Concluímos nesta edição o estudo do livro Obras Póstumas, publicado depois da desencarnação de Allan Kardec, mas composto com textos de sua autoria. O estudo baseou-se na tradução feita pelo Dr. Guillon Ribeiro, publicada pela editora da Federação Espírita Brasileira.
Questões para debate
218. Como seria o formulário de princípios a que se referiu Kardec?
219. O texto intitulado Credo espírita tem algo parecido com o credo de inspiração católica?
220. De que tratam essas considerações?
221. Kardec chegou a mencionar, no final do preâmbulo pertinente ao Credo espírita, os pontos que, segundo ele, constituem o programa das crenças espíritas, mas esta obra não os relaciona. Por que isso ocorreu?
Respostas às questões propostas
218. Como seria o formulário de princípios a que se referiu Kardec?
Ele deveria resumir o estado dos conhecimentos atuais que ressaltam da observação, sancionados pelo ensino geral dos Espíritos, e a ele cada um estaria livre para aderir ou não. A constituição do Espiritismo teria, assim, por complemento necessário, um programa de princípios definidos no que toca à crença, sem o qual seria uma obra sem importância e sem futuro. Esse programa, fruto da experiência adquirida, seria a baliza indicadora do caminho. Mas esse programa não pode nem deve acorrentar o futuro, sob pena de sucumbir, cedo ou tarde, sob as opressões do progresso. Fundado para o estado presente dos conhecimentos, deverá modificar-se e completar-se à medida que novas observações vierem demonstrar-lhe a insuficiência ou os defeitos. Essas modificações não deveriam, porém, ser feitas levianamente nem com precipitação. Seriam obra dos congressos orgânicos que, na revisão periódica dos estatutos constitutivos, fariam também a revisão do formulário de princípios. Constituição e credo, caminhando constantemente de acordo com o progresso, sobreviveriam na sequência dos tempos. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Constituição do Espiritismo.)
219. O texto intitulado Credo espírita tem algo parecido com o credo de inspiração católica?
Não. Não se trata de um breviário em que se alinham as partes constitutivas de uma crença. O texto escrito por Kardec é, em verdade, o preâmbulo do que seria o Credo espírita, preâmbulo esse constituído de considerações doutrinárias sobre pontos diversos que vão desde a chamada questão social até o papel moralizador do Espiritismo. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Preâmbulo do Credo espírita.)
220. De que tratam essas considerações?
Eis, de forma resumida, seus pontos principais:
1. A questão social não tem o seu ponto de partida na forma de tal ou tal instituição; está inteiramente no aperfeiçoamento moral dos indivíduos e das massas. Aí está o princípio, a verdadeira chave da felicidade da Humanidade, porque então os homens não pensarão mais em se prejudicarem uns aos outros. Não basta colocar um verniz sobre a corrupção, é a corrupção que é preciso extinguir.
2. O princípio do aperfeiçoamento está na natureza das crenças, porque as crenças são o móvel das ações e modificam os sentimentos; está também nas ideias inculcadas desde a infância e identificadas com o Espírito, e nas ideias que o desenvolvimento ulterior da inteligência e da razão podem fortificar, e não destruir. Será pela educação, mais ainda do que pela instrução, que se transformará a Humanidade.
3. O homem que trabalha seriamente pelo seu próprio aperfeiçoamento assegura a sua felicidade desde esta vida; além da satisfação de sua consciência, isenta-se das misérias, materiais e morais, que são a consequência inevitável de suas imperfeições. Terá ele calma porque as vicissitudes não farão senão de leve roçá-lo; terá saúde porque não usará o seu corpo para os excessos; será rico, porque se é sempre rico quando se sabe contentar-se com o necessário; terá paz da alma, porque não terá necessidades factícias, não será mais atormentado pela sede das honras e do supérfluo, pela febre da ambição, da inveja e do ciúme; indulgente para com as imperfeições de outrem, delas sofrerá menos; elas excitarão a sua piedade e não a sua cólera; evitando tudo o que pode prejudicar o seu próximo, em palavras e em ações, procurando, ao contrário, tudo o que pode ser útil e agradável aos outros, ninguém sofrerá com o seu contato.
4. O progresso geral é resultante de todos os progressos individuais; mas o progresso individual não consiste somente no desenvolvimento da inteligência, na aquisição de alguns conhecimentos; isso não é senão uma parte do progresso, e que não conduz necessariamente ao bem, uma vez que se veem homens fazer muito mau uso do seu saber. Ele consiste, sobretudo, no aperfeiçoamento moral, na depuração do Espírito, na extirpação dos maus germes que existem em nós; aí está o verdadeiro progresso, o único que pode assegurar a felicidade da Humanidade, porque é a própria negação do mal. O homem mais avançado em inteligência pode fazer muito mal; aquele que é avançado moralmente não fará senão o bem. Há, pois, interesse para todos no progresso moral da Humanidade.
5. Com a fé na vida futura, o círculo das ideias se alarga e o progresso pessoal tem um objetivo, uma utilidade efetiva. Da continuidade das relações entre os homens nasce a solidariedade; a fraternidade está fundada sobre uma lei natural e sobre o interesse de todos. A crença na vida futura, portanto, é elemento de progresso, porque é o estimulante do Espírito: só ela pode dar coragem nas provas, porque lhe fornece a razão, perseverança na luta contra o mal, porque mostra um objetivo. É, pois, em consolidar essa crença no espírito das massas que é preciso ligar-se.
6. Para que a doutrina da vida futura produza, doravante, os frutos que dela se deve esperar, é preciso, antes de tudo, que ela satisfaça completamente a razão; que responda à ideia que se tem da sabedoria, da justiça e da bondade de Deus; que não possa receber nenhum desmentido da ciência; é preciso que a vida futura não deixe no Espírito nem dúvida nem incerteza; que seja tão positiva quanto a vida presente, da qual é a continuação, como o dia de amanhã é a continuação da véspera; é necessário que a vejam, que a compreendam, que a toquem, por assim dizer, com o dedo; é preciso, enfim, que a solidariedade do passado, do presente e do futuro, através das diferentes existências, seja evidente.
7. Essa é a ideia que o Espiritismo dá da vida futura e é o que lhe faz a força, porque isso não é uma concepção humana, que não teria senão o mérito de ser mais racional, mas sem mais de certeza do que as outras. É o resultado dos estudos feitos sobre os exemplos fornecidos por diferentes categorias de Espíritos que se apresentam nas manifestações, o que permitiu explorar a vida extracorpórea em todas as suas fases, desde o alto até o mais baixo da escala dos seres. As peripécias da vida futura não são, pois, mais uma teoria, uma hipótese mais ou menos provável, mas o resultado de observações, pois são os próprios habitantes do mundo invisível que vêm descrever o seu estado.
8. A Doutrina Espírita é, assim, o mais poderoso elemento moralizador, naquilo em que ela se dirige, ao mesmo tempo, ao coração, à inteligência e ao interesse pessoal bem compreendido. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Preâmbulo do Credo espírita.)
221. Kardec chegou a mencionar, no final do preâmbulo pertinente ao Credo espírita, os pontos que, segundo ele, constituem o programa das crenças espíritas, mas esta obra não os relaciona. Por que isso ocorreu?
Foi a morte corpórea de Kardec que impediu fossem por ele redigidos os pontos que constituiriam, segundo suas palavras, o programa das crenças espíritas, isto é, o Credo espírita propriamente dito. (Obras Póstumas – Segunda Parte – Princípios fundamentais da Doutrina Espírita reconhecidos como verdades adquiridas.)
Fim