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Crônicas e Artigos

Ano 9 - N° 434 - 4 de Outubro de 2015

ROGÉRIO COELHO
rcoelho47@yahoo.com.br
Muriaé, MG (Brasil)  

 



O perigoso festim da lisonja

Teus atos bons não necessitam ser conhecidos,
para que se façam comentados

 “Seja refratário à lisonja. Prefira uma verdade ácida a uma mentira adocicada.”-      Joanna de Ângelis[1]

Confessa Allan Kardec ter-se arrependido de haver tecido expressões encomiásticas a alguns médiuns que, empós, incensados pelos vapores tóxicos da vaidade, se perderam – juntamente com seus potenciais mediúnicos – pelas tredas veredas da vida...

Conta-nos Emmanuel[2], que certa vez, após Se dirigir Jesus à multidão com o enorme potencial de Seu amor, conquistando a atenção geral, uma senhora se levanta no seio da turba e, magnetizada pela Sua expressão de espiritualidade sublime, reporta-se em alta voz, às bem-aventuranças que deviam caber a Maria, Sua mãe, por haver contribuído na vinda do Salvador à face da Terra. Mas, prestamente, na perfeita compreensão das consequências infelizes que poderiam advir da atitude impensada, responde o Mestre que, antes de tudo, serão bem-aventurados os que ouvem a revelação de Deus e lhe praticam os ensinamentos, observando-lhes os princípios.

Em outra ocasião[3], Jesus há houvera ministrado a mesma lição que agora ratificava, quando, Sua mãe e Seus irmãos, conservando-se do lado de fora da casa em que Se encontrava, mandaram chamá-lO, com a nítida intenção de se apoderarem d`Ele, pois diziam que perdera o Espírito. Foi nessa oportunidade que Ele disse que todo aquele que faz a vontade de Deus é que pertence à Sua parentela real... Tal atitude não caracterizava o menosprezo pela consanguinidade, mas sim, enfatizava a necessidade da docilidade aos desígnios divinos.

À exceção de Seu primo João Batista, sabe-se que os parentes de Jesus, incluindo Sua mãe, não entendiam Sua missão e tampouco Lhe foram discípulos, conforme podemos depreender das seguintes palavras de Allan Kardec[4]: “(...) pelo que concerne a Seus irmãos, sabe-se que não O estimavam. Espíritos pouco adiantados, não Lhe compreendiam a missão: tinham por excêntrico o Seu proceder e Seus ensinamentos não os tocavam, tanto que nenhum deles O seguiu como discípulo. Dir-se-ia mesmo que partilhavam, até certo ponto, das prevenções de Seus inimigos. O que é fato, em suma, é que O acolhiam mais como um estranho do que como um irmão, quando aparecia à família”. O apóstolo João diz, positivamente (Jo., 7:5.) “que eles não Lhe davam crédito”.

“Quanto à Sua mãe, ninguém ousaria contestar a ternura que Lhe dedicava. Deve-se, entretanto, convir igualmente em que também ela não fazia ideia muito exata da missão do Filho, pois não se vê que Lhe tenha nunca seguido os ensinos, nem dado testemunho dele, como fez João Batista. O que nela predominava era a solicitude maternal”.

Ao mesmo tempo em que Jesus ministrava as lições de obediência e submissão ao Pai Celestial, Ele profligava toda e qualquer preponderância de privilégios. Portanto, quando o Mestre fez calar a senhora que realçava as bem-aventuranças de Sua mãe, oferecia-nos, segundo Emmanuel2, “um esclarecimento vivo para que não se amorteça entre os discípulos sinceros, a campanha contra o elogio pessoal, veneno das obras mais santas a sufocar-lhes propósitos e esperanças”.

Judiciosamente aconselha ainda Emmanuel2: “(...) se admiras algum companheiro que se categoriza a teus olhos por trabalhador fiel do bem, não o perturbes com palavras, das quais o mundo tem abusado muitas vezes, construindo frases superficiais, no perigoso festim da lisonja. Ajuda-o, com boa vontade e entendimento, na execução do ministério que lhe compete, sem te esqueceres que, acima de todas as bem-aventuranças, brilham os divinos dons daqueles que ouvem a palavra do Senhor, colocando-a em prática”.

Aconselha, também, Joanna de Ângelis1: “(...) procura agir com modéstia sem te deixares empolgar pelo brilho das situações relevantes, poupando-te, de certo modo, ao azedume e à perseguição dos insensatos; age com naturalidade, sendo sóbrio em tudo. Os homens que muito se exibem, quase sempre possuem pouco...

As ações sóbrias dão paz ao espírito e alimentam o coração. Não te procures sobrecarregar com o supérfluo que os destaques humanos impõem, a fim de que isto não te perturbe a vida.

Se atrais, mesmo inconscientemente, a inveja dos enfermos, receberás altas cargas de energia negativa, que te poderão alcançar. Teus atos bons não necessitam ser conhecidos, para que se façam comentados e adquiram valor. Eles são valiosos, embora desconhecidos.  

Descarta, portanto, quanto possível, a evidência pessoal, e quando as circunstâncias o exijam, não lhe vistas a pesada e fulgurante indumentária, mantendo-te simples e puro de coração, mediante o que permanecerás feliz e sem amarras com a transitoriedade das situações”.                                         


 

[1] - FRANCO, Divaldo. Episódios Diários. Salvador: LEAL, 1986, cap. 38.

[2] - XAVIER, Francisco Cândido. Pão Nosso.  17. ed. Rio [de Janeiro]: 1996. cap. 70.

[3] - Mateus, 12:46 a 50.

[4] - KARDEC, Allan. O Evangelho seg. o Espiritismo. 125. ed. Rio: FEB, 2006, cap. XIV, item 7.


 

 


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