CLÁUDIO BUENO DA
SILVA
Klardec1857@yahoo.com.br
Osasco, SP
(Brasil)
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Fernando de
Lacerda, 24 anos
antes do Chico
“Foi através da
leitura da
impressionante
obra Do País
da Luz,
psicografada por
Fernando de
Lacerda
[...] que
encontrei
resposta a
muitas perguntas
que fazia a mim
mesmo e para as
quais não
encontrava
resposta, tais
como: por que
Deus consentia
que houvesse
tanto sofrimento
humano?”
Essas palavras
são de Hermínio
C. Miranda no
livreto
biográfico
Fernando de
Lacerda: o
Homem, o Médium!
¹, editado em
Portugal, sobre
a figura ímpar
do médium
português. Pouca
gente conhece,
aqui no Brasil,
o seu trabalho
extraordinário.
Pouco se ouve
falar dele. A
Federação
Espírita
Brasileira
editou Do
País da Luz
em volumes
numerados de um
a quatro, que
podem,
perfeitamente,
ser lidos de
forma
descontínua,
independentemente
da ordem
sequencial.
COMO TUDO
COMEÇOU
Fernando Augusto
de Lacerda e
Melo nasceu em
Loures,
arredores de
Lisboa,
Portugal, em
seis de agosto
de 1865 e morreu
no Rio de
Janeiro a sete
de agosto de
1918.
Funcionário
público, exerceu
a função de
inspetor da
polícia civil de
Lisboa no regime
monárquico. Com
o advento da
república,
sofreu
perseguição
política e
religiosa, sendo
aconselhado por
Espíritos amigos
a mudar-se para
o Brasil, o que
fez em 1911.
Tornou-se
trabalhador
espírita
dedicado desde a
noite de 28 de
outubro de 1906,
quando o
Espírito Camilo
Castelo Branco
lhe ditou
comunicação
publicada,
depois, no
primeiro volume
de Do País da
Luz. Na
introdução desse
primeiro volume,
Fernando de
Lacerda conta
que há muitos
anos escrevia
sobre coisas que
desconhecia,
alheias à sua
vontade e até ao
seu modo de ver
e ser.
Naquela noite,
ao deitar-se, o
médium pareceu
ouvir algo assim
como um recado
que devesse dar
ao escritor
português Silva
Pinto, grande
amigo de Camilo.
Por mais que
tentasse fixar a
atenção no que
lhe diziam,
Fernando não
conseguia captar
a mensagem de
forma
compreensível. A
voz, porém,
insistia: “Tem
paciência.
Levanta-te e vai
escrever”.
Dirigiu-se o
médium ao seu
escritório,
julgando que lhe
seria ditado o
recado, apenas.
Mas, na
realidade,
acabou
psicografando
uma longa carta
assinada pelo
autor suicida
Camilo Castelo
Branco, dirigida
ao escritor e
polemista Silva
Pinto, que, por
essa época,
alimentava a
ideia de
suicidar-se.
Tratava-se de
veemente e
comovedor apelo
ao velho amigo,
a quem muito
influenciara com
suas ideias
negativas e
céticas sobre a
vida, para que
reformulasse o
seu julgamento.
Após esse
episódio, o
médium Lacerda
recebeu páginas
brilhantes de
Eça de Queirós,
Antero de
Quental, João de
Deus, Napoleão
Bonaparte, Júlio
Diniz, Alexandre
Herculano,
Basílio da Gama,
Almeida Garret,
Padre Antonio
Vieira, Latino
Coelho, Tolstoi,
Émile Zola e
outros. Cada
qual com letra e
estilo próprios.
MEDIUNIDADE
MULTIFORME
Fernando de
Lacerda
descobriu sua
mediunidade aos
34 anos de
idade, e de uma
forma insólita.
Um Espírito,
desafeto seu,
dirigiu-lhe
mensagens
psicográficas
violentas,
usando termos
ofensivos. Essas
mensagens,
escritas pelo
próprio
Fernando,
traziam a letra
e assinatura do
Espírito, a fim
de que o médium
novato não
tivesse dúvidas
de quem se
tratava... Só
depois de
afastada a
entidade de má
índole (o que
levou muito
tempo) é que os
grandes vultos
da literatura se
manifestaram
pela sua
psicografia.
Em 1932,
Francisco
Cândido Xavier
lançou
Parnaso de
Além-Túmulo,
livro de grande
impacto que deu
início à sua
imensa tarefa na
literatura
mediúnica. Vinte
e quatro anos
antes, em 1908,
a publicação do
primeiro volume
do livro Do
País da Luz
teve igual
repercussão em
Lisboa. Mas com
o lançamento da
obra, assinada
por grandes
expoentes das
letras
portuguesas e de
outros países, a
polêmica se
estabeleceu.
Eram autênticas
as mensagens?
Eram mesmo Eça,
Camilo,
Herculano e
todos os outros?
Os grandes
escritores
voltavam do Além
para falar-nos?
A imprensa
comenta o fato
com
estardalhaço. O
clero católico
se movimenta. A
edição se esgota
rapidamente.
Fernando de
Lacerda era
dotado de vários
tipos de
mediunidade,
como
clariaudiência,
vidência, cura,
e executava a
chamada
psicografia
especular (especulum=espelho),
cujo texto
obtido (escrito
da direita para
a esquerda ou,
às vezes, de
baixo para cima)
deve ser lido
com ajuda de um
espelho. O
médium também se
prestava muito à
poligrafia, onde
os textos surgem
com letra e
assinatura
próprias de cada
autor, fenômeno
não muito comum.
Na psicografia
era médium
mecânico,
segundo a
classificação de
Allan Kardec,
pois sua mão
escrevia
enquanto sua
mente se ocupava
de coisas
inteiramente
diversas, como
leitura e
conversação.
MAGNETISMO SOBRE
DELINQUENTES
Além dos
recursos
mediúnicos, o
psicógrafo
português
possuía um
magnetismo
impressionante.
Seu domínio
espiritual sobre
os delinquentes
(era policial),
mesmo sobre os
mais agressivos,
era de espantar.
Há um caso que
ficou célebre em
Lisboa. Havia um
homem de nome
Albano de Jesus,
que desde
criança sofria
estranhos
“ataques” que
chegavam a durar
oito horas
consecutivas, e
cuja causa era
ignorada pelos
médicos.
Apelidaram-no de
“Homem-macaco”
porque seu
corpo, durante
as crises,
assemelhava-se
ao de um gorila,
adquirindo
agilidade
admirável.
Subia, então, em
altos monumentos
públicos ou
pulava, furioso,
de telhado em
telhado. Ninguém
lhe punha a mão.
No entanto,
assim que
Fernando de
Lacerda chegava,
Albano, em
transe, vinha
manso ao seu
encontro, diante
do povo pasmado.
E o médium,
magnetizando-o
imperceptivelmente,
conseguia
afastá-lo do
domínio da
entidade
espiritual.
Certa vez,
dialogando com
Camilo Castelo
Branco sobre as
técnicas da
relação
mediúnica entre
os dois, o
escritor famoso
disse ao médium:
“Não te
desconsoles,
porém. Na tua
ignorância,
sabes mais do
que quase a
totalidade dos
sábios do mundo,
porque sabes o
que é preciso
saber. O que
eles sabem não
serve para aqui
e o que serve
para aqui não
sabem eles”.
Fernando de
Lacerda viveu 53
anos. Desde os
20 já se
envolvia com
questões
comunitárias,
socorrendo os
aflitos,
ensinando
analfabetos. No
Brasil, para
onde veio em
1911 viver no
bairro do
Catete, no Rio
de Janeiro, teve
boa acolhida. E,
nos 7 anos que
viveu neste
país,
integrou-se à
comunidade
espírita e
continuou
servindo à causa
durante os
derradeiros anos
de sua
encarnação.
Morreu em 1918 e
foi sepultado no
cemitério São
João Batista, no
Rio. Sua
biografia diz
que “Era alto,
corpulento,
tinha os cabelos
ralos e grande
bigode. Andava
sempre
bem-vestido. Era
alegre,
conversador e
possuía um
coração
generoso”, muito
generoso...
Mostrou seu belo
caráter e
sincera
humildade quando
disse: “Isto não
é produto da
minha
inteligência,
não fui eu que
ditei estes
escritos, eu fui
apenas o
instrumento duma
inteligência
alheia;
portanto, o
mérito não me
pertence”.
Encarou seu
trabalho com o
mesmo
desprendimento e
humildade que
veríamos mais
tarde em Chico
Xavier, ao
ouvi-lo dizer:
“Sou um simples
médium como
qualquer outro”.
Nota:
Camilo Castelo
Branco, em
Memórias de um
Suicida,
psicografado por
Yvonne do Amaral
Pereira,
refere-se ao
médium português
como “nosso
agente fiel e
porta-voz
sincero – isto
é, um médium, um
iniciado cristão
da Terceira
Revelação, por
nome Fernando”.
E diz mais:
“Fernando age
com generosidade
em relação aos
encarcerados e
sentenciados,
aos quais
assiste e serve,
infundindo-lhes
esperança e
calma. Coração
boníssimo,
piedoso como ele
só, cativa-me
com sua atenção
e preces”.
¹Fernando de
Lacerda: o
homem, o
médium!, por
Hermínio C.
Miranda/Carlos
A. Bacelli,
Edições Luz do
Caminho, Braga,
Portugal, 1989.
A Biblioteca do
Instituto
Espírita
Obreiros do Bem,
de Osasco,
SP,possui um
exemplar deste
livro em seu
acervo.
Leia mais sobre
o tema em:
Kardec, Irmãs
Fox e outros,
Jorge Rizzini,
EME Editora,
1994.