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Correio Mediúnico
Ano 9 - N° 435 -11 de Outubro de 2015
 
 

 

Nas hesitações de Pedro

 Irmão X


Logo depois de se estabelecerem os apóstolos em Jerusalém, em seguida às revelações do Pentecostes, ia o serviço de assistência social maravilhosamente organizado, não obstante as perseguições que se esboçavam, quando a casa acolhedora, dirigida por Simão Pedro, foi procurada por infeliz mulher. Trazia consigo todos os estigmas das pecadoras. Fora lapidada e exibia manchas sanguinolentas na roupa em frangalhos. Pronunciava palavras torpes. Revelava-se semilouca e doente.

As senhoras do reduto cristão retraíram-se, alarmadas. E o próprio Pedro, que recebera preciosas lições do Senhor, vacilou quanto à atitude que lhe seria adequada.

Como haver-se nas circunstâncias? Destinava-se aquele abrigo ao recolhimento de criaturas desventuradas; entretanto, como classificar a triste posição daquela mulher que, naturalmente, buscara o vaso da angústia nos excessivos gozos da vida? Não estaria a sofredora resgatando os próprios débitos? Se bebera com loucura na taça dos prazeres, não lhe caberia o fel da aflição?

Dispunha-se a rogar-lhe que se afastasse do asilo, quando recordou a necessidade de orar. Se o caso era omisso nas disposições que regiam o instituto fraterno, tornava-se imperioso consultar a inspiração do Messias. O Mestre lhe ditaria o recurso.  Buscar-lhe-ia, por isso, o conselho na prece ardente.

Enquanto a infortunada aguardava resposta, sob o apupo de pequena multidão que lhe contemplava as feridas, o apóstolo buscou a solidão do santuário doméstico e exorou a proteção do Divino Amigo, que fora crucificado.

Em breves instantes, viu Jesus, nimbado de claridade resplandecente, não longe de suas mãos, que se estenderam suplicantes.

– Mestre – rogou Pedro, atacando diretamente o assunto, como quem sabia da brevidade daqueles momentos inesquecíveis –, temos à entrada uma pecadora, reconhecidamente entregue ao mal!  Ajuda-me, inspira-me!... que farei?!...

O Salvador entreabriu os lábios sublimes e falou:

– Pedro, eu não vim curar os sãos...

O discípulo entendeu a referência, mas, ponderando a grave responsabilidade de quem administra, acentuou:

– Senhor, estamos agora sem tua orientação direta e visível. Recebê-la-emos neste lar, para quê? A fim de julgá-la?

Com o mesmo olhar sereno, Jesus replicou:

– Nesse mister permanecem na Terra numerosos juízes.

– Para fazer-lhe sentir a extensão dos erros? – indagou Simão Pedro, em lágrimas.

– Não, Pedro – tornou o Mestre –, para dar-lhe conhecimento da penúria em que vive, conta nossa irmã, nas vias públicas, milhares de bocas que amaldiçoam e outras tantas mãos que apedrejam.

– Para conferir-lhe a noção do padecimento em que se mergulhou por si mesma?

– Também não. Em tarefa ingrata como essa, vivem aqueles que a exploram, dando-lhe fome e sede, pranto e aflição...

– Para dizer-lhe das penas que a esperam neste e no “outro mundo”?

– Ainda não. Nesse labor terrível respiram os espíritos acusadores, que não hesitam na condenação em nome do Pai, olvidando as próprias faltas...

O ex-pescador de Cafarnaum, então, chorou, súplice, porque no íntimo desejava conformar-se com os ditames da justiça, exemplificando, simultaneamente, com o amor que o Cristo lhe havia legado. Arquejava, soluçante, ignorando como prosseguir nas indagações, mas Jesus dele se acercou, iluminado e benevolente... Enxugou-lhe as lágrimas que corriam abundantes e esclareceu:

– Pedro, para ferir e amaldiçoar, sentenciar e punir, a cidade e o campo estão cheios de maus servidores. Nosso ministério ultrapassa a própria justiça. O Evangelho, para ser realizado, reclama o concurso de quem ampara e educa, edifica e salva, consola e renuncia, ama e perdoa... Abre acesso à nossa irmã transviada e auxilia-a no reerguimento. Não a precipites em despenhadeiros mais fundos... Arranca-a da morte e traze-a para a vida... Não te esqueças de que somos portadores da Boa Nova da Salvação!...  

Logo após, entrou em silêncio, diluindo-se-lhe a figura irradiante na claridade evanescente da hora vespertina...

O apóstolo levantou-se, deu alguns passos, atravessou extensa fileira de irmãos espantados, abriu, de manso, a porta e dirigiu-se à mulher, acolhedor:

– Entre, a casa é sua!

– Quem sois? – interrogou a infeliz, assombrada.

– Eu? – falou Simão Pedro, com os olhos empapuçados de chorar.

E concluiu:

– Sou seu irmão. 

 

Do livro Luz Acima, obra mediúnica psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.


 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita