CHRISTINA NUNES
meridius@superig.com.br
Rio de Janeiro,
RJ (Brasil)
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Tocar piano de
ouvido...
Nalgum lugar
ouvi dizer que
Luiz Gonzaga, um
dos nossos
mestres da
música
nordestina,
desconhecia
teoria musical
e, perguntado
certa vez, se
referiu às notas
grafadas como
“ah, aqueles
desenhos”. Não
sei se é
verdade, mas não
me
surpreenderia.
Quem possui o
dom musical de
nascença,
aqueles que
parecem ter
vindo a este
mundo
predestinados a
contribuir no
universo das
artes musicais
com genialidade,
muito certamente
denotam um
conhecimento
prévio de tudo,
e que, de
maneira
estranha,
invertem a ordem
lógica das
coisas. E faz o
conhecimento
teórico musical,
nestes casos,
ocupar lugar
diverso nas
prioridades de
desempenho -
senão de maneira
integral, para
não parecer aqui
absurda na minha
assertiva, ao
menos em relação
àqueles
rudimentos que
todo estudante
sério de música
não ousa
desconhecer.
Todavia, numa
sociedade
orientada cada
vez mais pelo
avanço
científico e
tecnológico, que
quer manter tudo
sob controle,
não é de admirar
a não valoração
e aceitação,
pelos meios
acadêmicos, da
existência
destes “dons”.
Mas são eles
que, de modo
indiscutível,
nos trazem, de
tempos em
tempos, alguns
Mozarts e Luiz
Gonzaga, que
sabem fazer tudo
antes de estudar
a teoria, assim
como a criança
que aprende a
falar antes de
se alfabetizar -
tocando “piano
de ouvido”, por
assim dizer –, o
autêntico horror
de muitos
professores e
teóricos no
universo
musical!
O mundo
contemporâneo
valoriza rótulos
e letras. Não
importa muito
se, depois, a
prática, a vida
viva e real fora
dos livros,
apostilas e
cursinhos de
enxerto, muito
em moda nos dias
atuais,
desmentem tudo.
Mas a
experiência
exaustiva de
anos numa esfera
qualquer de
atividades
provará que os
imprevistos das
vivências porão
abaixo muitas
hipóteses
aparentemente
comprovadas.
A teoria, os
postulados
científicos nos
oferecem a
ilusão de que
tudo permanece
medido, pesado,
conhecido,
avaliado e
dentro de um
rígido controle,
que não
permitirá
surpresas
desagradáveis.
Não obstante,
trata-se de
ilusão pura. E o
cientista
cônscio, aliás,
conhece que não
existe a certeza
absoluta no
avanço do
conhecimento.
Quantas teorias
já foram
desbancadas e
suplantadas por
outras, que se
verificaram com
o decorrer dos
séculos?
Mostra de
arrogância,
assim, é a
pretensão de se
reter a palavra
definitiva para
quaisquer
realidades da
vida. O insólito
nos apanha de
surpresa. Quando
menos se espera,
as certezas
escorregam por
entre nossos
dedos. Prova de
sabedoria,
portanto, é não
querer confinar
tudo em cursos e
títulos
acadêmicos da
moda, que
pretensamente
nos capacitam ao
domínio absoluto
de determinado
assunto e, em
muitos meios
profissionais,
colaboram,
antes, para se
desvalorizar a
bagagem valiosa
de experiências
de trabalhadores
antigos, em prol
dos que oferecem
meramente os
requisitos dos
cursinhos e
títulos
destituídos do
suporte sólido
do conhecimento
e da prática de
campo.
Alguém conhece
teoria musical e
se vê apto a
ensinar segundo
o formato
tradicional das
técnicas
artísticas,
obtidas com o
decorrer dos
séculos de
história humana;
mas, então, nos
aparece alguém
como Mozart,
Bach, ou, no
terreno popular,
o nosso Luiz
Gonzaga - que
nascem
indiciando
conhecer, na
prática, e
previamente,
tudo de teoria e
algo a mais.
Tecem
composições
assombrosas aos
quatro anos de
idade, ou
executam, com
maestria, um
instrumento
duramente
estudado por
outros em
décadas, no
pouco intervalo
de algumas
semanas - e sem
o suporte do
estudo metódico
e teórico!
De onde se
originariam
essas realidades
individuais,
senão se
admitindo o
repertório
prévio das
muitas e longas
vidas passadas
que em bom
momento vêm para
explicar todos
estes
questionamentos
destituídos de
solução lógica?
Mas não me
refiro aqui,
apenas, às
facetas da
realização
artística.
Porque a
constatação da
transcendência
da capacidade e
do conhecimento
humano para além
da teimosa
tentativa de
confinar valores
dentro de
títulos e
currículos
momentâneos se
estende ao
infinito.
Aqui, vem a
benzedeira com
suas ervas e
preces, curando
a enfermidade
renitente para a
qual a
parafernália de
medicamentos
pesados da
medicina
contemporânea
não alcançou
resultados
significativos.
Ali, a tendência
inata para se
aprender um
idioma, com mera
facilidade de
compreensão ou
empatia
auditiva, surge,
inexplicável,
contra os
esforços inúteis
de muitos que
lutam anos em
cursos oficiais
de línguas, sem
obter nada além
de uma fluência
medíocre.
Verifica-se
também, em toda
parte, a vocação
inata para a
matemática, ou
para as ciências
humanas.
Ou alguém que
nunca sequer
frequentou
qualquer curso
técnico, de
iniciativa
própria,
beneficia muitos
com seus
talentos para
restaurador de
objetos vários.
Outros produzem
telas
magníficas, sem
o mínimo
conhecimento
especializado de
pintura. Alguns
possuem o dom
espontâneo para
a liderança
segura,
positiva, justa,
perante grupos
trabalhistas,
destacando-se
como
empreendedores
bem-sucedidos;
enquanto,
noutros lugares,
vários
demonstram cedo
vocação para a
área científica,
sem nenhum
antecedente
familiar de
expressão neste
sentido...
Vivemos em
tempos nos quais
o avanço
inquestionável
dos assuntos da
espiritualidade
humana toma
vulto. Casos de
recordações
espontâneas de
repertórios de
vidas passadas
em crianças, do
mundo todo
aparecem nos
noticiários
rotineiros, e
inúmeros filmes
e documentários
são produzidos,
com grande
inspiração, a
respeito destes
temas. Isto
cobra do ser
humano
reposicionamento
prioritário,
também no que se
relaciona aos
valores e às
referências de
que faz uso na
convivência
intensa e nas
incontáveis
atividades de
seu dia a dia.
“Nem tudo
consta de seus
livros!...” –
Esta fala,
de certo
personagem do
ator Russell
Crowe,
ilustrou-nos com
precisão o que
aqui tratamos,
ao dialogar com
seu colega
médico acerca da
existência dos
fenômenos de
intuição,
recorrentes a
todo tempo na
vida dos seres
humanos.
Pausa para
refletir.