Obediência e
resignação
Numa manhã de
sábado de
dezembro, num
telhado próximo,
havia dois
pombos que
estavam
pousados,
quietamente,
recebendo toda
aquela chuva que
caía
torrencialmente.
Levantavam
levemente as
asas, fato que
logo concluí
como sendo um
movimento de
proteção contra
o aguaceiro.
Porém, percebi
que estavam, em
verdade,
aproveitando a
chuva e se
refrescando,
pois era o
primeiro dia de
verão e a manhã
já ia
particularmente
quente. A velha
condição
automatizada de
tudo julgar
fez-me, num
primeiro
impulso, na
busca de um
significado para
aquela atitude,
atribuir àquela
cena o que eu
certamente
faria, e que de
fato não era
justo e nem
verdadeiro para
a realidade
daquelas simples
aves.
Imediatamente
recordei-me do “Não
julgueis”,
ensinamento
sublime dado por
Jesus, para que
sejamos mais
comedidos em
nossas ideias e
comentários
sobre quaisquer
situações com as
quais nos
defrontemos em
nossas vidas,
diariamente, das
mais complexas
às mais simples.
Ao acompanhar a
cena, via-se a
atuação de um
tipo de
inteligência
instintiva,
ainda rudimentar
quando comparada
com a
inteligência
humana, “cujo
exercício é mais
exclusivamente
concentrado
sobre os meios
de satisfazerem
suas
necessidades
físicas e
promoverem à sua
conservação”.
Mesmo diante
dessa
constatação, a
cena descrita
sugeria a
reflexão sobre
como encarar
essa atitude
natural dos
pombos,
utilizando-a
como elemento de
análise
comparativa
quanto à
compreensão
humana sobre a
Bondade Divina.
Aceitar a chuva
e aquietar-se
diante daquilo
sobre o qual
nada podiam
fazer aqueles
pombos despertou
a ideia de que
estavam dando o
seu exemplo de
aceitação e
resignação à
Vontade Divina.
Jesus, que
sempre buscou
ensinar de forma
simples, com
base nas coisas
da vida comum,
utilizou-se da
atitude das aves
para enfatizar a
necessidade de
se ter fé e
confiança na
Justiça Divina:
“Olhai as
aves do céu: Não
semeiam nem
ceifam, nem
recolhem nos
celeiros e vosso
Pai celeste as
alimenta. Não
valeis muito
mais do que
elas?”
(Mateus, 6:26).
Com esse
ensinamento,
quis o Mestre
salientar a
necessidade de
desenvolvermos a
certeza de que
Deus está no
comando de tudo
e, através de
Suas leis
naturais,
promove o
desenvolvimento
e o equilíbrio
do Universo.
Nada escapa à
Sua ciência e
vontade: “até
os cabelos de
vossa cabeça
estão todos
contados”
(Mateus, 10:30).
Mas, voltando ao
simbolismo
utilizado por
Jesus,
representou Ele
na atitude das
aves do céu a
meta que o ser
inteligente deve
ter para
alcançar a
sublimação de si
mesmo. A atitude
confiante e
resignada é um
sinal de
crescimento
espiritual, que
transparece no
comportamento.
Muita gente, ao
ler as palavras
do Evangelho,
pressupõe
humilhação e
menosprezo pela
condição humana,
nas quais, em
verdade, existe
o estímulo à
superação e ao
crescimento.
Acredita-se
submissão e
obediência à
Vontade Divina
tratar-se de um
ato de covardia
e acomodação.
O Espírito
Lázaro afirma
que a obediência
e a resignação
são “duas
virtudes
companheiras da
doçura, muito
ativas, se bem
que os homens
erradamente as
confundam com a
negação do
sentimento e da
vontade. A
obediência é o
consentimento da
razão; a
resignação é o
consentimento do
coração, forças
ativas ambas,
porquanto
carregam o fardo
das provações
que a revolta
insensata deixa
cair”.
Ficamos aqui
imaginando o que
diríamos dos
nossos
amiguinhos
pombos, se, ao
contrário do
observado,
estivessem no
telhado molhados
pela chuva,
reclamando,
revoltando-se e
acusando Deus
por tê-los
esquecido e
abandonado. Não
pareceria
estranho? Será
que poderíamos
conceber essa
atitude partindo
de criaturas
doces e singelas
da natureza?
Parece-nos que a
resposta seja
óbvia: a maioria
de nós estaria
atônita ao
presenciar tal
fato.
E quanto aos
seres humanos, a
quem Jesus
comparou de
forma
superlativa em
relação à vida
animal, será
aceitável que
tenham atitudes
de revolta e
desespero diante
das “chuvas”
que
invariavelmente
cobrem seus
corações? Será
que temos
direitos
especiais por
sermos filhos de
Deus, devendo,
portanto, serem
todas as nossas
vontades e
desejos
totalmente
atendidos?
O que acontece a
uma criança que
é sempre
atendida em seus
reclamos e
exigências?
Torna-se
totalmente
egoísta, em nada
cedendo por
imaginar-se no
centro das
atenções. Deus
quer nosso bem e
nos dá a
oportunidade de
crescermos com
equilíbrio. Por
essa razão, não
nos dá tudo o
que queremos e,
sim, aquilo de
que precisamos;
assim como dá,
também, a todos
os seres da
criação.
Trata-nos com
justiça
inquestionável,
e mesmo diante
de situações em
que nos falte o
sentido para
entender o
porquê do mal
que nos surge à
frente, a
confiança nessa
Bondade e
Justiça Divinas
deve senhorear
nossos passos e
reações, para
que não venhamos
a perder a
oportunidade da
exemplificação e
da reparação
devida, pela
rebeldia
expressa através
de lamentações
ou injúrias.
A Doutrina dos
Espíritos
mostra-nos que
as nossas
aflições têm
causas
anteriores, de
vidas passadas
ou desta vida
atual, criadas
por nossa
incúria e
irresponsabilidade
em relação às
leis divinas,
gerando nossos
débitos que
necessitam ser
reajustados,
através da
reencarnação.
Dá-nos o Pai
Criador a
oportunidade de
recomeçar a
experiência em
novo corpo, o
que nos permite
rever caminhos,
aprender e
crescer para
Ele, que nos
espera de braços
abertos.
Jesus, o exemplo
maior de
resignação e
submissão à
vontade de Deus,
está nos
amparando com
Suas palavras
vivas, que
pulsam energia
nova para nossos
Espíritos, e que
farão de nós
seres mais
fortalecidos e
confiantes,
abrindo-nos o
caminho para a
redenção. O Seu
exemplo
ensina-nos que a
submissão à
vontade do Pai
é, no fundo, uma
forma de
libertação das
tendências
inferiores que
caracterizam o
espírito humano.
Orgulho,
vaidade, egoísmo
e tantos outros,
somente
desaparecerão se
o indivíduo
começar em si a
reforma para o
bem, na busca da
verdade, mas não
aquela verdade
sectária e
formalista, mas,
sim, a verdade
que liberta: “Conhecereis
a verdade e a
verdade vos
libertará”
(João, 8:32).
Emmanuel,
estimado
benfeitor
espiritual, de
forma clara e
precisa, fornece
os comentários
que nos orientam
para essa
verdade que
liberta. Diz
ele: “Só
existe
verdadeira
liberdade na
submissão ao
dever fielmente
cumprido”.
Mais à frente
complementa: “E
perceber o
sentido da vida
é crescer em
serviço e
burilamento
constantes”.
Que Jesus
abençoe e
fortaleça nossa
disposição para
o entendimento e
a resignação
daquilo que não
podemos
modificar ainda.