Leonardo
Machado:
“Não somos
autossuficientes;
precisamos uns
dos outros
para crescer”
As emoções
negativas e
positivas na
visão de um
psiquiatra
espírita
|
Natural de
Recife (PE),
onde também
reside, Leonardo
Machado (foto) é
de família
espírita e
vincula-se à
Federação
Espírita
Pernambucana,
nas atividades
de atendente
fraterno e
palestrante. Na
área
profissional, é
médico
psiquiatra e
psicoterapeuta,
preceptor da
Residência de
Psiquiatria do
Hospital das
Clínicas da
Universidade
|
Federal
de
Pernambuco
(UFPE),
instituição
em que é
professor
efetivo.
Leonardo
concedeu-nos
gentilmente
a
presente
entrevista
em que
fala,
entre
outros
assuntos,
sobre o
tema
emoções
negativas
e
positivas. |
No campo das
emoções, como
administrá-las
no cotidiano
comum para
focarmos nas
positivas,
visando à
conquista da paz
interior?
Um ponto
essencial é
perceber as
emoções como
aliadas em nosso
processo de
descoberta
íntima e de
iluminação
interior. Além
disso, entender
que não é
possível e nem
desejável
interromper,
como uma
contenção
ilimitada, as
emoções que
sentimos. É
preciso
manejá-las.
Tanto as
chamadas emoções
positivas quanto
as negativas
estão postas em
nós como funções
alavancadoras de
nosso
amadurecimento
psíquico-espiritual.
Como lidar com
emoções que
ainda nos
perturbam?
Um dos pontos
mais curiosos na
dinâmica
psíquica é que o
primeiro passo
para a
modificação é a
autoaceitação.
Por incrível que
pareça,
aceitar-se
realmente não é
sinônimo de
marasmo
espiritual. Ao
contrário, sem
autoaceitação
não é possível
autodescobrimento,
uma vez que se
cai em um
mecanismo de
defesa de
negação; e sem
autodescobrimento
não é viável a
autoiluminação.
Além disso,
quando aceitamos
e reconhecemos a
realidade íntima
já estamos nos
modificando e
nos liberando de
ciclos viciosos
mentais. Deste
modo, parece-me
que um ponto
primordial para
lidar de forma
mais saudável
com
emoções/memórias/pensamentos/sentimentos
que nos
perturbam é
vê-los como o
vento: da mesma
maneira que o
vento vem, o
vento passa e se
vai; não é
possível estocar
o vento, tanto
quanto não é
possível barrar
(ou brigar com)
as emoções
negativas sem
gerar graves
problemas
íntimos.
Para conquista
das emoções
positivas, com
vistas ao
equilíbrio e à
saúde, qual
delas é mais
fácil de buscar
e manter?
Cada ser traz as
suas
características
que podemos
chamar de
forças/virtudes/qualidades.
De acordo com as
características
psicológicas
individuais
pode-se focar
mais facilmente
em uma ou em
outra. Contudo,
dois
instrumentos que
auxiliam o
desenvolvimento
das emoções
positivas é o
cultivo da
gratidão
(facilita o
desenvolvimento
de emoções
positivas
ligadas ao
passado) e da
apreciação
(facilita o
desenvolvimento
das emoções
positivas
ligadas ao
presente).
Considerando as
bagagens
espirituais
trazidas para a
presente
existência,
existe um meio
prático de
observação
daquelas que já
estão em nós?
Pode-se tentar a
sugestão de
Agostinho na
questão 919 de O
Livro dos
Espíritos –
analisar como
foi o dia antes
de dormir.
Costumo fazer
uma variação
dessa sugestão,
juntando-a com
outras variações
de outras
técnicas do Mindfulness.
Reservar 5
minutos diários,
ficar sentado em
posição
confortável,
fechar os olhos:
1) escutar os
sons do ambiente
(sem fazer
julgamentos
morais sobre
outros
pensamentos que
surgirão, apenas
voltar o foco da
atenção para os
sons); 2)
semanas depois
na mesma postura
escutar uma
música, de
preferência
instrumental, e
agora perceber
as emoções que
surgem. Além de
outras questões
que podem ser
trabalhadas com
essas técnicas
que uno, elas
podem ajudar a
treinar a
postura de não
julgamento (e
assim a
autoaceitação
sem negação) e
posteriormente a
percepção dos
conteúdos
internos.
Podemos investir
nas positivas e
combater as
negativas?
Existe uma dica
bem didática?
Pelo que já
expus nas
questões acima,
prefiro focar
nas emoções
positivas ao
invés de
combater
excessivamente
as negativas.
Uma técnica da
psicologia
positiva bem
estudada em
artigos
científicos e
mesmo sem os
autores
americanos
saberem, muito
alinhada com a
proposta
cristã-espírita
é "contar as
bênçãos".
Durante 15 dias,
anotar em uma
folha de papel,
à noite, três
coisas boas que
aconteceram nas
últimas 24h. As
coisas boas não
precisam ser
extraordinárias.
Ao contrário,
sugere-se uma
busca ativa de
pequenos
acontecimentos
que antes
poderiam passar
sem serem
notados.
Refletir sobre
elas. Se for
útil, continuar
fazendo (mesmo
que não se anote
sempre).
De sua
experiência
profissional,
que gostaria de
destacar para os
leitores sobre o
impacto das
emoções na
saúde?
Tanto na
prática, quanto
nas pesquisas
científicas,
vê-se uma
importante
influência das
emoções
negativas no
surgimento ou no
agravamento de
adoecimentos
clínicos de
várias
especialidades.
Porém, além
disso, o que as
ciências da
saúde vêm
descobrindo é
que as emoções
positivas
exercem um
impacto positivo
na saúde,
independente da
ausência das
emoções
negativas.
Dos atendimentos
clínicos, o que
mais lhe chama
atenção nos
dramas humanos?
A capacidade de
o ser humano se
reinventar.
E de sua
experiência
espírita, que
gostaria de
dizer?
Não percamos a
essência de
nossa Doutrina.
Aqueles que
ocupamos espaços
de trabalho
junto ao
movimento não
nos iludamos com
pretensões de
conseguir
resolver todas
as problemáticas
ou todas as
doenças humanas.
Continuemos como
um carteiro
distribuindo as
cartas do bem e
do amor.
Suas palavras
finais.
As várias formas
de adoecimento
nos passam
várias
mensagens. Uma
delas é: - Não
somos
autossuficientes;
precisamos uns
dos outros para
crescer. A
doença nos traz
esse ensinamento
de modo muito
forte. Enquanto
não aprendermos
isso, a doença
ainda terá sua
função na Terra.