Estava presente na reunião
do Grupo Espírita da Prece,
em Uberaba, quando Chico
recebeu a mensagem de Clara
Nunes, uma das maiores
intérpretes de nossa música
popular. Foi no dia 15 de
setembro de 1984 e, desde
então, permanecemos na
expectativa de que a
referida página nos viesse
ter às mãos, o que somente
agora aconteceu por uma
deferência do Dr. Francisco
Borges de Oliveira, diretor
do Grupo Espírita “Paulo de
Tarso”, de Caetanópolis-MG,
que mantém a Creche “Clara
Nunes”. Destacamos que, em
suas palavras, conforme
poderá ser verificado,
Clara, após o desenlace, foi
assistida por entidades
vinculadas aos cultos
afro-brasileiros, que
confiaram o Espírito liberto
aos seus pais, igualmente
desencarnados.
A mensagem foi dirigida por
ela à irmã Maria, presente
na reunião à qual
reportamos.
Querida Maria:
Eu pressentia que o
encontro, através das
notícias, seria
primeiramente com você.
Somente você teria
disposição de viajar de
Caetanópolis até aqui, no
objetivo de atingir o nosso
intercâmbio.
Descrever-lhe o que se
passou comigo é impossível
agora. Aquela anestesia
suave que me fazia sorrir se
transformou numa outra
espécie de repouso que me
fazia dormir.
Sonhava com vocês todos e me
via de regresso à infância.
Era uma alegria que me
situava num mundo
fantástico. Melodia e cores,
lembranças e vozes se
mesclavam e eu me perdia
naquele êxtase desconhecido.
Não cuidava de mim.
Lembrava-me dos que ficaram,
mas ainda não sabia se a
mudança seria definitiva.
Conte ao nosso querido Paulo
a minha experiência. Tantos
dias de descanso, ignorando
o que vinha a ser tudo
aquilo que se apresentava à
minha imaginação por
fantasias que desconhecia
como deslindar.
Peço a você solicitar a ele
me perdoe se lhes transmito
as presentes notícias com a
fidelidade possível.
Acordei num barco engalanado
de flores, seguido de outras
embarcações, nas quais
muitos irmãos entoavam hinos
que me eram estranhos. Hinos
em que o amor por Iemanjá
era a tônica de todas as
palavras. Os amigos que me
seguiam falavam de
libertação e vitória.
Muito pouco a pouco, me
conscientizei e passei da
euforia ao pranto da
saudade, porque a memória
despertava para a vida na
retaguarda e o nosso Paulo
se fazia o centro das minhas
recordações.
Queria-o ali naquela
abordagem maravilhosa, pois
os barcos se abeiravam de
certa praia encantadoramente
enfeitada de verde nas
plantas bravas que a
guarneciam.
Quando o barco que me
conduzia ancorou suavemente,
uma entidade de grande porte
se dirigiu a mim com
paternal bondade e me
convidou a pisar na terra
firme. Ali estavam o meu
pai, Manoel, e nossa
mãezinha, Amélia. Os abraços
que nos assinalavam as
lágrimas de alegria pareciam
sem fim. Era muita saudade
acumulada no coração.
Ali, passei ao convívio de
meus pais, e os meus
guardiões retornavam ao mar
alto. Retomei a nossa vida
natural e, em companhia de
meu pai, pude rever você e
os irmãos todos,
comovendo-me ao abraçar a
nossa Valdemira, que me
pareceu um anjo preso ao
corpo.
Querida irmã, não disponho
das palavras exatas que me
correspondam às emoções.
Peço a você reconfortar o
nosso Paulo e dizer-lhe que
não perdi o sonho de meu
filhinho que nascesse na
terra de nossa união e de
nosso amor.
O futuro é luz de Deus. Quem
sabe, virá para nós uma vida
renovada e diferente para as
mais lindas realizações?
Você diga ao meu poeta e
letrista querido que estou
contente por vê-lo
fortalecido e resistente,
exceção feita dos “copinhos”
que ele conhece e que estou
vendo agora um tanto
aumentados...
Desejo que ele saiba que o
meu amor pelo esposo e noivo
permanente que ele continua
sendo para mim está
brilhando em meu coração,
que continua cantando fora
do outro coração que me
prendia.
A cigarra, por vezes, canta
com tanta persistência em
louvor a Deus e à Natureza,
que se perde das cordas que
coordenam a cantiga, caindo
ao chão, desencantada.
O meu coração da vida física
não suportou a extensão das
melodias que me faziam
viver, e uma simples
renovação para tratamento
justo me fez repousar nas
maravilhas diferentes a que
fui conduzida.
Espero que o nosso Paulo
consiga ouvir-me nestas
letras.
Agradeço a ele as atitudes
dignas com que me acompanhou
até o fim do corpo, tanto
que agradeço a você e às
nossas irmãs e irmãos o
respeito com que me honraram
a memória, abstendo-se de
reclamações indébitas junto
aos médicos humanitários que
se dispuseram a
servir-nos.
Querida irmã, continue com o
nosso grupo em Caetanópolis.
O irmão José Viana e o Dr.
Borges estão conquistando
valiosas experiências.
Muitas saudades e lembranças
a todos os nossos e para
você um beijo fraternal com
as muitas saudades da sua,
Clara.
Mensagem extraída do livro
“Chico Xavier, 70 anos de
Mediunidade”, escrito por
Carlos A. Bacelli.
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