EUGÊNIA PICKINA
eugeniapickina@gmail.com
Indaiatuba, SP
(Brasil)
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Uma resolução:
licença
para ser
infeliz
É o Mistério
quem aciona os
testemunhos que
nos inspiram,
pois estão eles
penetrados pelo
suor e pela
alegria,
cheirando ora a
tristeza, ora
impregnados de
rosa vermelha,
tingidas as
pétalas por
essas emoções
cálidas que
experimentam
homens e
mulheres dentro
e fora de casa.
Refulge de
súbito um
testemunho
furta-cor como
um corpo,
distinto de dia
e de noite, com
manchas de medo,
paisagens de
lições,
angústias e
declarações de
sonhos, um
perene
passado-e-presente
– a humanidade
que se
reconstrói
indefinidamente
diante de
incertezas e
amor enquanto a
lua no céu
brilha
infinita.
Sempre entendi a
felicidade como
algo biográfico,
contudo, um bem
a ser
conquistado
árdua e
perenemente,
dada a sua
natureza
furta-cor,
fugidia (logo um
conceito
fortemente
relacionado às
utopias).
Não adiro, desse
modo, à crença
atual do
disseminado
“direito à
felicidade” e,
aqui, como algo
que deve ser
desfrutado por
todos os mortais
a qualquer
custo, o que,
entre outras
coisas funestas,
está a assegurar
principalmente o
empobrecimento
da nossa
subjetividade e
a
medicalização
do sofrimento
cotidiano.
Acho estranho
que as pessoas
queiram viver
apartadas de
conflitos,
angústias,
ansiedades,
frustrações, os
meios legítimos
que a existência
oferece para o
aperfeiçoamento
da nossa
condição humana,
e, ainda, desde
que estejamos
abertos a
estados de
dúvidas e
perguntas, como
um processo de
subjetivação
interminável.
Estes dias,
disse a um
amigo: você
tem o pleno
direito de
sofrer, de se
sentir mal,
frustrado,
magoado e cheio
de raiva. É
normal que você
sofra e se sinta
péssimo porque
faz apenas dois
meses que sua
mulher abandonou
seus filhos e
sua casa.
Insisto.
Podemos, sim,
nos permitir
licença para
experimentar
tristeza,
desânimo,
saudade,
decepção,
estados íntimos
indistintos que
nos dominam
eventualmente,
pois o planeta
não é a
Disneylândia.
Melhor prestar
atenção, estamos
imersos em uma
cultura do
aprendizado,
ainda que
queiram, através
de um modo
contemporâneo
(equivocado) de
conceber
felicidade, nos
incentivar a
permanecer
atolados em uma
cultura do
esquecimento,
cujo paradigma
anti-humano se
põe avesso à
necessidade
(humana) de
experimentar
lições e
construir
lembranças.
Para 2015
podemos, então,
nos filiar ao
singelo direito
à infelicidade,
incorporando a
resolução de
respeitar o
quinhão de
sombra que nos
impregna às
vezes quando
somos visitados
por sofrimentos
que poderão, se
enfrentados de
coração/mente
abertos,
instruir
recursos para
prover uma
existência com
mais significado
e valor.
Certamente,
estar disponível
ao direito de
ser infeliz
ajuda a pessoa a
resistir à
pressão da
pressa da nossa
época, que cobra
soluções
imediatas,
muitas vezes
impeditivas da
oportunidade
autêntica de
aproveitar o dia
de estar neste
mundo de cor
cambiante, porém
a depender
(também) do
observador e de
suas composições
reflexivas...
*Visite, quando
puder,
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