo
para um caráter
consolador,
diante da dor, é
verdade, mas
também de
superação,
fazendo que a
pessoa venha à
busca do
alimento e saia
com a sua alma
revigorada, com
novos
horizontes. Para
isso, precisamos
nos adaptar...
Nossas
palestras,
nossos estudos,
nossos
currículos, para
que vejam nesse
contexto a
melhor forma de
passar o
Espiritismo e
todo seu valor
transformador de
atitudes, em sua
expressão mais
simples, nesses
trabalhos, em
especial na
infância.
A reencarnação
liberta, pois
mostra a nossa
situação como
transitória e
que pode mudar
pelo esforço
cotidiano, na
busca de
construir o
homem de bem
naquele espírito
imortal que hoje
enverga uma
roupagem de
carência. O
livre-arbítrio,
a prática de bem
são valores
espíritas que
possibilitam
construir uma
vida melhor, em
um sentido
amplo. Tesouros
morais que podem
e devem
colaborar na
superação de
situações de
carência
material,
fortalecendo
aqueles
Espíritos na sua
prova, buscando
a senda do bem.
Fica a reflexão
para os que
trabalham na
seara espírita
na evangelização
de crianças que
padecem de
miséria material
e que por esta
são
influenciadas,
sim, no aspecto
moral, podendo
essa dor servir
de trampolim que
as impulsione ou
de buraco que as
afunde. Para
além do peixe
que mata a fome,
demandamos ouvir
o convite de
Jesus no chamado
milagre dos
peixes, para
falar de pães e
peixes que se
multiplicam e
aplacam a fome
do espírito.