Crítica
Literária
O
Espírito de
Chico Xavier
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Título do livro:
O Espírito de
Chico Xavier
Autor: Chico
Xavier
(Espírito)
Médium: Carlos
A. Baccelli
Editora: Leepp
Número de
páginas: 158
O médium
Baccelli
escreveu um novo
livro em que
afirma
peremptoriamente
que Chico Xavier
é a reencarnação
de Allan Kardec.
Para ser franco
e sincero, não
sei
se
devo
me
sentir
feliz
ou
infeliz
com um
|
acontecimento
como
este,
pois
afirmar
algo de
forma
peremptória
sem
haver
provas
cabais é
estatuir
um
dogma, e
um dogma
é
indiscutível,
só nos
resta
aceitá-lo
como
verdade
absoluta. |
Conforme Allan
Kardec, os
postulados da
doutrina
espírita se
sustentam na
lógica, na razão
e no bom senso,
eliminando de
seus princípios
postulares toda
e qualquer
premissa que não
responda a estes
quesitos.
Alguns confrades
estão aceitando
tudo o que vem
escrito pelas
entidades
desencarnadas,
através dos
médiuns, como
verdade
absoluta, como
se a mediunidade
fosse um
parâmetro de
aferição dessa
verdade. A
mediunidade pode
ser, sim, um
parâmetro de
aferição da
verdade, desde
que a
comunicação
apresentada se
sustente no
campo da lógica,
da razão e do
bom senso; neste
caso ela é um
meio e não um
fim.
Embora
respeitando a
idoneidade do
médium Baccelli,
como também dos
Espíritos que o
assistem,
particularmente
o Espírito de
Inácio Ferreira,
no entanto, não
podemos nos
esquecer de que
temos que passar
pelo crivo da
razão, da lógica
e do bom senso,
tudo o que
ouvirmos dos
homens ou dos
Espíritos; e
infelizmente
isto não está
acontecendo.
Ao fazer estas
citações, não as
faço com outra
intenção que não
a de estarmos
buscando a
verdade, embora
parcial, pois a
verdade absoluta
pertence a Deus;
e, no que
concerne à
verdade, temos
que submeter
tudo o que nos
seja mais caro,
até mesmo a
amizade, como
nos alerta André
Luiz em seu
livro Conduta
Espírita
(pg. 72):
“Render culto à
amizade e à
gentileza
estendendo-as,
quanto possível,
aos companheiros
e às
organizações,
mas sem
escravizar-se a
ponto de
contrariar a
própria verdade,
em matéria de
doutrina, para
ser agradável
aos outros. O
Espiritismo é
caminho
libertador”.
Idoneidade não é
sinônimo de
perfeição
Se somos
verdadeiramente
amigos do médium
Baccelli, vamos
buscar a
verdade, onde
quer que ela
esteja. Se
estiver em seus
enunciados,
vamos dar-lhe a
sustentação
necessária, para
que esplenda
cada vez mais;
se não responder
aos quesitos da
lógica, da razão
e do bom senso,
vamos alertá-lo,
pois nisto
reside, ainda, o
espírito de
caridade.
Não podemos nos
esquecer que
idoneidade não é
sinônimo de
perfeição; um
Espírito idôneo
é suscetível de
engano, e isto
tem acontecido
muitas vezes em
questões
doutrinárias.
Analisemos sem
espírito
preconcebido
alguns tópicos
do livro “O
Espírito de
Chico Xavier”,
procurando
similitude entre
o escrito
através do
médium Baccelli
e a conduta de
Chico enquanto
encarnado.
Vejamos:
“Muitos me
diziam que eu
era Allan Kardec
reencarnado.
Ora,
evidentemente eu
não podia
concordar.
Santificaram o
homem!...”.
Contraditório,
pois foi pelas
mãos do próprio
Chico Xavier que
Humberto de
Campos, em seu
livro “Cartas e
Crônicas”,
destacou a
superioridade de
Kardec, nestes
dizeres:
“Imediatamente
uma estrada de
luz, à maneira
de ponte
levadiça,
projetou-se do
céu, ligando-se
ao castelo
prodigioso,
dando passagem a
inúmeras
estrelas
resplendentes.
Em alcançando o
solo delicado,
contudo, esses
astros se
transformaram em
seres humanos,
nimbados de
claridade
celestial.
Dentre todos, no
entanto, um
deles avultava
em superioridade
e beleza...
(este é
Kardec)".
Parece-nos
estranha esta
postura de Chico
Xavier, pois
enquanto
encarnado foi
sempre humilde e
disciplinado,
não questionou
em momento algum
as comunicações
obtidas por seu
intermédio,
comunicações
estas em que
Emmanuel, André
Luiz, Humberto
de Campos e
muitos outros
Espíritos
reverenciaram
sempre o
Espírito
iluminado de
Allan Kardec,
falando de sua
superioridade
espiritual.
Haveria Chico
Xavier, depois
de desencarnado,
se apercebido
que foi vítima
de engano quando
encarnado? Esta
postura de Chico
Xavier não está
colocando em
xeque tudo
aquilo que foi
escrito por suas
mãos?
Humildade não é
ignorância ou
miserabilidade
Vamos analisar
esta outra
colocação de
Chico, pelas
mãos do médium
Baccelli:
“Muita gente
argumenta que,
sendo Allan
Kardec, Chico
Xavier nada
teria que
aprender com
Emmanuel. Ora,
Allan Kardec
tinha e tem
muito que
aprender até com
um indigente da
esquina”.
Com todo
respeito, mas
esta colocação
supostamente de
Chico Xavier,
afirmando que
Kardec tinha e
tem muito que
aprender até com
um indigente da
esquina, faz de
Kardec um
retrógrado, pois
a lógica nos diz
que esses
aprendizados ele
já os adquiriu.
Hoje busca
conhecimentos e
aprendizados em
nível superior,
que o indigente
da esquina ainda
não adquiriu.
Mesmo querendo
enquadrar essa
colocação como
uma atitude de
humildade da
parte de Chico,
em que este, por
sua vez, deseja
destacar a
humildade de
Kardec, não há
como, pois
humildade não é
de forma alguma
ignorância ou
miserabilidade;
humildade é um
estado de
espírito, que
independe da
condição social
ou cultural do
homem. Ser
humilde é agir
com naturalidade
em todos os
momentos de
nossa
existência, seja
no que concerne
a nossa cultura,
ou no que
respeita a nossa
posição social.
Se humildade
fosse apanágio
de ignorância e
miserabilidade,
a evolução seria
um contrassenso,
pois a evolução
tem como
finalidade
prioritária
enriquecer o
Espírito de
valores morais e
intelectivos
que, por
consequência,
resultam em
conforto,
bem-estar e
prosperidade.
Ainda estranha
se nos apresenta
esta preocupação
de Chico Xavier:
“Sei que haverão
de dizer que
aqui não sou eu,
mas um
mistificador em
meu lugar”.
Se fosse assim,
haveria de ser
um cisco
mistificador...
Um cisco
mistificador
astuto! –
exclamarão.
Peço-lhes,
porém, licença
para discordar
com relação a
pequeno detalhe:
astuto, não;
matuto! Um cisco
mistificador
matuto!...
Emmanuel foi
para Chico
Xavier um pai
espiritual
Chico Xavier foi
sempre um médium
disciplinado,
entregando-se à
espiritualidade
como um
instrumento
dócil, vivendo
uma única e só
preocupação:
servir. Em
momento algum,
se demorou
preocupado com o
que pudessem
pensar dele,
pois sabia com
certeza que o
valor literário,
ou a temática
apresentada, não
lhe pertencia,
era obra da
espiritualidade,
e compreendia
ainda que havia
muitos que
desacreditavam
de sua
mediunidade. O
que haverá
levado Chico
Xavier a
preocupar-se com
o que iam pensar
dele?
Emmanuel foi
para Chico
Xavier um pai
espiritual,
dando-lhe
sustentação,
orientando-o
sempre com muito
amor. Chico
Xavier respondeu
ao chamamento da
espiritualidade,
tomando sempre o
máximo cuidado
para que seu
pronunciamento
não se fizesse
com leviandade,
evitando ferir
ou magoar seus
semelhantes.
Quando Chico se
pronunciava a
respeito da
doutrina
espírita o fazia
com
meticulosidade,
de forma
inteligente,
atento à
responsabilidade
de que estava
revestido, e,
pelo que
analisamos
nestes tópicos,
nos parece que
Chico se tornou
rebelde. Será
que desertou à
proteção de
Emmanuel e se
sente livre para
dizer tudo o que
quer, sem
responsabilidade
alguma?
Se quando
encarnado Chico
Xavier se
postava com
responsabilidade
e disciplina em
questões
doutrinárias, é
natural que
depois de
desencarnado
essas virtudes
hajam se
dilatado, e não
desaparecido,
pois a evolução
é ininterrupta,
e se manifesta
ainda mais
acentuada, para
o Espírito que,
como ele, já
havia
conquistado
tantos valores
morais e
espirituais.
Não acredito de
forma alguma em
mistificação da
parte do médium
Baccelli,
tampouco duvido
de sua
idoneidade, e
acredito mesmo
que suas
afirmativas
sejam sinceras,
mas infelizmente
não correspondem
elas à lógica, à
razão e ao bom
senso.
O que parece
estar
acontecendo é
interferência
anímica da parte
do médium, isto,
porém, de
maneira
inconsciente.
Acreditamos que
a ideia fixa, em
que se demora
nosso
respeitável
confrade
Baccelli, de que
Chico Xavier é a
reencarnação de
Allan Kardec,
ideia esta
respeitável, mas
que infelizmente
não encontra
embasamento na
lógica, na razão
e no bom senso,
é que provoca
essa atuação
anímica
inconsciente.
Espíritos
mistificadores
se utilizam de
nomes famosos
Outra questão a
ser analisada é
de uma
entrevista de
nosso confrade
Carlos Baccelli
à “Folha
Espírita”.
Vejamos:
“... discutíamos
o assunto,
falando que
Kardec havia se
casado,
etecétera e tal.
Ele (Chico
Xavier) parou de
autografar,
olhou-nos por
cima dos óculos
e disse: ‘É, de
fato, ele se
casou, mas com
uma mulher nove
anos mais velha,
que tinha por
ele verdadeiro
zelo material e
não teve
filhos...”
Com todo o
respeito, mas o
que podemos
interpretar
destes dizeres é
que Kardec
casou-se, mas
não conviveu
maritalmente com
sua esposa; esta
lhe foi uma mãe
zelosa, deu-lhe
apenas o carinho
maternal, e por
consequência não
teve filhos,
lógico.
Ou Chico Xavier
representava em
público, e não
apresentava a
mesma coerência
quando na
intimidade com
os amigos, ou
Baccelli deve
ter se
equivocado, pois
estas palavras
são incoerentes.
Não vemos nenhum
impedimento em
ser a esposa de
Kardec nove anos
mais velha que
ele, e não ter
filhos não
significa de
maneira alguma
que não esteja
acontecendo o
relacionamento
entre o casal e,
para completar,
Kardec sabia com
certeza que sexo
é harmonia e
vida no conjunto
do Universo.
Amigos, estas
arestas que
estão sendo
adicionadas à
doutrina
espírita
precisam ser
aparadas, pois
do contrário,
não vai demorar
muito e o
Espiritismo vai
se transformar
em uma doutrina
dogmática, pois
infelizmente já
existem muitos
equívocos na
interpretação
das obras
básicas, muitos
achismos, muitas
revelações
insustentáveis,
muita gente
escrevendo sem
atentar para a
responsabilidade,
e uma grande
maioria
aceitando tudo o
que é escrito ou
dito, sem fazer
uso da lógica.
Infelizmente o
que tem
acontecido é que
aceitamos uma
revelação, ou
uma extrapolação
do postulado
doutrinário do
Espiritismo,
devido ao nome
de quem o
escreve ou diz,
esquecendo-nos
de que o próprio
Kardec nos pede
para tomarmos
cuidado, pois às
vezes Espíritos
mistificadores
se utilizam de
nomes famosos.
Amigos,
atenhamo-nos um
pouco mais à
lógica e à
razão, e tudo se
resolve.
José Sola é
escritor e
colaborador da
revista
Espiritismo &
Ciência.